Cultura

O QUE ESTAMOS COMPRANDO QUANDO SEGUIMOS INFLUENCERS? p VALERIE SOLEIL

Valerie Soleil é colunista do BahiaJá em comportamento, comunicação e moda. Estuda na UNIFACS.
Valerie Soleil , Salvador | 02/06/2025 às 15:32
Efeito acumulador
Foto: Ohra Grece
Você já se pegou comprando algo que não precisava, mas sentiu que precisava? Mais um perfume, mais uma calça jeans parecida com as outras cinco que já tem no armário. E depois, talvez, o arrependimento: “Por que comprei isso mesmo?”. Recentemente, assisti a um vídeo da criadora de conteúdo Júlia Leivas chamado “5 coisas que influencers fizeram você acreditar que são normais (e não são)”, e fiquei particularmente impactada com a discussão sobre o vício em perfumes, um exemplo aparentemente inofensivo, mas que simboliza um problema maior e mais profundo: a indústria da autoimagem e o consumo como anestesia emocional.

O novo normal, alimentado pelas redes sociais, não é mais só consumir é acumular. Ter uma coleção de 15 perfumes virou símbolo de sofisticação e autoestima elevada. Mas será mesmo? O que há por trás disso pode ser o oposto: um ciclo silencioso de comparação, ansiedade e um senso de inadequação constante, enquanto isso o perfume deixou de ser um gesto íntimo de autocuidado para se tornar um troféu de validação externa.

E aí mora o perigo.

A psicologia do consumo explica que somos influenciados o tempo todo por modelos de comportamento e a internet amplificou isso em escala industrial. Quando seguimos alguém carismático, bonito, com “vida perfeita”, passamos a projetar neles aquilo que sentimos que nos falta, Influencers muitas vezes não têm a intenção de causar danos, mas se tornam, mesmo que inconscientemente, vetores de padrões inatingíveis. O resultado? Uma epidemia de frustração silenciosa, muitas vezes misturada com dívida no cartão de crédito, baixa autoestima e sensação de fracasso pessoal.

Isso se conecta diretamente com o culto ao fast fashion e à ideia de que precisamos constantemente renovar nosso visual para sermos aceitos, compramos roupas que não precisamos, as algumas pessoas repetem tendências sem nem pensar se aquilo tem a ver com o estilo pessoal dela e frequentemente vestem o desconforto só pra parecer atualizados. O corpo vira cabide de tendências, e a identidade vai se diluindo no algoritmo.

Mas talvez um dos efeitos mais cruéis disso tudo seja a rivalidade feminina disfarçada de empoderamento, enquanto se prega sororidade, a lógica do consumo exacerbado ainda alimenta uma competição invisível entre mulheres: quem tem mais, quem é mais magra, mais “clean girl”, mais perfumada, mais fashion, isso cria um ambiente onde a comparação não é só inevitável ela é sistematicamente incentivada. E a rivalidade entre mulheres, que deveria estar sendo superada, volta em forma de vídeo de “minha rotina de cuidados de R$ 3 mil”.

Há um termo na psicologia comportamental chamado intermitent reinforcement (reforço intermitente). Funciona mais ou menos assim: você nunca sabe exatamente o que vai te dar prazer ou validação, mas segue tentando como quem joga numa máquina caça-níquel em Las Vegas e as redes sociais funcionam com esse mesmo mecanismo. Às vezes, um vídeo seu viraliza, ás vezes, uma compra te faz se sentir linda, o sentimento de abrir uma caixa pode trazer alegria, mas depois o efeito passa e você tenta de novo e de novo…

Do ponto de vista neurocientífico, isso ativa os mesmos circuitos de dopamina relacionados ao vício, o consumo, nesse contexto, deixa de ser racional. Viramos agentes de uma economia emocional e quanto mais vazios estamos, mais compramos.

Não se trata de demonizar influencers, nem de romantizar a pobreza, o problema é o desequilíbrio, é a ausência de consciência e a substituição de afeto por aquisições, de identidade por estética, de comunidade por competição.

Talvez o caminho comece com pausas sinceras ou com a coragem de repetir roupa, de usar o mesmo perfume até o fim, de dizer “isso não é pra mim” sem culpa ou até mesmo de olhar pra uma influencer e lembrar que aquilo é uma vitrine, não um espelho.

No fim das contas, talvez o verdadeiro luxo seja ter um estilo de vida que não precise ser constantemente justificado, nem comprado em parcelas. E isso, felizmente, não depende de mais nada além de você.