Colunistas / Crônicas
Jolivaldo Freitas

Correndo de tiros e caindo na boca da onça

JOLIVALDO FREITASJolivaldo Freitas é jornalista e cronista
25/03/2015 às 12:45
  Tudo começou de forma linear daquele jeito que contado ninguém acredita. O dia começou de forma obscura, num jeito que nem é bom contar, mas quando tudo de ruim tem de se juntar não tem como desamalgamar e parece que o cimento vai se misturando e se entranhando no aço e quando menos se espera já está a teia, a tecedura e o emaranhado e para desfazer o nó é
necessário muita paciência, um pouco de sorte e a ajuda do destino. 

E quando o destino decide ser mais lento que a agonia do pobre sofredor? Não há nada a fazer, a não ser esperar a oportunidade de conseguir segurar de novo as rédeas. E foi assim que aconteceu com meu compadre Javali, homem de sorte, de mulher
amantíssima e filhos amorosos, mas que está em seu inferno astral, conduzido que o foi por um nada e este naco é que está tirando seu sono, fazendo com que trate mal seus colegas de imprensa e de Standup e perca a paciência, pois não sabe o que fazer, pois está com as mãos sem as habenas, mas com a corda no pescoço.

   E todo começou de forma linear daquele jeito de contado ninguém acredita, eu repito. Já acordou todo estranho, com preguiça e sem aquela vontade que tem todos os sábados de não fazer nada e de preferência deixar que levem a menorzinha para o psicólogo, mas por sorte sua lassidão coincidiu com o psicólogo que não podia atender e ele, comprador-mor de tempero de casa e grande adquiridor de petiscos, frutas, carnes e verduras foi fazer o que gosta que é visitar o mercadinho do bairro, onde está tão manjado que quando a mulher ou a empregada descobre que esqueceu um item, liga para o comércio e pede a quem atende que diga ao meu compadre Javali que acrescente ao
rol.

  Que faça novo apontamento. Pode até comprar fiado ou anotar na caderneta, coisa difícil de se fazer hoje em dia, sendo o lugar onde ainda existe a prática é no bairro de Sussuarana, pois até Cajazeiras para se livrar do birro (uso este termo paulistano porque esqueci o que usamos na Bahia, que se assemelha a calote mas calote não é, e muito menos roubo ou estelionato, mas vamos seguir a prosa) tem cartão de crédito próprio e moeda própria.

   Depois do almoço decidiu ir na casa do filho mais velho o Ti Javali, menino cada vez mais parecido com ele e vá parecer assim com o
secretário de Segurança Pública, pela cara que vi nos jornais, lá na casa da delegacia do Largo do Papagaio. Filho dormindo, netinha ressonando, nora saiu para comprar mantimentos e ele encontra um parente que decide assistir o fatídico jogo Vitória contra o Colo Colo de Ilhéus lá no Barradão, ele rubro-negro apaixonado que é. O aparentado torcedor do time ilheense propôs que fossem assistir no área reservada aos visitantes lá vai ele completar seu dia atípico, sem poder vibrar com os gols do time do coração, o que não aconteceu, pois o adversário aplicou de prima dois gols a zero e nem xingar o técnico pode.

    Termina o jogo, o Vitória fora das semifinais do Baianão e ainda mais longe do Nordestão e Javali de boca aberta, no lugar errado, na hora errada, no momento angustiante tendo de esperar que as luzes do estádio se apaguem para que possa sair incólume junto com seus adversários, na maior harmonia, pois a polícia não queria que a torcida Imbatíveis, de reconhecida, arrematada e contumaz truculência atacasse na saída, pois esquecera de levar jato de pimenta, os escudos e os cavalos. Consegui sair bem.

    Levou o moço para casa deste e quando retornava viu seu carro cercado, no meio da linha de tiro, em pleno tiroteio e só vendo as balas 38 da polícia passando por cima e as modernas balas de armas mais potentes de noventa milímetros dos bandidos ressoando no circuito inverso. Mas conseguiu fugir com as pernas trêmulas, as mãos nervosas no volante e foi em frente respirando aliviado e do nada surge um motorista maluco que por um triz, em alta velocidade não o abalroou adiantando a viagem de sua alma lá para o
purgatório, vez que ele não merece o céu mas seria uma maldade ser mandado para o inferno.

    Só mesmo quando chegou no prédio, guardou o carro e subiu para o apartamento se viu aliviado e protegido. Entrou e foi dizendo:

   - Mulher, você não sabe o que aconteceu comigo.

   Do nada dona Javali, uma mulher de extrema paciência e sapiência, respondeu na chincha: 

   - Não quero saber de nada e estou de saco cheio e vou embora para a casa da minha mãe.
 Não é que meu compadre Javali ficou mais parado no ar que beija-flor, Dario Maravilha e drone de americano. Mais sem jeito que baleia encalhada, mas bestificado que cachorro na missa. Está lá até hoje. Não sabe se o problema foi causado por umas camisinhas que recebeu no Carnaval no bloco “As Muquiranas”, que nem usou nem jogou fora. Se foi uma cartela aberta de Viagra que ganhara do cardiologista mas que dera a um amigo. Se comprou tempero errada no mercadinho ou esqueceu de lavar os pratos ou pegar coco dos cachorros. Cozinhou sem sal. Está até com medo de perguntar. E quanto ao Vitória:

    - Fora Falcão! – grita da janela, mas tão abestalhado que está, que embora seja da mídia nem sabe que Carlos Falcão não é mais presidente do Vitória. E para pirraçar liguei dizendo que quem voltou foi Paulo Carneiro. Tive de desmentir antes que – levado por todo o drama que se viu envolvido – cortasse os pulsos, se jogasse da janela ou bebesse álcool gel. C´est la vie.