Cultura

A ALMA DA SENHORA AVENIDA SETE, CAP 3: NO FAROL DA BARRA O FIM DA VIA

Neste ponto final da Avenida Sete é o trecho mais largo da via com 36.5 metros de cumprimento de ponta a ponta em direção ao mar
Tasso Franco , Salvador | 16/05/2024 às 07:52
Placa onde termina a Avenida Sete no Farol da Barra
Foto: BJÁ


    Tudo que tem começo, tem meio e fim. Está em Gênenis: "Aos teus descendentes darei esta terra". A vida humana é assim, a vida animal segue a mesma regra, as plantas e os objetos, também. Nada escapa dessa trajetória e já vi amigos e parentes que se foram, animais de estimação que partiram e casarões que desapareceram. E novos descendentes surgiram em seus lugares.

   Sobre a Senhora Avenida Sete, idosa nos seus 107 anos de existência, mostrei no capitulo 2 deste livro a decadência da Ladeira de São Bento - onde se inicia - e que já foi um local glamuroso, vivo, efervescente. Mostraremos, hoje, onde ela se finda, na esquina da Rua Afonso Celso, Farol da Barra, distante do São Bento 4.7 km, e o que mudou nesta paisagem.

    A Sete do Farol é local à beira mar com características completamente diversas do seu nascedouro, cuja população usa essa área para residências, trecho em que há um hospital, uma vila gastronômica e um hotel 4 estrelas fechado. Também tem vendedores ambulantes (fixos e móveis) que comercializam produtos diferenciados da Ladeira do São Bento: mercadores de coco verde, água mineral, cerveja, chapéus, colares, óculos escuros e bijuterias produzidas por "hippies".

    Portanto, diria, que há uma semelhança em relação ao São Bento somente no que diz respeito a decadência, uma vez que nesse trecho do Farol da Barra já funcionou um hospital de grande porte - o Espanhol, o Marazul Hotel - 4 estrelas do empresário Pedro Irujo, um bistrô famoso (Le Privet), o renascente Berro d´Água e todos desapareceram.

    Vale observar, ainda, o seguinte: o fim da avenida, a placa indicativa do logradouro estabelecido pela Prefeitura se situa no Condomínio Quinta da Barra com dois prédios de 13 andaras - cada um deles - os edifícios Farol e Mar Grande - bem conservados - número 4356. O Clube Naval Cabana da Barra fica no outro lado, na Afonso Celso 1; e o Edifício Oceania, na Marques de Leão.

    E, no outro lado final da Avenida Sete seguindo-se uma linha reta a partir da placa no Condomínio Quinta da Barra - topa-se com a mureta construída na implantação da avenida, em 1915, onde existe uma prainha que só é utilizada com maré baixa. Esta área, já situada na Baía de Todos os Santos. O farol de Santo Antônio (Farol da Barra) fica distante daí 120 metros e se situa fora da Sete no Largo do Farol da Barra. O farol é quem demarca a entrada da Baía de Todos os Santos uma boca enorme que se fecha do outro lado, na Ponta do Garcez, Cacha Pregos, ilha de Itaparica.

    A área da Avenida Sete, portanto, fica localizada no entorno da Baía de Todos os Santos e contando-se daí até a esquina da Barão de Itapoan (onde há o estacionamento do Marazul) são aproximadamente 500 metros com cinco escadas que dão acesso ao mar e as prainhas. A contar: uma em frente ao Salvador Surf (bar), a segunda e terceira em frente ao prédio Barra Ville; a quarta em frente ao Restaurante Pereira; e a quinta, em frente loja Doce Gelato. Até o Porto da Barra são praias com muitas pedras e só utilizadas com maré baixa. As duas prainhas – a em frente ao Pereira e a ao lado do Forte Santa Maria são as melhores - mas, perigosas com maré alta.

    Esse trecho da Sete já teve trânsito em mão dupla. Desde a implantação do Projeto Calçadão da Barra, governo prefeito ACM Neto, 2015, existem duas pistas para veículos a partir da Barão de Itapoan, um ponto de ônibus coletivo ao lado a Estação de Tratamento de Esgoto da Embasa, e a velocidade permitida é máxima em 30 km, com saída dos veículos pela Afonso Celso.

