As condições degradantes de alojamento, a falta de equipamentos de proteção à saúde e a segurança e de sanitários, além de uma série de outras irregularidades fizeram com que 330 cortadores de cana fossem resgatados de situação de trabalho análogo ao de escravos. O flagrante foi feito por força-tarefa composta por representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT) e governo do estado da Bahia, com o apoio da Polícia Rodoviária Federal (PRF) em fazenda pertencente à União Industrial Açucareira (Unial), no município de Lajedão, extremo sul baiano, na divisa com Minas Gerais.
A empresa que atua no ramo sucroalcooleiro já vem sendo investigada pelo MPT há bastante tempo e teve outros episódios de resgate em situações semelhantes. Desta vez, no entanto, o nível de degradação da dignidade humana fez com que a força-tarefa classificasse a situação dos cortadores de cana como de escravidão moderna. O superintendente da Unial na região, Edmilson Felismino de Araújo, chegou a ser conduzido à Delegacia da Polícia Federal de Porto Seguro, onde foi ouvido e foi liberado. A PF, no entanto, vai instaurar inquérito para apurar o caso.
A unidade da Unial em Lajedão, a 767 quilômetros de Salvador, é alvo de dois inquéritos civis em andamento no MPT que apuram casos de terceirização ilícita, violações à NR-31, doença ocupacional e trabalho infantil. “Os trabalhadores não tinham equipamentos de proteção, não dispunham de sanitários nem de qualquer proteção contra o sol ou a chuva nos locais de corte de cana. Além disso, o alojamento apresentava condições precárias de higiene, principalmente em relação à água usada, armazenada em um tanque com plantas e restos de produtos químicos”, relatou o procurador Ilan Fonseca, que integrou a força-tarefa.
Todos os 330 trabalhadores que estavam alojados na fazenda foram identificados por nome, mas não puderam ser retirados do local por falta de condições de transporte. O MPT ainda tenta negociar com a empresa o pagamento das rescisões e indenizações por danos morais coletivos, mas já se prepara para pedir na Justiça do Trabalho esses pagamentos, caso haja uma negativa de acordo. Como o Ministério do Trabalho e Emprego não pôde mandar auditores fiscais do trabalho para integrar a força-tarefa, a rescisão indireta dos contratos de trabalho só poderá ser feita ou voluntariamente pela Unial ou por uma decisão da Justiça do Trabalho.
O procurador informou que a empresa tentou ocultar provas das condições degradantes a que os cortadores de cana estavam submetidos, mas que não apresentou resistência à inspeção. Ele justificou a condução do superintendente da Unial à delegacia por ter sido configurada situação de trabalho escravo, que além de um ilícito trabalhista, também é considerado crime previsto no Código Penal. O superintendente foi conduzido pela equipe até a delegacia da Polícia Federal, onde o delegado plantonista, Carlos Cristinao Tenório Urubá, lavrou o termo circunstanciado e liberou o dirigente, ainda na noite de ontem.
Três prepostos da empresa ainda serão ouvidos na tarde desta sexta-feira na sede do MPT em Eunápolis-BA. Além de colher alguns elementos para fechar o relatório de inspeção, ele vai tentar negociar o pagamento das verbas rescisórias e indenizações aos trabalhadores. Caso a Unial não aceite fazer os pagamentos, uma ação civil pública será ajuizada na próxima semana pedindo que a Justiça determine a rescisão indireta e os pagamentos. Esse é o terceiro resgate de trabalhadores em unidades da Unial na Bahia.
Além do procurador do trabalho Ilan Fonseca, também participaram da força-tarefa o servidor do MPT Agnaldo Alves Matos, os policiais rodoviários federais Renato Divino Alves, Alessandra dos Santos Bonfim, Marcus Vinícius de França Moreira e Osvaldo Duarte Myles Neto, a servidora da Secretaria do Trabalho, Emprego e Renda (Setre) Josinélia Chaves Moreira, e a também servidora da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social da Bahia Cleide Costa de Freitas Fontes Torres.