Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado
Walmir Rosário , Salvador |
04/06/2025 às 14:30
Maravilha da natureza
Foto: DIV
Sempre acreditei piamente que Deus deixou as coisas boas do mundo para todos os seus filhos, indistintamente, embora alguns se deem ao luxo de esnobar algumas comidas e bebidas por algum motivo. Mas não cabe eu analisar o que eles pensam, o que gostam ou desgostam, nem os motivos que os levaram a abominar certos tipos de comes e bebes. Mas que acho estranho, isto é fato.
Na Bahia protegida por todos os santos, então, é uma infâmia desprezar as iguarias africanas, a exemplo do abará e do acarajé, que fazem sucesso e enchem a boca de água só em pensar. Bote sua cabeça para funcionar e se imagine comendo um acarajé com todo aquele recheio escorrendo pelos “cantos da boca”, com realce para o azeite de dendê! Comida dos orixás, dos deuses!
Se vosmicê se contenta com uma moqueca sem dendê, do jeito que é cozida em alguns estados, não sabe o que está perdendo. Mas ainda dá tempo de recuperar o atraso e conhecer o novo tipo de dendê que
é produzido pela Ceplac, em Una, no Sul da Bahia. Portanto, ao chegar a um bom restaurante ou tabuleiro de baiana do acarajé, pergunte primeiro: Esse prato é feito com o azeite de dendê Unauê?
Caso a resposta seja positiva, sossegue, relaxe e se sinta um privilegiado. Vosmicê estará prestes a embarcar numa experiência gastronômica sem precedentes. Sinta-se no olimpo e deixe que suas
papilas gustativas viajem pelos sabores despertados pelos temperos, gostos e, sobretudo o umami, presente no dendê Unauê.
Como disse no início dessa crônica, tenho que compartilhar com vocês essa novo dendê, que acredito ser uma iguaria dos deuses. Numa de uma das minhas incursões por Una, encontrei com o colega
ceplaqueanos José Inácio Lacerda Moura, engenheiro florestal da Ceplac, e responsável pela introdução do cultivar híbrido desse dendê na Bahia.
Era o ano de 1989 e o projeto previa a associação da alta produtividade do dendezeiro africano com a resistência ou tolerância a pragas e doenças, porte baixo e qualidade do óleo do caiaué. Esse trabalho contou com o apoio da Embrapa Amazônia Ocidental, e a intenção principal era evitar o debacle desse cultivo no Sul da Bahia.
José Inácio é Doutor em Entomologia Agrícola pela Unesp/Jaboticabal- SP; Especialista em Pragas das Palmeiras e Endoterapia Vegetal, também chefe da Estação Experimental Lemos Maia/Ceplac, em Una-
BA, e que goza de conceito internacional. Ele explica que o declínio da dendeicultura baiana estava e ainda está calcado em vários fatores, tais como os cultivares existentes, o custo com a colheita em razão da altura, baixa produtividade, óleo com alta acidez em virtude do mau manejo, falta de assistência técnica e problemas fitossanitários.
O problema é agravado no pequeno agronegócio dendê na Bahia, constituído pelos chamados “roldões” que representam a grande maioria das unidades processadoras do óleo, localizadas na região conhecida como Baixo Sul, vem sofrendo sério revés econômico pela diminuição da matéria-prima, ou seja, cachos de dendezeiro. Esses “roldões” são responsáveis pela geração de cerca de 3 mil empregos diretos e de parcela considerável da renda regional.
O cientista ressalta que no campo a cultivar HIE OxG vem obtendo bons resultados, e no comércio o azeite Unauê inova pois tem menor quantidade de ácidos graxos livres do que o óleo do dendezeiro, por isso é um azeite com menor acidez e melhor qualidade. É também mais insaturado e com maior teor de vitamina “E” e carotenos que o óleo do dendezeiro.
Estudos também demonstraram que o azeite Unauê tem potencial para o preparo de alimentos funcionais, rico em polifenóis, com propriedades antioxidantes e impacto favorável sobre os lipídios plasmáticos humanos relacionados com os fatores de risco cardiovascular. Devido a essas características, o uso do azeite Unauê, principalmente no caso de produtos da culinária tradicional que utilizam o óleo de dendezeiro não refinado, proporcionará produtos de melhor qualidade, sabor, propriedades nutracêuticas e/ou
funcionais.
Em tom de brincadeira, José Inácio diz que as baianas de acarajé “odeiam” o HIE (ou Unaue) por ter pouca estearina (mais oleina). Devido a isso, só permite uma fritada – o que é bom para o consumidor. Já o dendezeiro – por ter muita estearina –, permite até 5 fritadas – o que é péssimo para o consumidor. Por fim, a cor amarela da estearina (ou borra) dá o dourado. Já quando feito com o Unauê, fica escuro, pois tem muita oleina. Contudo, o acarajé quando feito com Unauê é maravilhoso.
Domingo passado (1º de junho) realizamos uma experiência gastronômica em casa com o Unauê e fomos bem sucedidos. Fizemos uma moqueca de vermelho do olho amarelo usando todos os temperos habituais, inclusive gengibre e a banana da terra. A novidade foi o dendê Unaue, que proporcionou sabores incríveis.
Garanto que vamos repetir a prato, acrescentando outros temperos como experiência e inovação.