   Na "boca" da Afonso, onde termina a Sete, a largura da rua é de 36.5 metros com calçadão de 8 metros em frente ao Condomínio Quinta da Barra e no outro lado 3.5m na balaustrada. A partir do prédio que a Santa Helena constrói onde foi a Pousada Noha Noha a largura total é de 19 metros, sendo 8 m de pistas para veículos, grelhas para escoar águas das chuvas e 5 metros de calçadões de cada lado. A partir do Hospital 2 de Julho, a pista de rolamento para veículos é a mesma - 7 metros - e a calçada deste lado aumenta para 6 metros.

    Tomando a direção a partir da saída da Rua Barão de Itapoan (rua do Bompreço Supermercados) há o estacionamento do Marazul Hotel e logo depois o prédio com 10 andares do hotel que está fechado desde a pandemia do Coronavirus e era do empresário Pedro Irujo, o qual, morreu em 2017. Conheci bem este hotel e o restaurante pois trabalhei 5 anos com Pedro Irujo e participei como assessor de imprensa das campanhas de seu filho Luís Pedro a governador (1990) e as dele a deputado e prefeito de Salvador (1992) e fizemos muitos encontros do marketing neste hotel, local maravilhoso com belíssima vista para o mar. Com a morte de Pedro seus dois filhos não deram continuidade ao hotel e está fechado.

    Logo depois vem a Vila da Barra (gourmet) onde se situa o Pereira um dos melhores restaurantes da Sete onde já participei de vários eventos, jantares, o “Leitão no Bafo” dos chefs Pimenta e Paula Giovanini, o lançamento do site “Muita Informação”, de Osvaldo Lyra, só lembrando os eventos mais recentes. Tem uma pérgola ótima para um drink com vista para o mar e que foi recentemente coberta. Ao lado está o Olé (drinks e foods), restaurante recente, que ficou no lugar do Berro d'Água uma tentativa frustrada de soerguer esse bar que marcou época na Barra, na esquina da Barão de Sergy com a César Zama. Nesta vila há, ainda, a Pizza com z invertido), a Tanqueray, a Bravox (burger & beer) e a Agência Gamboa de publicidade.

    Adiante está o Hospital 2 de Julho que ocupa áreas do antigo Hospital Espanhol. Fui cliente desse hospital durante anos com Dr Sinval (já falecido) e, em 1995, meu pai (Bráulio Franco) morreu nele após uma cirurgia de diverticulite. Foi uma experiência traumática para mim. Fiquei algumas noites na varanda contemplando o mar na esperança de que "meu velho" vivesse mais alguns anos. Vi quando levaram seu corpo por um corredor, já morto.

    Adiante está o Barra Ville que conheço razoável. No início dos anos 1980, o jornalista José Cerqueira Filho morava neste prédio e trabalhávamos juntos na Telebahia, no Cabula, e fazíamos transporte solidário. Numa semana, ia com meu veículo e pegava ele no Barra Ville (ida e volta) e na outra era a vez dele me colher no Chame-Chame. Frequentávamos os bares do entorno, a baiana do acarajé (Cerqueira adorava) e a praia do Porto da Barra. É um prédio bom bem conservado e no térreo tem única loja - Bússola Turismo. Ao lado há um prédio pequeno com a placa vende-se B&A Imóveis 3264.8700.

    Logo depois situa-se a casa que pertenceu ao professor Frederico Edelweiss (1892/1992), número 4255, que é Hotel de Trânsito da Marinha, morada fantástica com piscina e área verde com espécimes da Mata Atlântica. Há uma placa no local onde se lê: “Frederico Edelweiss, professor de língua tupi na Bahia viveu nesta casa”. Só lembrando para quem não sabe Edelweiss foi quem insistiu para que a data de fundação de Salvador fosse 29 de março, data da chegada das naus de Thomé de Souza - data simbólica uma vez que ainda não existia cidade - para acabar com a polêmica se a data seria 13 de Junho (quando aconteceu a procissão de Corpus Christi) ou 1º de novembro, quando a cidade estava semiestruturada. Valeu seu ponto e vista no congresso de História da Bahia, em 1949 (400 anos da chegada de Thomé) e a data ficou 29 de março.

