Cultura

ART'MANDAIA É CONTEMPLADO COM PREMIO PERIFERIA VIVA MINISTÉRIO CIDADES

Saramandaia é um bairro de Salvador localizado na área da rodoviária, entre Cabula e Iguatemi
OC ,  Salvador | 23/11/2025 às 10:06
Lúcio Lima, criador e coordeanador do Art'Mandaia, do bairro Saramandaia
Foto: DIV
   Nascido no bairro da Saramandaia, em Salvador, o jovem realizador Lúcio Lima se firma como uma das vozes mais importantes do cinema periférico. Lúcio não filma de fora. Ele filma de dentro. Ele não interpreta a periferia: ele vivencia, respira e constrói junto. “Nós precisamos ser autores da nossa própria narrativa. Se não somos nós a contar, vão continuar contando errado”, declara.

  A partir desse princípio nasce o Art’Mandaia, idealizado por Lúcio Lima há 15 anos, dentro da própria comunidade. Um coletivo de arte, cultura, formação e memória que realiza oficinas de audiovisual, teatro e música; mobiliza jovens; cria ações nas escolas; organiza cineclubes; preserva arquivos; produz espetáculos e debates nos becos e vielas. Um projeto que ajuda a transformar o bairro em território de criação e pertencimento.

   O Art’Mandaia foi certificado como Ponto de Cultura pelo Ministério da Cultura, reconhecimento que legitima seu impacto e sua importância para a cultura popular e da periferia. Essa história, construída ao longo de anos, alcança agora o reconhecimento com o Prêmio Periferia Viva 2025, do Ministério das Cidades.

  Entre mais de 2.600 iniciativas brasileiras, o Art’Mandaia foi selecionado como uma das 150 vencedoras — colocando Saramandaia no mapa do país como referência de cultura, criatividade, educação popular e mobilização comunitária.

    “Quando o Art’Mandaia vence o Periferia Viva, não é só um prêmio. É Saramandaia dizendo ao Brasil: nós também produzimos arte, memória, afetos. Nós também criamos futuro”, acrescenta.

   A trajetória artística de Lúcio nasceu ainda criança, no grupo de teatro da APMS (Associação de Pais e Mestres de Saramandaia).  Seu primeiro trabalho no cinema veio em “Trampolim do Forte”, de João Rodrigo Matos, interpretando o protagonista Déo. O filme marcou sua estreia e despertou nele a certeza de que o cinema era o caminho.

    Licenciado em Arte pela UFBA, Lúcio mergulhou na produção audiovisual a partir do próprio território. Em “Retalhos – A memória viva de Saramandaia”, reconstruiu a história do bairro a partir de depoimentos de moradores e imagens raras gravadas por seu pai nos anos 80 e 90, revelando a luta pela moradia, os mutirões, as festas, as relações de vizinhança, as descobertas e os gestos que moldaram a identidade local.

   Depois, em “Pernambués – Quilombo Urbano”, expandiu seu olhar para um dos maiores e mais importantes territórios negros de Salvador. Agora, em 2025, Lúcio finaliza seu novo documentário sobre o Quilombo do Cabula — um território negro ancestral, datado do século XIX, marcado pela presença dos povos bantos e de práticas culturais, religiosas e sociais que ajudaram a constituir a Salvador negra que existe até hoje.

   Um filme que investiga memória, permanência e ancestralidade com olhar contemporâneo. Mas é com a ficção que Lúcio dá um novo passo. “Mundinho”, seu primeiro filme de ficção, foi filmado e finalizado em 2025.

   Protagonizado pelos atores baianos Luiz Pepeu e Cyria Coentro, intérpretes de enorme sensibilidade e prestígio, o filme acompanha um casal de idosos que, durante o lockdown, reencontra o amor, o humor e as fantasias antigas — enquanto enfrenta a fome e a falta de dinheiro dentro de casa.

   O dilema central — matar ou não Zefa, a galinha tratada como filha — expõe com delicadeza e intensidade a realidade de tantas famílias brasileiras naquele período. “Mundinho” acaba de ser selecionado para a Mostra Competitiva Nacional do Festival de Cinema de Trancoso, onde fará sua estreia nacional agora em dezembro.

   lúcio também já foi reconhecido com o Prêmio Antonieta de Barros, concedido a jovens comunicadores negros que enfrentam o racismo através da comunicação, e com o Prêmio Comunica a Diversidade, do Ministério da Cultura, que destaca iniciativas de comunicação popular com impacto social em todo o Brasil.

   Em todas essas obras, ele honra quem veio antes: Seu Armando Nicolau, Dona Terezinha, sua mãe Luciene Oliveira, seu pai Cícero Lima e o Padre Geraldo. No centro de tudo está Saramandaia.

   “Eu tenho orgulho de onde eu sou. Saramandaia é o meu ponto de partida e de chegada. É o lugar que me ensinou que a periferia não é cenário: é protagonista. O reconhecimento do Prêmio Periferia Viva reforça o que Saramandaia sempre foi: um território de arte, de força, de futuro”, finaliza.