Direito

O DIA DO TRABALHO E A AMEAÇA DA PEJOTIZAÇÃO, por MOACY NEVES

Moacy Neves (Presidente do Sinjorba, 1º secretário da Fenaj).
Moacy Neves , Salvador | 01/05/2025 às 14:19
Na Barra, Salvador, preparativos para comemorar Dia do Trabalho
Foto: BJÁ
Colegas, desculpem o textão, mas hoje, DIA DO TRABALHADOR, queria chamar a atenção sobre o tema da pejotização. Paira no ar uma real possibilidade de se implementar a revogação prática de todos os direitos trabalhistas, ao arrepio da Constituição.

Recente decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF, de suspender as reclamações de reconhecimento de vínculo trabalhista no âmbito da Justiça Trabalhista, tem como pano de fundo o interesse da maioria liberal do Supremo em permitir o vale-tudo nas contratações pejotizadas, sem dar ao trabalhador o direito de reclamar quando houver fraude. O STF caminha pra legalizar as malandragens dos patrões, de contratar trabalhador com relação PJ para cumprir as mesmas exigências de um trabalhador CLT. Na verdade, com o voto contrário de dois ou três ministros, a depender da situação, a suprema corte já vem fazendo isso.

Nossa categoria é uma das mais prejudicadas por este processo de substituição de CLTs por PJs (números abaixo). Mas boa parte dessa substituição é feita como fraude trabalhista pois a relação PJ mantém os mesmos requisitos que constituem vínculo de emprego (habitualidade, subordinação, pessoalidade e remuneração fixa).

O Sinjorba e a Fenaj têm denunciado essas fraudes e o risco com as decisões do STF. Em fevereiro, juntamente com o presidente do Sindicato dos Jornalistas de SP, estive com o ministro Flávio Dino, do STF, tratando do assunto. Agora em abril, juntamente com a presidente da Fenaj, estive nos ministérios do Trabalho e da Previdência, cobrando do governo federal que se posicione sobre essa questão, uma vez que a continuidade da legalização dessas fraudes impactará os trabalhadores do ponto de vista social e previdenciário, mas também impactará as contas públicas (FGTS, INSS e seguro social).

Também agora no início de abril, o Sinjorba, o SJPSP e a Fenaj ingressaram como amicus curie no TST, em um julgamento de recurso repetitivo que trata desse tema. Estamos conversando com o MPT da Bahia como o órgão pode atuar para coibir a pejotização fraudulenta nos veículos de comunicação da Bahia. E pedimos audiências com os demais ministros do STF e com os presidentes da Câmara e Senado.

Porém, para ter sucesso na investida pelo trabalho decente e pelo respeito ao que restou de legislação trabalhista após a tragédia dos 6 anos e meio de Temer e Bolsonaro (aprovação da lei da terceirização irrestrita e das reformas trabalhista e da previdência) as entidades precisam da ajuda e atuação da categoria. Temos poder de pressão, mas o exercemos muito pouco.

Surgiro que leiam os textos dos dois links, além do editorial do Estadão e carta da Fenaj, que envio abaixo, para analisar com mais informações a situação e que usem suas ferramentas de pressão (a pena, por razões óbvias e suas redes, entre outros recursos) contribuindo com esse debate.

Vou dar alguns números para avaliação.

Entre 2013 e 2023, mesmo com isenções fiscais, os veículos de comunicação reduziram em 18% o número de trabalhadores com vínculo CLT. Sim, galera, o setor de comunicação é um dos 17 da economia brasileira que gozam de desoneração da folha de pagamentos. As empresas só não divulgam isso. Elas demitem, mas omitem que são beneficiadas com isenções para não demitirem.

Somente no ano de 2024, o Ministério da Fazenda recebeu 35.600 pedidos de registro MEI com Cnaes de EDIÇÃO DE JORNAIS e EDIÇÃO DE REVISTAS.

Apenas esses dois números vão comprovando que estamos migrando de uma categoria com direitos para uma categoria sem qualquer direito. E, diferente do que Gilmar Mendes e cia querem impor, não é por opção pessoal e sim por necessidade e, muitas vezes, por imposição de quem nos contrata.

Estamos na luta. Para vencermos, precisamos de todos.

Um bom Dia do Trabalhador. Abraço.

Moacy Neves (Presidente do Sinjorba, 1º secretário da Fenaj).


LEIA MAIS
Artigo Conjur – 'Pejotização' do trabalho: o que está em jogo no Supremo https://l1nq.com/Dwm3f

Artigo Luis Nassif - A bomba de nêutron contra a CLT
https://l1nq.com/Pbpk9

Carta da Fenaj às centrais sindicais
CARTA À CUT, ÀS CENTRAIS E AO MOVIMENTO SINDICAL

Caras(os) companheiras(os)

Como é de conhecimento público, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu em 14 de abril de 2025 a suspensão de todos os processos em curso, em âmbito nacional, que tratam de reclamações trabalhistas reivindicando vínculo empregatício em situações de “pejotização”. Pela decisão, a suspensão deve perdurar até que o STF julgue um caso cuja decisão valerá como de “repercussão geral”. A decisão é da maior gravidade, pois protela o reconhecimento judicial de demandas justas de milhares de trabalhadores e, mais grave, representa real ameaça a que esses direitos não sejam jamais reconhecidos!

