Pioneiros da localidade quando o território ainda era Kirimurê habitado ´pelo tupinambás que chegam ao Brasil pelo Estreiro de Bering
Tasso Franco , Salvador |
25/03/2025 às 17:23
Representação de Henrique Passos
Foto: REP
A cidade do Salvador vai completar 476 anos no sábado próximo. Trata-se de uma data simbólica escolhida pelo IGHB, em 1949, quando a localidade completou seu 4º centenário no governo municipal de José Wanderley de Araújo Pinho e no governo estadual Octávio Mangabeira.
Nesse período Mangabeira/Wanderley (1947/1951) Salvador vai experimentar um novo impulso urbanístico cujo ponta pé inicial se deu com JJ Seabra e Moniz Aragão (1912/1924) e a abertura da Avenida Sete com mudança da cara colonial da cidade para mais moderna e a implantação de vários prédios do eclético italiano.
Esse movimento urbanístico praticamente ficou estagnado entre o governo Francisco Góis Calmon (1924/1928) e os vários interventores da era getulista (1930/1945).
Foi nesse momento, em 1949, a cidade ainda sem data certa para comemorar seu aniversário quando os historiadores debatiam se 29 de março de 1549, a chegada da armada de Thomé de Souza; se 13 de maio deste mesmo ano data da procissão de Corpus Christi; se 1º de novembro 1549 data comemorativa de descoberta da Baía de Todos os Santos e quando a cidade estava melhor formatada; ou se seria mantida a data de fundação da Vila Velha, 1538, como aconteceram com Recife e Olinda.
A cidade estava ganhando novas construções importantes como o estádio da Fonte Nova, que começara no governo Landulfo Alves, o Hotel da Bahia, o Viaduto da Sé, a Avenida Centenário (o maior marco dos 400 anos) e os historiadores decidiram no Congresso de História que seria 29 de março de 1549 e assim ficou.
A polêmica acabou, mas, a realidade dos fatos não. Primeiro que sequer existia a cidade e o governador Geral do Brasil, cargo hoje equivalente a presidente da República, ainda permanecia na nau capitânea Nossa Senhora da Conceição e só foi a terra, andar pelo caminho do Concelho (ainda se escrevia assim) e ir até a fortaleza de Pereira Coutinho, dia 31 de março. E a cidade só começou a ser construída no final de abril.
Primeiro teve que fazer a escolha do local e Thomé sendo um experiente militar não iria erguer a fortaleza na beira da praia como fizera Coutinho com a Vila Velha. Depois, tinha um mestre de obras arquiteto Luís Dias e uma planta já desenhada e precisava de um local que se adequasse a planta e tivesse uma boa linha de tiro para o mar. Afinal, todas as conquistas nas Américas, na Ásia, na África e na Índia se deram pelo mar e estavam Holanda, Espanha e França, ao menos, de olho na conquista do Brasil.
Thomé e seus homens, então, bateram botas (no sentido de caminha pela mata). Diz-se que, nessa tarefa, Diogo Alvares (que ainda não se chamava Caramuru, a lenda é posterior) teria orientado a comitiva portuguesa, pois, já morava na Barra desde 1510, conhecia as trilhas, pescava na gamboa (atual área do Iatch Club), já tinha erguido a capela de Nossa Senhora da Vitória e deu as coordenadas para que tomassem esse caminho via Graça (na atual Ladeira da Barra havia uma pedreira que só foi demolida em 1915 com a abertura da Av Sete), Corredor da Vitório, o Outeiro Grande (hoje, Campo Grande).
E teria sido essa trilha indicada por Diogo que Thomé seguiu, porém, Luís Dias achou que a área do Outeiro era muito grande e andou adiante até escolher o platô onde a fortaleza foi erguida, atual Praça Thomé de Souza onde se situa o Elevador Lacerda, a sede da Prefeitura, o ex-Palácio Rio Branco e a sede da Câmara.
