Cultura

PARA QUE SERVEM OS LIVROS, POR ISAAC NEWTON CARNEIRO

Isaac Newton Carneiro, professor e doutor em Planejamento Urbano
Isaac Newton Carneiro ,  Salvador | 15/08/2024 às 11:18
Isaac Newton Carneiro, professor e doutor em Planejamento Urbano
Foto: DIV


Em tempos de tantas palavras e pouco conhecimento, merece a pergunta. No mundo superfaturado de notícias e informações, vemos, com cada vez mais frequência, a ausência de conhecimento profundo sobre os fatos. Parece que Sócrates nunca esteve tão perto de nós a propor a ironia diante daqueles que se presumiam conhecedores de tudo. 

Diz-se que um homem, na virada do século XVIII para o XIX, que tivesse lido 20 livros era culto e poderia enfrentar uma série de debates em diversos campos do conhecimento. No final dos anos 1970, os jornais – tempos maravilhosos – costumavam preencher 10, 12 grandes cadernos com as notícias de domingo, falando sobre tudo que havia de interessante na semana. Eram tratados assuntos de política, economia, países, cidades, saúde, gêneros, educação, turismo, arte, sociologia; além é claro, sobre o lançamento de livros que encantavam as pessoas.

Vamos um pouco mais fundo nesta frequência dos tempos. Meu querido Augusto, dona das livrarias no aeroporto do Salvador, me dizia há alguns dias atrás que chegava, para venda, uma caminhonete cheia de jornais aos domingos (hoje se vende pouco mais que uma dezena de jornais no mesmo dia). E, ainda mais interessante. O mesmo livreiro fala que eram centenas de livros vendidos por dia e podíamos ver isto ao entrarmos no avião. Na maioria das poltronas os passageiros se postavam passando páginas e mais páginas na oportunidade de ocupar um voo. Hoje, na maioria dos casos, vemos zumbis jogando, lendo mensagens curtas, briefings (os, no nosso português claro, um resumo).

Não percebemos, mas a ultra revolução que nos levou do livro as telas de aparelhos celulares deixou no meio do caminho a profundidade sobre os assuntos. Hoje deixou de ser importante o porquê das coisas. A existência da confiança numa “verdade” substitui completamente a necessidade de conhecer o assunto. Eu creio nisto e naquilo e por estas situações são verdadeiras. Detalhe, queridos amigos, uma frase verdadeira no WhatsApp precisa de menos palavras para se transformar na verdade.

Somando-se isto ao fato da grande popularidade de mestres que não conhecem com profundidade os assuntos debatidos, faz com que estejamos fora das escolas e dentro de um campo de futebol, quando encontramos num grupo destes o debate sobre política, educação, saúde, economia. Os temas importantes não tem mais razão de ser e passam a ser fundo de debate passional.

E vejam, basta perguntar a um contendor quantos livros leu sobre o assunto, ou sobre qualquer assunto e você corre o sério risco de ler um palavrão em resposta. Porque não interessa o fundamento. 

Ao lermos bons livros, de mais diversos temas, nos libertamos do nosso próprio preconceito, afinal somos obrigados a conhecer o mundo proposto pelo autor. Essa construção dialética, onde o mundo de quem escreve vai ser construído em nossa mente, com nosso conhecimento, proporá uma realidade complexa, cheia de detalhes.

Ler exige esforço, inteligência, reflexão e uma série de sentidos colocados a exposição, provocando de cada um de nós uma introversão sobre nossas verdades. Se em cada grupo de WhatsApp fosse exigido a leitura de um simples artigo de duas páginas, com certeza, teríamos uma vivência muito mais interessante. Ler livros nos coloca em posição de vantagem, até na humildade de reconhecer que não sabemos. E, aqui entre nós, ter humildade é um grande caminho nos tempos de hoje.