Celso de Mello desempata polêmica e STF terá que reavaliar penas de 12 condenados
FSP , BSB |
18/09/2013 às 17:14
Como já era esperado, o ministro Celso de Mello, aceitou os embargos infringentes
Foto: G1
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que 12 dos 25 condenados pelo mensalão terão direito a reavaliação de algumas de suas penas. Com isso, réus como o ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) poderão escapar da prisão em regime fechado.
O decano da corte, Celso de Mello, acaba de aceitar essa possibilidade, desempatando a discussão. Por 6 votos a 5, os ministros admitiram a apresentação dos novos recursos, chamados de embargos infringentes, para os casos em que um condenado teve ao menos quatro votos a seu favor no julgamento realizado no ano passado.
Em seu voto favorável à revisão das condenações, Mello disse que o STF deve tomar suas decisões em ambiente de serenidade e não pode deixar-se contaminar pela opinião pública.
Acompanhe a sessão ao vivo
"Se é certo que a Suprema Corte constitui por excelência um espaço de proteção e defesa das liberdades fundamentais (...) não pode expor-se a pressões externas como as resultantes do clamor popular e pressões das multidões sob pena de completa subversão do regime constitucional de direitos e garantias individuais", disse.
O decano ainda lembrou que a viabilidade dos embargos infringentes consta no regimento interno do STF desde 1909, por isso ainda estariam válidos na nova versão do documento, de 1980.
Ele ainda afirmou que, nesta etapa do julgamento é preciso se analisar somente se o recurso é ou não viável, não podendo se deixar influenciar por suas possíveis consequências. "Prematuro discutir por isso mesmo, nesse primeiro momento, o mérito do recurso em questão. Superado esse estágio inicial é que resolverá o fundo da controvérsia penal".
MANIFESTANTES
Enquanto o ministro Celso de Mello defendia, no plenário, a admissibilidade dos novos recursos, manifestantes começaram um tumulto com os seguranças na frente da corte.
O grupo, de cerca de 40 pessoas, passou por uma das cercas instaladas em torno do Supremo, mas foi contidos por seguranças.
A votação sobre a aceitação dos novos recursos foi polêmica, como o placar apertado indica. Na últimas sessões, os ministros Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello fizeram discursos inflamados no qual apontaram que o STF estava "a um passo" de perder a credibilidade ganha com as duras condenações de autoridades e empresários durante o julgamento no ano passado, cessando um ciclo de impunidade.
O novato da corte, o ministro Luiz Roberto Barroso, fez a defesa da aceitação dos recursos e foi repreendido por Marco Aurélio, ensejando uma discussão sobre o papel da opinião pública nas decisões do STF.
TESES EM JOGO
Havia duas teses em jogo, que dividiram o tribunal. Para o presidente da corte e relator do mensalão, Joaquim Barbosa, os embargos não são aceitáveis porque uma lei de 1990 que reformou o trâmite de recursos no STF e no Superior Tribunal de Justiça não os prevê.
Neste entendimento, ele foi seguido por Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello. Outros argumentos foram colocados: o risco de se criar uma contradição sistêmica, já que os embargos valeriam para réus com foro privilegiado no STF, mas não para os julgados no STJ, caso de governadores.
Mas o restante da corte entende que os embargos são aceitáveis porque o antigo regimento interno do STF os admitia também em ações penais originárias no próprio tribunal --caso do mensalão.
Votaram neste sentido, além de Celso de Mello, Luís Roberto Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber, Dias Toffoli, e Ricardo Lewandowski. Responsável por fazer a revisão do voto do relator, Lewandowski enfim colheu uma vitória em seu embate com Joaquim Barbosa.
Ambos protagonizaram algumas das mais agressivas discussões já vistas no plenário do STF, durante todo o julgamento do mensalão, mas até aqui o presidente via seu ponto de vista em prol de condenações duras ser majoritário na corte.
CONDENADOS
O caso é o mais rumoroso da história da corte, não menos por envolver a antiga cúpula do partido que ocupa a Presidência desde 2003 em um esquema de compra de apoio parlamentar ao governo Luiz Inácio Lula da Silva.
No caso de Dirceu, por exemplo, há a possibilidade de ele ter extinta ou reduzida sua pena por formação de quadrilha. Hoje ele está condenado a 10 anos e 10 meses de cadeia --qualquer tempo acima de oito anos tem de ser cumprido em regime fechado, para só então progredir para o semiaberto, no qual o condenado apenas dorme na prisão.
Como sua condenação por corrupção ativa não teve quatro votos favoráveis, Dirceu continuará tendo de cumprir 7 anos e 11 meses desta sentença. Mas aí escapa de ir para a cadeia em tempo integral. Lógica semelhante se aplica a Delúbio e João Paulo.
O ex-presidente do PT José Genoino já está condenado ao semiaberto, mas poderá ter sua pena reduzida.
Para outros condenados, como o operador do esquema, publicitário Marcos Valério, e seus ex-sócios, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, o novo julgamento pode reduzir levemente suas penas, mas sem livrá-los da cadeia.
O mesmo pode se aplicar à ex-presidente e a um ex-diretor do Banco Rural, Kátia Rabello e José Roberto Salgado. Mesmo assim, no caso deles o regime inicialmente seria fechado.
Como somente 12 dos 25 réus terão direito ao novo julgamento, o STF terá de decidir nos próximos dias se vai determinar a execução da pena dos demais condenados. Advogados de defesa também estudam entrar com recursos específicos sobre o tamanho da pena aplicada a seus clientes --Barroso e Zavascki já disseram considerar as punições atuais muito severas.
Maior julgamento da história do STF, o mensalão consumiu quatro meses e meio em sua primeira etapa em 2012. Outras seis semanas foram necessárias entre a análise dos recursos e a decisão de se realizar uma reavaliação das penas de alguns réus.
O mensalão em si não será questionado nos novos julgamentos. O esquema foi revelado pela Folha em 2005. Em 2006, o Ministério Público Federal apresentou sua denúncia do caso, que foi aceita pelo Supremo no ano seguinte.
Em agosto do ano passado, o julgamento começou. Penas duras e discussões acaloradas, que descambaram para bate-bocas entre ministros, marcaram o debate. Ao fim, 25 foram condenados.
Dirceu acusou todo o julgamento de ser uma perseguição política motivada pelo que chamou de "inveja das elites" contra o sucesso do governo Lula, do qual era o segundo homem em comando.
PRÓXIMOS PASSOS
O novo julgamento para os réus beneficiados hoje depende da publicação do chamado acórdão, o documento que resume o que foi decidido nesta fase de recursos.
Após a publicação, os réus terão 15 dias para apresentar os embargos infringentes, que serão sorteados para um novo relator.
Só depois da entrega do voto do relator é que o presidente da corte pode agendar sessão para o julgamento. Ministros do STF ouvidos pela Folha acreditam que o desenrolar do processo, até a conclusão da revisão das condenações, poderá demorar um ano.
Por isso, o tribunal terá de avaliar se tenta encerrar o julgamento, declarando o chamado trânsito em julgado, para os réus que não terão direito aos embargos infringentes.
Com isso, condenados como os deputados Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT) iniciariam o cumprimento de suas penas. Os dois, como pegaram menos de oito anos, ficarão no regime semiaberto.