Acertou em cheio. O lugar era o mais alto da Baía, boa vista para instalar os canhões na paliçada e um quadrilátero que permitia instalar as portas Norte e Sul dentro do que traduzia a planta. Do lado leste era o mar; do lado oeste um charco. Ademais, quando Thomé de Souza conheceu as aldeias dos tupinambás nas passagens pela Piedade, Gamboa (caminho de baixo) e São Bento verificou que os indígenas eram paupérrimos e nem artefatos de ferro possuíam. Portanto, não levavam perigo.
Quanto a essa participação de Diogo Álvares (Caramuru) na fundação da cidade eu não conheço registros abalizados. Há informes, apenas. Nas correspondências de Thomé a Corte não há citações; Luis Dias quando deu por acabada a cidade escreveu pedindo para voltar para Portugal e também não fala em Diogo. E os jesuítas que fizeram várias correspondências aos seus superiores não o citam.
Acontece que, nessa época (1549) Diogo Álvares já tinha sido considerado como uma figura importante pela Corte e quando da indicação e nomeação de Francisco Pereira Coutinho para ser o Donatário da Capitania da Bahia, paralelamente a isso, Dom João III concedeu sesmarias (instituto criado pelo rei Dom Fernando no século XV) a benfeitores e as terras de Diogo a essa altura já amigado com Catarina Paraguaçu iam do Rio dos Seixos (Av Centenário), Graça e Barra; e do outro lado da Centenário até o Rio Vermelho concedeu o rei a seu genro Paulo Adorno que era casado com sua filha Felipa Dias. E Thomé de Souza não mexeu nisso, até porque a cidade que fundou estava fora desse perímetro.
Os registros históricos apontam que Diogo Alvares morreu em 5 de outubro de 1557 no governo de Duarte da Costa; e a sesmaria continuou com Catarina a qual faleceu em 25 de janeiro de 1583, mais de 20 anos depois, já na época das Ordenações Filipinas (a Espanha conquistou Portugal em 1580 e dominou-a até 1640) e a Bahia foi no bolo, os governadores passaram a ser espanhóis nomeados pelos reis Felipes; ela na semana de falecer doou a sesmaria aos beneditinos, Ordem Religiosa que chegou em Salvador, em 1580, paupérrima, e se tornou rica, de imediato (ao menos de patrimônio e até hoje paga-se laudêmios na Barra e Graça aos beneditinos).
Não vou entrar no mérito dessa doação porque se fala muita coisa inclusive que foi a garantia dada pelo monge para ela entrar no reino de Deus, porém, nunca estudei o assunto a fundo, já pedi ao abade para verificar essa documentação e até hoje não consegui. Inclusive a Biblioteca do Mosteiro de São Bento está fechada desde 2019 e é uma das mais importantes da Bahia, em história.
Na Invasão Holandesa de 1625, em Salvador, o Mosteiro de São Bento se transformou no QG dos batavos e os monges alguns foram mortos e outros fugiram para Cachoeira e voltaram quando os holandeses foram expulsos em 1626.
O foco dessa matéria é Diogo e Catarina dois personagens importantíssimos da cidade do Salvador que completa 476 e nunca foram prestigiados, não têm memorial, não têm quase nada. A fonte onde Catarina se banhava na Graça está abandonada. A igreja mosteirinho de NS da Graça onde ela está sepultada passou por uma reforma (IPHAN), recentemente, e está bem conservada. Mas, por lá só tem um túmulo e um quadro a óleo do seu sonho.
Diogo foi sepultado na Sé Primacial que foi derrubada na década de 1930. Só existem os alicerces à mostra na praça da Sé e o monumento da Cruz Caída de Mario Cravo Jr instalado no governo de Imbassahy que simboliza a queda do templo.
O presidente da CMS, Carlos Muniz, que transformar a sede do Paço num museu. Já sugerimos que se isso acontecer que por lá seja instalado o Memorial a Thomé de Souza (outro esquecido) e uma ala dedicada a Diogo Alvares e Catarina Paraguaçu - no original francês batizada por Catherine du Brézil. (TF)