vide
Trabalho escravo e vida como no tempo do Brasil Colônia em fazendas do Oeste
Foto: ASCOM
Barreiras (BA) - Mais 33 lavradores que trabalhavam em condições análogas à de escravos foram libertados por uma operação conjunta do Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego e Polícia Federal. Eles exerciam atividades em condições degradantes em três fazendas localizadas nos municípios de Formosa do Rio Preto, no oeste baiano, e em Barreiras do Piauí, sul piauiense. O Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo inspecionou seis fazendas na região, que é considerada um dos focos do trabalho degradante, muitas vezes configurando situações análogas à de trabalho escravo.
A ação teve início dia 1º de maio e só foi concluída na última sexta-feira (11/05), depois que os proprietários das fazendas flagradas utilizando mão de obra de menores e oferecendo condições precárias de alojamento, alimentação, higiene e transporte, além de não registrar os contratos de trabalho em carteira, compareceram à sede do Ministério do Trabalho e Emprego de Barreiras-BA para prestar esclarecimentos. Alguns termos de ajuste de conduta já foram firmados e os lavradores identificados exercendo atividades sem as condições mínimas exigidas por lei foram indenizados.
Para o procurador do trabalho Luís Antônio Barbosa da Silva, "a prática ilegal da terceirização de atividades como catação de raiz tem sido a causa de muitos problemas. O fazendeiro contrata o intermediário conhecido como ‘gato' e se expõe ao risco de ter, em sua propriedade, trabalhadores aliciados de outra região do país, morando em alojamentos precários e sendo transportados em condições de risco de morte. A solução é assumir a atividade com empregados próprios".
O procurador do MPT destaca ainda a situação a que são submetidos os lavradores nessa região. "Para o trabalhador que é arrancado por motivos econômicos de sua terra de origem e arregimentado para trabalhar em locais de difícil acesso, sem sinal de celular, abre-se um cenário de duras jornadas de trabalho, sem repouso, em ambiente de sol escaldante, sem equipamentos de proteção, proteção previdenciária e alojamentos precários, configurando situações de trabalho degradante e violadoras de direitos humanos", relatou.
Flagrante na estrada
Após dois dias de operações, o grupo flagrou 17 pessoas sendo transportadas à noite em rodovia movimentada, 13 delas sobre a carroceria de uma camionete, em situação de acentuado risco de acidente, ficando evidenciado que o aliciador de trabalhadores tentava furtar-se à ação da fiscalização federal. O veículo foi parado e posteriormente escoltado até o local de destino. Os lavradores estavam sendo retirados, às pressas, da fazenda Olho Mágico, em Formosa do Rio Preto, após terem recebido informações de que o Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo estava na região.
Eles foram conduzidos à sede do município e hospedados em uma pousada para que no dia seguinte fossem tomados os depoimentos. Enquanto eram ouvidos os trabalhadores, parte dos fiscais seguiu para a fazenda a fim de avaliar as condições dos alojamentos, encontrando a mesma realidade verificada nas fazendas Itambi II e Itambi III, ambas em Barreiras do Piauí, onde quatro trabalhadores foram resgatados, sendo três menores de idade; e na Fazenda Recreio, esta em Formosa do Rio Preto, onde foram libertados oito lavradores.
As audiências realizadas durante a semana passada na sede do MTE de Barreiras já permitiram a solução de parte das irregularidades flagradas pelo grupo móvel. Os representantes das fazendas Itambi II e III e Recreio efetuaram o pagamento das rescisões de contrato dos lavradores encontrados pela fiscalização, com pagamento de dano moral individual, e também assinaram termo de ajuste de conduta para regularizar a situação do meio ambiente de trabalho, assumindo compromissos como o de limitar a jornada diária de trabalho, conceder descanso semanal aos domingos e em feriados, registrar todos os trabalhadores, fornecer equipamentos de proteção individual e garantir condições básicas de higiene, limpeza e conforto nos alojamentos.
Danos morais coletivos
No caso do proprietário das fazendas Itambi II e III, os proprietários Roberto e Toshio Kumasaka vão ainda arcar com indenização à sociedade por dano moral coletivo no valor de R$60 mil. Já o dono da Fazenda Recreio, Laércio Tagliari Bortolin, pagará R$34 mil também por dano moral coletivo. O MPT também manteve contato com entidades públicas da região a fim de destinar a elas os valores resultantes do dano moral coletivo. Entre as instituições beneficiadas, estão os Conselhos Tutelar de Formosa do Rio Preto e de Ribeirão das Neves. Trata-se de uma pena que os infratores têm que cumprir por terem lesado toda a sociedade ao se utilizar de trabalho em condições degradantes, muito próximas à condição de escravidão.
Os representantes da Fazenda Olho Mágico pediram prazo até a próxima sexta-feira (18) para avaliar o termo de ajuste de conduta proposto pelo MPT. Um dos proprietários da fazenda, João Carlos Burin, já prestou depoimento no inquérito instaurado. Nesse caso, o MPT estipulou uma multa por dano moral coletivo maior do que no caso das duas outras fazendas, por ter flagrado um maior número de trabalhadores expostos a condições degradantes e por ter sido configurada tentativa de fugir do flagrante.