A conduta do presidente pode se enquadrar, em tese, na lei de abuso de autoridade
Os olhos de Lula faiscaram quando as joias de Bolsonaro vieram à tona, mas quem é que não gosta de joias? Até os pobres admiram. O problema é que se relembrou que o presidente atual teve que devolver centenas e centenas de presentes que havia levado para casa quando saiu do governo. Eram coisas que pertenciam ao Estado, segundo a lei. Ele e Bolsonaro olhavam com olhos gulosos para as peças. As joias sempre foram problemas para a humanidade.
Ali Baba, na ficção, adorava. É difícil não se render a elas. Lembrando que o Tribunal de Contas da União determinou, em priscas eras, que todos os documentos e presentes recebidos pelos ex-presidentes FHC e Dilma Rousseff fossem incorporados ao patrimônio da União. O então presidente Michel Temer mandou investigar para localizar 712 itens subtraídos do Estado brasileiro pelos petistas e outros não-petistas.
O fora que Bolsonaro deu foi a usura e a atuação em diversas frentes para reaver um pacote de joias avaliado em 3 milhões de euros, presenteado pelo regime saudita e apreendido pela alfândega no aeroporto de Guarulhos. Claro que é ilegal a tentativa de entrar no país com joias de tal quilate sem o pagamento do imposto devido.
Pode ser enquadrado no Código Penal. O ex-presidente mobilizou dois ministérios - das Relações Exteriores e de Minas e Energia - , a Receita Federal e também atuou por conta própria para tentar recuperar os bens, sem sucesso. Um segundo pacote de bens valiosos passou despercebido pelos servidores da alfândega e está no acervo pessoal do ex-presidente. Bolsonaro usou a estrutura do Estado para recuperar as joias.
Os sauditas se fizeram de camelo e não tugiram nem mugiram. Agora é saber se a Polícia Federal vai mesmo levar suas investigações para o lado da refinaria Acelen, localizada na Bahia. As especulações já se voltam para questões como sendo "presentes" dados por satisfação com a venda da antiga Refinaria Landulfo Alves, a mais antiga do Brasil e que foi para as mãos dos árabes no governo Bolsonaro.
A conduta do presidente pode se enquadrar, em tese, na lei de abuso de autoridade "Exigir informação ou cumprimento de obrigação, inclusive o dever de fazer ou de não fazer, sem expresso amparo legal".
Bolsonaro teria feito isso quando impôs a ministros e ao secretário da Receita Federal que pressionassem pela liberação das joias. Quando Lula teve que devolver, ele disse que os presentes eram pessoais e os classificou como "tralhas". Bolsonaro diz que "não pediu nada".
Em 2016, o TCU já havia decidido sobre o assunto (Lula ainda tenta rever obras de arte), observando que a Secretaria de Administração da Presidência da República e o Gabinete Pessoal do Presidente da República deveriam incorporar ao patrimônio da União todos os documentos e presentes recebidos pelos presidentes da República. No entanto, após ser envenenado, ninguém resiste ao luxo.