Sergio Furquim é Auditor Fiscal do Estado da Bahia e Vice-Presidente do IAF Sindical
Sérgio Furquim , Salvador |
25/08/2016 às 20:07
Sérgio Furquim é vice-presidente do IAF Sindical
Foto: BJÁ
Atualmente a dívida dos Estados ganhou as manchetes, principalmente porque para alguns Estados esta é uma das portas para melhoria das suas combalidas finanças depois do recrudescimento da recessão que derrubou suas receitas.
Desde o final do ano passado o assunto ganhou a agenda com o encaminhamento do PLP 257/2016, que além de renegociar a dívida dos Estados, pretendia uma completa modificação da lei de responsabilidade fiscal, impondo às unidades da federação regras ainda mais duras para cumprimento da LRF.
A renegociação entre o Governo Federal e os Estados expõe as imensas desigualdades regionais, pois beneficia principalmente quem mais se endividou (RS, SP, RJ e MG) em detrimento dos Estados mais pobres, e tecnicamente mais ajustados nas suas dívidas.
Histórico do Endividamento dos Estados
Ao contrário da situação atual, a renegociação da dívida dos Estados pós edição do Plano Real, Lei 9496 de 11 de setembro de 1997, e da edição da LRF tinha por objetivo atacar o principal fator de desequilíbrio de suas finanças, ou seja, suas dívidas.
O problema central das dificuldades dos Estado era o tamanho de sua dívida, derivada dos passivos dos bancos estaduais e o prazo restrito para pagamento. Os Estados estavam tecnicamente insolventes.
A União à época, absorveu as dívidas dos Estados e Municípios e se tornou o seu principal credor, além da obrigação gerada pela Lei 9.496/97 de adesão ao Programa de Reestruturação e Ajuste Fiscal, que fez com que Estados e Munícipios por mais de 15 anos pagassem praticamente somente suas dívidas, sem poderem captar novos empréstimos.
No ano 2000, sete estados estavam com limites estourados em relação ao índice estabelecido na Lei de Responsabilidade fiscal, todos acima de duas vezes as suas Receitas Correntes Líquidas.
Diversos outros estados também estavam com limite de endividamento alto, o que pressionava seu orçamento com comprometimentos elevados com o pagamento de amortização e juros.
Passados quinze anos da adesão ao Programa de Reestruturação e Ajuste Fiscal de 1997 e da Lei de Responsabilidade Fiscal, com bastante sacrifício de suas finanças e redução de investimentos, todos os estados melhoraram sua relação de comprometimento de suas dívidas com sua Receita Corrente Líquida.
Recessão
A recessão que se instalou no Brasil a partir de 2014, acertou em cheio as finanças estaduais no que tinham de mais saudável, que era a arrecadação de seu principal tributo, o ICMS.
A perda de arrecadação do ICMS levou os estados a graves problemas de fluxo de caixa, que somadas às quedas nas transferências constitucionais e nas receitas de royalties, geraram este quadro crítico nas finanças públicas desses entes, que apesar de preocupante, atinge os estados em diferentes graus de intensidade.
Renegociação da Dívida Pública
A renegociação da dívida pública dos estados permite uma folga nos seus orçamentos, mas principalmente para aqueles, que depois do advento da Lei de Responsabilidade Fiscal, ainda mantém alto índice de comprometimento de suas dívidas em relação à Receita Corrente Líquida, quais sejam: Rio Grande do Sul (2,27), Minas Gerais (1,99), Rio de Janeiro (1,98), Alagoas (1,70), São Paulo (1,68),
Dos aproximadamente 473,4 bilhões que serão renegociados, apenas 4 estados são responsáveis por 86,30% do montante total, ou seja, 408,5 bilhões estão concentrados em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.
Por coincidência são os Estados mais desenvolvidos e industrializados do Brasil.
Todos os demais estados devem juntos 64,9 bilhões de reais, ou seja, o impacto da renegociação nas suas finanças será muito baixo, com exceção do estado de Alagoas, que tem um comprometimento elevado na sua dívida em relação à Receita Corrente Líquida.
Estado da Bahia
O alívio nas finanças do Estado da Bahia com a renegociação da dívida pública é bastante limitado, em relação as suas necessidades, algo em torno de 40 milhões por mês neste segundo trimestre.
A Bahia foi um dos primeiros estados a aderir a renegociação em 1997 (Lei 9496 de 11 de setembro de 1997), e por conseguinte, com muito esforço ajustou o comprometimento da sua dívida em relação a sua receita corrente líquida ao longo de quinze anos. O índice baiano caiu de 1,82 em 2002 para 0,59 em 2015.
Em 1999, o serviço da dívida Pública do Estado da Bahia chegou a comprometer quase 19% de sua Receita Corrente Líquida, enquanto que em 2015 comprometeu apenas 5,84%, ou seja, um enorme esforço fiscal ao longo de 15 anos, o que inviabilizou inúmeros investimentos no estado.
Com a recessão, a Bahia foi duramente atingida pela redução de suas receitas de transferências constitucionais, principalmente o FPE, tendo em vista que o estado baiano é o que recebe o maior valor deste fundo entre as unidades federados.
O ICMS da Bahia no primeiro semestre de 2015, e principalmente, no mesmo período de 2016, foi duramente atingido pela recessão econômica.
Em termos reais (descontada a inflação - IPCA), a arrecadação do ICMS não avança desde 2014, apesar deste desempenho ser extremamente melhor do que as receitas das transferências constitucionais.
O processo de deterioração das finanças públicas baianas se agravou, tanto que desde o final de 2015 o limite prudencial da despesa de pessoal estourou, o que prejudicou a concessão de reajuste salarial do funcionalismo.
A conjuntura atual, na verdade, compromete os estados, que a exemplo da Bahia, tem capacidade de endividamento e que poderiam tomar empréstimos para investimentos, mas que por recusa de aval da União e por possíveis imposições e proibições na aprovação do PLP 257/2016 ficam impedidos de contratar.
Solução para os Estados que não estão endividados
Os estados menos desenvolvidos (a exceção de Alagoas), tanto economicamente como socialmente, são os mais ajustados em termos da relação Dívida X Receita Corrente Líquida, porém serão os mais prejudicados, pois terão pouco alívio financeiro para atravessar esse período recessivo, contando apenas com a renegociação de suas dívidas.
A solução definitiva para as dificuldades dos estados passa principalmente pela retomada do desenvolvimento econômico e crescimento do PIB, pois historicamente com o aumento destes índices, a arrecadação do ICMS responde positivamente, gerando um efeito virtuoso nas finanças estaduais, que deve vir acompanhado sempre pelo necessário controle da despesa pública.
A Liberação das solicitações de empréstimos, represada por falta de aval do Tesouro Federal para os Estados menos endividados, pode alavancar investimentos, combater o desemprego e ajudar na retomada do crescimento econômico.
O alívio proporcionado pela renegociação da dívida pública, proposto pela União, atinge poucos estados da federação, e aqueles que ao longo dos quinze anos não fizeram um ajuste mais profundo no seu índice de endividamento, serão os mais beneficiados.
Apesar de importante, o alívio nas finanças estaduais advindo da aprovação do PLP 257/16, deverá ser acrescido de medidas compensatórias, que não seja apenas a renegociação de suas dívidas, para que se faça justiça à maioria dos estados, que fizeram seu dever de casa com imenso sacrifício ao longo de 15 anos, e que merecem um melhor tratamento da União.