Direito

COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS DA OEA ESTÁ NO BRASIL E ANALISAR CENSURA

Com informações da Gazeta do Povo
Tasso Franco ,  Salvador | 14/02/2025 às 17:46
Pedro Vaca é o chefe da missão
Foto: DIV
     A visita oficial da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) ao Brasil nesta semana despertou sensações ambíguas na oposição. Alguns a veem como ocasião importante para ajudar a barrar a onda de censura no país, enquanto outros a encaram com ceticismo e não veem chance de consequências relevantes.

O órgão internacional veio para avaliar a situação da liberdade de expressão no país. A missão, liderada pelo relator especial Pedro Vaca entre 9 e 14 de fevereiro, ocorre após um convite feito pelo próprio governo Lula, através do Itamaraty, motivado por denúncias feitas pela oposição à CIDH.

A Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da CIDH já se reuniu com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), parlamentares, membros do Ministério Público, representantes de organizações de direitos humanos, jornalistas, vítimas de censura e perseguição judicial e donos de plataformas digitais, em encontros realizados em Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo.

Embora a CIDH seja um órgão independente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que é o tribunal da OEA responsável por julgar casos de violações desse tipo, sua atuação pode influenciar futuras medidas dessa Corte contra o Brasil, caso a comissão identifique violações sistemáticas à liberdade de expressão no país.

A vinda da CIDH só foi possível porque o governo Lula concedeu autorização, já que, conforme previsto no artigo 48 do Pacto de São José da Costa Rica, a Comissão não tem o direito automático de conduzir inspeções nos países signatários. "Caso o Brasil tivesse barrado a visita do sr. Vaca, ele não viria, o que não quer dizer que o Brasil tenha sido especialmente magnânimo. A negativa seria um horror de relações públicas", esclarece Luiz Augusto Módolo, doutor em Direito Internacional pela USP.

O principal alvo das acusações de abuso não é o governo Lula, mas o Judiciário brasileiro, responsável direto pelos casos mais graves de censura e perseguição contra a oposição no Brasil. A expectativa é que, ao final da missão, a CIDH apresente suas conclusões por meio de um relatório e, caso considere necessário, encaminhe recomendações ao governo brasileiro.

A CIDH não tem poder para impor sanções diretas ao Brasil, mas sua visita pode ter alguns desdobramentos políticos, diplomáticos e jurídicos. Os relatórios não obrigam o cumprimento das recomendações, mas costumam ser usados como referência por organizações internacionais e governos estrangeiros para pressionar mudanças políticas ou legislativas, e são um primeiro passo para a instauração de processos na Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Como é o processo na CIDH

Maíra Miranda, doutora em Direitos Humanos pela Universidade de Salamanca, explica que a CIDH opera dentro de um sistema de "soft law", ou seja, suas recomendações não são obrigatórias.

"A CIDH emite recomendações aos Estados, que não são vinculantes. Apesar de contar com a boa-fé dos Estados no cumprimento de suas recomendações, não há uma obrigação jurídica estrita", diz. "No Sistema Interamericano de Direitos Humanos, é a Corte Interamericana que profere decisões vinculantes, pois se trata de um tribunal e, portanto, suas sentenças são obrigatórias aos Estados. E quem encaminha os casos à Corte é a Comissão, tendo, assim, um papel decisivo para a eventual responsabilização do Estado."

Relatórios da CIDH podem ser usados por organismos internacionais para questionar o país em fóruns como a ONU e a própria OEA. Além disso, políticos e organizações da sociedade civil podem usar o documento como base para ações judiciais ou pedidos formais de mudanças em políticas públicas.

Uma das ferramentas mais imediatas que a CIDH pode usar são as medidas cautelares, que servem para proteger indivíduos em situação de grave risco antes mesmo de que haja julgamento pela Corte Interamericana. "Ela pode, por iniciativa própria ou a pedido da parte, conceder a medida. Neste sentido, seria possível a concessão de medidas cautelares a vítimas cuja situação grave e urgente seja conhecida pela Comissão, por exemplo, durante a visita da Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão", explica Maíra.

Medidas cautelares poderiam ser, na prática, por exemplo, a proteção física com escolta policial para vítimas de perseguição, a revisão de prisões arbitrárias, a obrigação de garantir tratamento médico ou psicológico, a suspensão de medidas que ferem os direitos humanos etc. A garantia do cumprimento das medidas cautelares da CIDH se dá por mecanismos de pressão internacional, princípios de boa-fé entre os Estados e, em processos mais avançados, pela possibilidade de uma futura condenação internacional.