Direito

HEDIONDO: Fantástico mostra como PMs matam menor no Rio de Janeiro

Fantástico mostra, com exclusividade, detalhes de história chocante que resultou na morte de um adolescente. Acusados pelo crime, dois PMs foram presos.
G1 , RJ | 21/07/2014 às 10:27
A câmara do carro da PM gravou todo o diálogo entre os dois cabos
Foto: DIV
Uma história chocante. Um adolescente foi encontrado morto há cerca de um mês em uma área de mata na cidade do Rio de Janeiro. Acusados pelo crime, dois policiais militares foram presos.

As imagens de duas câmeras instaladas no carro da PM incriminaram os policiais, as gravações, que o Fantástico conseguiu com exclusividade, você conhece, na reportagem abaixo do Eduardo Tchao:

Centro do Rio de Janeiro, 11 de junho de 2014. Os policiais militares Fábio Magalhães e Vinicius Lima fazem ronda próximo a uma das principais avenidas da cidade, a Presidente Vargas.

Essas imagens foram gravadas por duas câmeras instaladas na viatura: uma na parte de dentro e outra na frente.

Às 9h31 da manhã, o cabo Lima para o carro e o cabo Magalhães pega o fuzil e sai da viatura. Ele está atrás de dois garotos, suspeitos de cometer furtos na região. No canto esquerdo do vídeo um garoto de camiseta azul passa correndo, seguido por um garoto de camiseta preta. O cabo Lima deixa a direção para dar apoio ao colega.
Policiais capturam primeiro garoto e colocam na viatura

Era o começo da perseguição que terminaria uma hora depois, de forma trágica.
Às 9h32 o primeiro PM que saiu do carro volta e avisa pelo rádio:

Cabo Magalhães, no rádio: Dois elementos de calça e camisa escura tão invadindo a guarnição aqui, correto? Fica atento aí, ó.

Três minutos depois, os policiais capturam o primeiro garoto e o colocam na caçamba da viatura. A perseguição continua atrás do segundo garoto.

Cabo Magalhães: Atravessa a rua e pega ele aí, pô!

Minutos depois, o cabo Magalhaes desce do carro. No canto esquerdo do vídeo, o cabo lima aparece com um segundo adolescente. E dois guardas municipais trazem ainda um terceiro suspeito.
Cabo Lima fala sobre o momento da captura

Os PMs voltam para o carro, desta vez com os três garotos na caçamba, e o cabo Lima fala do momento da captura.

Cabo Lima: Porra, eu vim e botei o fuzil na cara dele. Mas a piranha de uma mulher ainda entrou na frente. Eu falei ‘sai da frente, porra! Deita no chão, Deita no chão!’ Até destravei o fuzil. Se corresse eu ia dar, mano.

Ele então explica porque o terceiro adolescente foi apreendido
Cabo Lima: ‘Deita no chão’, aí já cheguei e bandei. Aí o outro bonitão ali ficou de longe assim, olhando. Aí eu falei pros guarda municipal: ‘o de preto ali também’. Aí o cara foi ali e pegou.
Policiais combinam o que fazer com os adolescentes

Os PMs combinam o que fazer:
Cabo Lima: Lá para cima?
Cabo Magalhães: Descarregar a arma um pouquinho.
Cabo Lima: Jogar lá de cima.
Lá em cima, para os policiais, é o Morro do Sumaré, que fica dentro da Floresta da Tijuca. O GPS da viatura mostra o caminho percorrido na meia hora seguinte à conversa.
Às 10h20, os PMs fazem a primeira parada. Os dois descem do carro e olham o penhasco, do lado direito. E provocam os garotos.
Cabo não identificado: A gente nem começou a bater ainda e vocês já tão chorando?
Os policiais voltam para o carro. E dirigem por menos de um minuto. Eles se olham e descem, pela segunda vez, para observar o local. O cabo Magalhães simula disparar um tiro. E o cabo Lima grita com os adolescentes: “Para de chorar, porra! Tá chorando pra c******. Seja homem, porra!”.
Policiais não respondem ao chamado pelo rádio

Dois minutos depois, a terceira e última parada. Novamente, os PMs vão até a beira do penhasco. Dentro do carro, o rádio toca.
Rádio: Viatura, 1651!
O número 1651 é o número da viatura dos policiais. Eles não respondem. O cabo Lima aparece com o fuzil. E o cabo Magalhães pega a chave para abrir a caçamba.
Cabo não identificado: Se tiver correria vai morrer aqui mesmo!
Imagens da viatura são cortadas 

Os PMs saem com um dos garotos, de camiseta preta. É o terceiro adolescente que foi apreendido no Centro da cidade. Os outros dois ficam na caçamba. Até as 10h32, pelo menos. É que, a partir deste momento, o vídeo é interrompido.
A viatura da polícia estava parada no momento em que a imagem é cortada. O vídeo recomeça com os policiais já no carro, descendo o morro. E sem ninguém na caçamba. Eles aparentam estar tranquilos. O terceiro adolescente reaparece na descida do morro. Tinha sido liberado pelos policiais. Os dois PMs dão carona para o jovem, o que é proibido, e ameaçam o rapaz que diz trabalhar na Uruguaiana, uma região do comércio popular do Centro do Rio.
Cabo Magalhães: Se tiver alguma fofoca ali na Uruguaiana de que tu veio aqui em cima com a gente, a gente vai atrás de tu. Escutou? Vai fingir que nada aconteceu.
Eles deixam o garoto nos Arcos da Lapa às 11h.
Cabo Magalhães: Desce aí!
E seguem para um chamado no Centro da cidade.
Jovem de 14 anos é encontrado morto no alto do Morro do Sumaré

Cinco dias depois, Matheus Alves dos Santos, de 14 anos, foi encontrado morto no alto do Morro do Sumaré. As investigações da Polícia Civil mostram que ele era um dos garotos que estavam dentro da caçamba.

O outro, de 15 anos, levou dois tiros, mas sobreviveu. Ele prestou depoimento na Divisão de Homicídios e participou da reconstituição do crime, contando tudo o que aconteceu principalmente nos dez minutos em que o vídeo é interrompido. O garoto disse que fingiu que estava morto.

Sobrevivente: Já botaram atirando no meu joelho. O outro já foi e falou assim: ‘pega lá o fuzil, lá’. Já pegou o fuzil e foi dando nas minhas costas.
Corregedor da PM afirma que imagens se perderam

A Polícia Militar informou que repassou o nome dos policiais, as imagens da viatura e os dados do GPS para a Polícia Civil.

O corregedor da PM disse, em entrevista coletiva, que as imagens se perderam.
“Como a gente perde a imagem num determinado momento, nós não temos condição de dizer o que efetivamente eles fizeram e como eles fizeram”, diz o corregedor da Polícia Militar coronel Sidney Camargo.
Polícia Civil investiga porque imagens desapareceram

A Polícia Civil agora investiga porque parte das imagens desapareceu.
“Eu acho que eles sabiam que estavam sendo filmados, mas não contaram que um dos menores ia sobreviver”, diz Homero Freitas Filho, promotor.
Os dois policiais estão presos. E a Justiça já aceitou a denúncia por homicídio e ocultação de cadáver.
Advogado dos policiais não quis dar entrevista

O Fantástico procurou o advogado dos cabos Lima e Magalhães, mas ele não quis dar entrevista.
“Eles tinham certeza da impunidade. Ninguém comete um crime desses com a mínima possibilidade de ser punido. Essas duas pessoas não podem e não vão retornar às fileiras da PM”, afirma Homero Freitas Filho, promotor.