Você já se pegou comprando algo que não precisava, mas sentiu que precisava? Mais um perfume, mais uma calça jeans parecida com as outras cinco que já tem no armário. E depois, talvez, o arrependimento: “Por que comprei isso mesmo?”. Recentemente, assisti a um vídeo da criadora de conteúdo Júlia Leivas chamado “5 coisas que influencers fizeram você acreditar que são normais (e não são)”, e fiquei particularmente impactada com a discussão sobre o vício em perfumes, um exemplo aparentemente inofensivo, mas que simboliza um problema maior e mais profundo: a indústria da autoimagem e o consumo como anestesia emocional.
O novo normal, alimentado pelas redes sociais, não é mais só consumir é acumular. Ter uma coleção de 15 perfumes virou símbolo de sofisticação e autoestima elevada. Mas será mesmo? O que há por trás disso pode ser o oposto: um ciclo silencioso de comparação, ansiedade e um senso de inadequação constante, enquanto isso o perfume deixou de ser um gesto íntimo de autocuidado para se tornar um troféu de validação externa.
E aí mora o perigo.
A psicologia do consumo explica que somos influenciados o tempo todo por modelos de comportamento e a internet amplificou isso em escala industrial. Quando seguimos alguém carismático, bonito, com “vida perfeita”, passamos a projetar neles aquilo que sentimos que nos falta, Influencers muitas vezes não têm a intenção de causar danos, mas se tornam, mesmo que inconscientemente, vetores de padrões inatingíveis. O resultado? Uma epidemia de frustração silenciosa, muitas vezes misturada com dívida no cartão de crédito, baixa autoestima e sensação de fracasso pessoal.
Isso se conecta diretamente com o culto ao fast fashion e à ideia de que precisamos constantemente renovar nosso visual para sermos aceitos, compramos roupas que não precisamos, as algumas pessoas repetem tendências sem nem pensar se aquilo tem a ver com o estilo pessoal dela e frequentemente vestem o desconforto só pra parecer atualizados. O corpo vira cabide de tendências, e a identidade vai se diluindo no algoritmo.
Mas talvez um dos efeitos mais cruéis disso tudo seja a rivalidade feminina disfarçada de empoderamento, enquanto se prega sororidade, a lógica do consumo exacerbado ainda alimenta uma competição invisível entre mulheres: quem tem mais, quem é mais magra, mais “clean girl”, mais perfumada, mais fashion, isso cria um ambiente onde a comparação não é só inevitável ela é sistematicamente incentivada. E a rivalidade entre mulheres, que deveria estar sendo superada, volta em forma de vídeo de “minha rotina de cuidados de R$ 3 mil”.
Há um termo na psicologia comportamental chamado intermitent reinforcement (reforço intermitente). Funciona mais ou menos assim: você nunca sabe exatamente o que vai te dar prazer ou validação, mas segue tentando como quem joga numa máquina caça-níquel em Las Vegas e as redes sociais funcionam com esse mesmo mecanismo. Às vezes, um vídeo seu viraliza, ás vezes, uma compra te faz se sentir linda, o sentimento de abrir uma caixa pode trazer alegria, mas depois o efeito passa e você tenta de novo e de novo…
Do ponto de vista neurocientífico, isso ativa os mesmos circuitos de dopamina relacionados ao vício, o consumo, nesse contexto, deixa de ser racional. Viramos agentes de uma economia emocional e quanto mais vazios estamos, mais compramos.
Não se trata de demonizar influencers, nem de romantizar a pobreza, o problema é o desequilíbrio, é a ausência de consciência e a substituição de afeto por aquisições, de identidade por estética, de comunidade por competição.
Talvez o caminho comece com pausas sinceras ou com a coragem de repetir roupa, de usar o mesmo perfume até o fim, de dizer “isso não é pra mim” sem culpa ou até mesmo de olhar pra uma influencer e lembrar que aquilo é uma vitrine, não um espelho.
No fim das contas, talvez o verdadeiro luxo seja ter um estilo de vida que não precise ser constantemente justificado, nem comprado em parcelas. E isso, felizmente, não depende de mais nada além de você.