Depois da Reforma Trabalhista, da Lei da Terceirização e da Reforma da Previdência, surge nova ameaça de retrocesso sem precedentes nos direitos duramente conquistados pela classe trabalhadora brasileira. É preciso dar um basta!

Decidimos escrever esta mensagem pois, como entidade nacional dos jornalistas, representamos uma categoria assalariada que enfrenta o flagelo da “pejotização” há cerca de três décadas. Nesse período, acumulamos enfrentamentos sindicais e experiências que queremos compartilhar e podem ser úteis para o conjunto do nosso movimento.

1. Há situações perfeitamente legais nas quais profissionais prestam serviços por meio de empresas/pessoas jurídicas. A Lei da Terceirização, de 2017, legalizou a prestação de serviços terceirizados para atividades fins de empresas. Mesmo sendo contrários a essa lei, que, em nossa opinião, fragmenta as cadeias produtivas, somos conscientes de que é legal colocar profissionais terceirizados para desenvolver trabalhos ligados à atividade fim de qualquer empresa. Esses trabalhadores terceirizados, porém, continuam tendo direito a vínculo empregatício, sendo o empregador direto a empresa que presta o serviço terceirizado;

2. A chamada “pejotização”, porém, consiste numa fraude às relações de trabalho: o empregador, em vez de fazer o registro em carteira, constrange o funcionário abrir uma MEI (microempresa individual), com a qual registra um contrato de prestação de serviços. Com isso, reduz os seus custos, às custas dos direitos trabalhistas do funcionário e dos recolhimentos à Previdência Social e ao Imposto de Renda;

3. A CUT e as demais centrais sindicais vão a Brasília em 29 de abril de 2025. Elaboraram já uma primeira abordagem sobre esse tema. Consideramos da maior importância que possam se dirigir ao Supremo Tribunal Federal, nesta oportunidade ou em outra futura, para defender firmemente a formalização da relação de trabalho. Para dizer em termos claros: o vínculo empregatício – ou registro em carteira – é obrigatório quando, na relação com uma empresa, o trabalhador tem habitualidade, subordinação, pessoalidade (é ele quem presta o serviço) e remuneração. Quando essas quatro condições se verificam na prática – o que é feito nas instâncias da Justiça do Trabalho, com base em provas concretas –, um contrato não pode se sobrepor nem anular a necessidade de registro em carteira. Isso porque o patrão é o lado forte na relação de trabalho, e pode impor, pela força econômica, condições degradantes ao trabalhador. O assalariado, independentemente de sua remuneração ou grau de instrução, vive do seu rendimento mensal e precisa do trabalho;

4. As decisões da Justiça do Trabalho dando ganho de causa a trabalhadores “pejotizados” que pediram vínculo empregatício se baseiam em provas que atestam a realidade dos fatos. Quando o patronato recorre ao STF, não entra no mérito das provas contra ele, mas apenas defende, genericamente, que, como a terceirização de atividade fim é autorizada pela lei, o contrato entre duas empresas não pode ser questionado pela Justiça do Trabalho (!!). O STF anulou decisões argumentando basicamente que a terceirização é lícita. Nosso alerta é grave, mas simples: se esse entendimento prevalece, a “pejotização” substituirá o registro em carteira em todo o país e a contratação formal de trabalhadores pode virar letra morta;

5. Para ser mais específico: se prevalece a ideia de que o serviço de qualquer pessoa pode ser prestado por intermédio de uma MEI, o contrato então firmado pode abolir a jornada de trabalho, o descanso semanal remunerado, as férias, o piso salarial da categoria e o próprio salário mínimo. Acabaria a base para caracterizar o trabalho análogo à escravidão, como alertou o respeitado jornalista Luis Nassif. Qualquer avanço legal, como a mudança da escala 6 por 1 para 5 por 2, com redução da jornada de trabalho, seria inócua sem a prevalência do registro em carteira. A própria Justiça do Trabalho perderia sua razão de existir. Outra consequência de grande magnitude seria a derrocada da arrecadação da Previdência Social;

6. Enquanto federação e sindicatos de jornalistas, lutamos há décadas contra a “pejotização”. Continuamos organizando os jornalistas “pejotizados”, pois, na prática, continuavam como funcionários de empresas de comunicação. Notem que as entidades sindicais não podem representar juridicamente esses trabalhadores, a não ser em ações de vínculo empregatício. Mas, como eles continuavam sendo, na prática, empregados, em situações como atraso de salários (formalmente, atraso no pagamento de “prestadores de serviço”), já organizamos inclusive greves de pejotizados. É como se tivéssemos voltado ao século 19, quando não havia qualquer direito trabalhista! Nos últimos anos, a FENAJ tem buscando avançar nesse enfrentamento. Em 2024, nos reunimos com a Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho) para debater a questão. Em 2025, já comparecemos ao STF para tratar do tema, e a FENAJ atua como amicus curiae em uma ação a respeito no Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Companheiras(os), estamos à disposição da CUT, das centrais e dos demais sindicatos para expor nossa experiência, para debater a questão e para lutarmos juntos contra a “pejotização”, contra a perda total dos direitos trabalhistas no Brasil.

Temos de dizer ao STF: Quando há subordinação, habitualidade, pessoalidade e remuneração, sempre existe o vínculo de emprego! Abaixo a pejotização! Defesa do registro em carteira!

Federação Nacional dos Jornalistas – 29 de abril de 2025

https://sinjorba.org.br/ameaca-contra-jornalista-da-tv-aratu-revela-necessidade-de-defesa-do-jornalismo/