Em 2020, o setor gerou R$ 18 bilhões em valor bruto da produção e mais de 300 mil empregos. Apenas o ramo industrial pagou mais de R$ 2 bilhões em salários e R$ 1,2 bilhão em encargos sociais. FIESP Agencia.
Da Redação , Salvador |
30/08/2021 às 12:00
Cacau está vivo
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O Departamento do Agronegócio (Deagro) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) divulgou nesta quinta-feira (26/8) o estudo “Agronegócio do Cacau: Produção, Transformação e Oportunidades” com os principais resultados de desempenho de todos os elos da cadeia produtiva.
O estudo evidencia que o agronegócio brasileiro do cacau, que consiste na atividade agrícola (amêndoa de cacau) e industrial (processadoras do cacau e indústrias de chocolates), está entre os maiores do mundo. Além do relevante parque industrial, o segmento tem a seu favor o fato de o Brasil ser um grande produtor de leite e açúcar, importantes matérias-primas da indústria de chocolate, o que representa vantagem estratégica.
Em 2020, o setor gerou R$ 18 bilhões em valor bruto da produção e mais de 300 mil empregos em todos os segmentos. Apenas o ramo industrial pagou mais de R$ 2 bilhões em salários e R$ 1,2 bilhão em encargos sociais.
O mercado da amêndoa de cacau no Brasil
Dados do último Censo Agropecuário (2017) mostram a complexidade da atividade agrícola do cacau: há mais de 93 mil estabelecimentos produtores no país, concentrados na Bahia (74%) e no Pará (19%), que juntos representam 93% integralmente. De todas essas propriedades, 84% têm área inferior a 50 hectares.
No Pará, o cacau é a terceira maior atividade agropecuária, com valor de R$ 1,9 bilhão em 2020, ou 9,4% do valor bruto total gerado pelo setor no estado, superada apenas pela pecuária bovina (R$ 9,5 bilhões) e pela soja (R$ 3,7 bilhões). Na Bahia, o cultivo da amêndoa gerou R$ 1,7 bilhão, ou 4,7% do valor bruto da produção agropecuária baiana. A cultura ocupa a oitava posição entre todas as atividades agropecuárias do estado, atrás de soja (31,4%), algodão (13,3%), pecuária bovina (13,1%), milho (6,6%), café (5,9%), frango (5,1%) e banana (4,9%).
Há uma diferença importante na dinâmica do mercado cacaueiro entre esses dois estados. Nos últimos dez anos, a área plantada com cacau na Bahia recuou 16%, e, apesar de deter a maior área com a amêndoa do país, com 72%, sua baixa produtividade – de 244 quilos por hectare, muito inferior à média nacional (435 kg/ha) – impactou diretamente sua produção, que caiu 30% no período. Com isso, o estado perdeu a liderança nacional para o Pará, que trilhou o caminho inverso: alta de 76% na área plantada e 126% na produção, reflexo do relevante ganho de produtividade, que saiu de 750 kg/ha em 2011 para 964 kg/ha em 2020, superando em quatro vezes a média da Bahia.
Do auge à perda do protagonismo do cacau brasileiro
A produção de cacau brasileira teve seu auge nas décadas de 1960 e 1970. Porém, o crescimento da área plantada e da produtividade abaixo das registradas em seus principais concorrentes globais levaram o Brasil a sair da liderança para a atual sexta posição no ranking mundial, segundo dados do International Cocoa Organization (ICCO).
Os números apontam que países da América do Sul estão com ritmo de crescimento acelerado e, se nada for feito, o Brasil poderá seguir em tendência de queda e perder mais posições na próxima década (2020-2029). Soma-se a esse quadro o surgimento da chamada vassoura-de-bruxa, na segunda metade dos anos 1980, que consolidou o declínio da produção agrícola ao longo dos anos seguintes, principalmente em decorrência da falta de investimento. Desde então, tornaram-se comuns as situações de desabastecimento da indústria processadora, o que levou à necessidade de importação de amêndoa de cacau.
Divergência estatística e desabastecimento da indústria de moagem de cacau no Brasil
Estima-se que, em 2020, as indústrias processaram 231 mil toneladas de cacau, sendo 184 mil toneladas originadas no Brasil. Nos últimos dez anos (2011-2020), houve a necessidade de importação de 44 mil toneladas da amêndoa, na média, volume que poderá ser suprido pelo produtor brasileiro desde que a agenda de retomada do crescimento agrícola avance, considera o estudo da Fiesp.
Laerte Moraes, presidente do Conselho Diretor da Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), alerta para a divergência nas estatísticas oficiais da amêndoa de cacau. Segundo ele, em 2020 foi estimado para esse tipo de amêndoa 273 mil toneladas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e, se somada a importação de 46 mil toneladas, representaria uma disponibilidade interna para moagem de 319 mil toneladas, volume quase 89 mil toneladas acima do real processamento da indústria. “Há necessidade de corrigir essa diferença nas estatísticas oficiais e a indústria está disposta a colaborar com os órgãos para esse aprimoramento”, mencionou.
Retomada do investimento no meio agrícola
Um dos principais desafios para a cultura do cacau é voltar a investir. Para Moraes, a solução não é fácil, tampouco de curto prazo, mas é necessária e urgente. “Muitos produtores de cacau ainda encontram dificuldade em acessar o crédito agrícola para financiar a renovação e aprimorar o manejo da lavoura, dado que reforça as discrepâncias entre sistemas produtivos dentro do próprio segmento”, diz ele.
O trabalho aborda alternativas para superar a questão da renda e financiamento do produtor, com foco no estímulo à associação dos pequenos e médios produtores em cooperativas e na maior integração indústria-produtor, visando melhorar a produtividade, a qualidade e os custos.
Para o diretor titular do Departamento do Agronegócio da Fiesp, Roberto Betancourt, a sobrevivência na agropecuária requer vocação, cooperação, conhecimento técnico-científico e, sobretudo, contínuo investimento em infraestrutura, manejo e novas tecnologias. “Há cases bem-sucedidos que podemos adaptar para a realidade do cacau, como o modelo de cooperativas dos produtores do Sul do Brasil e a parceria indústria-produtor consolidada na cadeia do frango e suíno”.
Mercado de chocolates no Brasil
A produção e o consumo interno de chocolates, considerando os achocolatados, são relativamente equivalentes no Brasil, e permaneceram estáveis nos últimos dez anos, com crescimento médio de 0,8% ao ano. Para Ubiracy Fonsêca, presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Amendoim e Balas (Abicab), há um potencial enorme de crescimento no mercado brasileiro. “Temos um consumo per capita anual de chocolates de 3,5 kg/ha, frente a cerca de 8,0 kg/ha em países desenvolvidos”, afirma.
Apenas a Região Sul do país detém consumo equivalente a esses mercados, com 6,8 kg/ha. “As oportunidades são significativas, as indústrias garantem grande inovação com amplo portfólio de produtos e porções, para ocasiões de consumo. Por exemplo, a cada 500 gramas adicionais no consumo per capita anual representaria um incremento de 100 mil toneladas na produção de chocolates, com reflexo em todos os elos da cadeia produtiva, gerando emprego e renda”, analisa Fonsêca.
Betancourt avalia que para a democratização do consumo de chocolate é importante avançar nas agendas das reformas necessárias ao desenvolvimento socioeconômico e aprimoramento da infraestrutura (logística e de conectividade), com geração de emprego e incremento real na renda média do brasileiro.