O Ministério Público Federal (MPF) abriu um inquérito para investigar irregularidades na elaboração do projeto de “requalificação” do Rio Vermelho e na execução das obras. A medida foi tomada após o coletivo Rio Vermelho em Ação entrar com uma representação no órgão, apontando os claros indícios de violações ambiental e ao patrimônio histórico e cultural do bairro.
A portaria que instaura o inquérito foi assinada pelo Procurador da República Domênico D’Andrea Neto. No texto, ele considerou importante obter maiores informações sobre as denúncias dos moradores, frequentadores e admiradores do Rio Vermelho e oficiou cinco órgãos para prestarem esclarecimentos no prazo de 30 dias: a Fundação Mario Leal Ferreira, da Prefeitura de Salvador; o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN); a Superintendência de Conservação e Obras Públicas do Salvador e a Secretaria de Infraesturura e Defesa Civil, também municipal.
Para o coletivo Rio Vermelho em Ação, as obras da prefeitura no bairro causam danos não só ambientais e ao patrimônio histórico e cultural, como também à população, pois prevê um grave processo de gentrificação - alteração das dinâmicas da composição do local, afetando a população de baixa renda, aumentando os custos de bens e serviços, dificultando a permanência de comerciantes cuja renda é insuficiente para se manter na região.
Audiência Pública - O coletivo tem exaustivamente solicitado à Prefeitura a participação popular para analisar o projeto de requalificação prevista para o bairro, garantindo que os interesses dos moradores, frequentadores e pequenos comerciantes sejam contemplados, e não somente os interesses do setor imobiliário e comercial. O objetivo primeiro é conseguir uma audiência pública para que o projeto seja apresentado em larga escala, de forma que todos possam opinar e ao mesmo tempo fiscalizar a atuação da Prefeitura nas obras. De acordo com o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001) qualquer grande obra, principalmente projetos de requalificação, precisa ser debatida em audiência pública com ampla divulgação, publicação no Diário Oficial do Município e nos grandes veículos de comunicação impressos e televisivos. O que não ocorreu.
Urbanistas, sociólogos e comunicadores que participam do coletivo veem não projeto de “requalificação” um claro interesse de elitizar o bairro, vide a expulsão de trabalhadores e a derrubada do Mercado do Peixe para dar lugar a quiosques gourmets geridos por empresários do ramo alimentício, já estabelecidos no mercado com restaurantes. Com isso, deverão ser expulsos também ambulantes e trabalhadores informais das áreas públicas, esvaziando o bairro e obrigando os frequentadores a adentrarem nos estabelecimentos fechados e caros. Estes mesmos especialistas lembram ainda que o Rio Vermelho é área de lazer de moradores do Nordeste, Vale das Pedrinhas, Chapada e Federação.
Dentre tantas medidas repudiadas pelo coletivo estão a retirada das quadras do bairro (utilizadas, inclusive, pelos moradores das periferias), redução de capacidade de público e de mesas dos Largos de Santana e da Mariquita (o que ocasionará menos clientes e demissões de funcionários, derrubada de árvores para pavimentação; e a padronização do bairro, adorado pelas suas peculiaridades, polo da diversidade e um espaço de socialização, “ Não pode virar condomínio fechado”, destaca o coletivo.
SOBRE O COLETIVO - Formado espontaneamente via internet, o coletivo já tentou dialogar com a Associação dos Moradores e Amigos do Rio Vermelho (AMARV). A atuação desta Associação tem sido preocupante, sobretudo por se colocar favorável às intervenções que claramente não contemplam a todos e demonstram o grave processo de gentrificação. Além disso, a Associação, que participou de encontros com a Prefeitura, tornou o diálogo fechado e restrito a um número pequeno de pessoas.