    Pela ordem, seguem o casarão onde sedia o Salvador Surf (bar e restaurante) que frequento e chamo "bar dos argentinos" e onde uma batata frita ao surf deliciosa, além do que, sentado no calçadão deste bar tem-se uma vista fabulosa do Farol da Barra; o edifício Morgade, 3 andares, número 4269; o Edifício Dowu (dizeres estão apagados e só tem o D na fachada) número 4277; uma casa amarela (4285), uma casa branca (4293), uma obra da Santa Helena (onde existiu a pousada dos franceses, a Nôa-Nôa), o Ed Nápoli (de muitas histórias), no térreo funciona a "Voa Mais " - casa de câmbio; e o Condomínio Quinta da Barra (4347 onde termina avenida), no calçadão deste condomínio há umbar, restaurante e pizzaria “Pioco da Barra” (neste local já existiu uma farmácia de manipulação).

    Em conversa com o comendador Barbosa ela lembrou que na Copa do Mundo de 1974 no Privê do Napoli uma galera assistia ao jogo do Brasil contra a Holanda e quando os gringos venceram o time de Zagalo (2x0) quebraram o bistrô quase todo e Sêo Mighnon instalou novo privê na Barão de Sergy e o Thiffanys (este último, posteriormente, foi instalado nop Comércio ao lado do Plano Gonçalves. Em 2013, uma quadrilha de estelionatários liderada por um cadeirante foi prese neste edifício.

    Neste trecho da Sete há ambulantes somente no calçadão rente a balaustrada. O mais antigo é Carlos vendedor de água mineral que faz ponto no final da Sete há 8 anos. Vida dura, extremamente difícil, ele trabalha em pé com sua caixa de isopor; depois há um vendedor de chapéus (já comprei um modelo vietnamita na mão dele) - mas é sazonal; e adiante há um vendedor de coco (Carretão, ex-motorista do Hotel Sauípe e um pedinte, o Alfeu, que fica numa cadeira de rodas e sofre de diabetes. Ultimamente está sumido, provavelmente, hospitalizado. Mais adiante há um outro vendedor de água de coco, juma senhora quem vende água, os "hippies" que produzem bijuterias e ficam encostados na grade do prédio da Embasa; mais adiante outro vendedor de chapéus (em frente ao Pereira) e uma baiana do acarajé, dona Sônia Maria dos Santos, a última desse trecho - com tenda em frente a Barão de Itapoan. No outro lado, exatamente nesta esquina fica a senhora Márcia que vende hot dog num carro estilizado na cor rosa (Point Pink), e em frente ao Hospital 2 de Julho, a única banca de jornais e revistas, a Coelho, diversificada com vendas de água, doces, bolas, cigarros e guloseimas.

   Uma pitada de prosa: Sou cliente da baiana do acarajé Sônia Maria, 83 anos de idade, natural de São Sebastião do Passé e proso muito com ela sentado numa cadeira de plástico que ela coloca na tenda para seus clientes. Já foi auxiliar de enfermagem num hospital em Santo Amaro, manicure e doceira. Se vira nos trinta para sobreviver e já teve alguns namorados e maridos, mas não tem filhos. Devido minha barba me chama de “Papai Noel” e também de Lula. Ultimamente anda sumida e já procurei saber dela e não consigo informações.

   Como estamos em maio, temporada de chuvas em Salvador, Márcia está esperando melhorar o tempo para retorna ao ponto com seu “Point Pink”. E sobre a Banca Coelho (é bem antiga e o dono do ponto original já faleceu) já comprei jornais do Sul neste local. Depois o fim do Hospital Espanhol a banca decaiu abatida também pelam internet. Hoje, só vende os jornais de Salvador (os diários, assim mesmo poucos) e não há mais revistas. Para sobreviver, o atual permissionário vende salgados, doces e cigarros.

    Essa área da Av Sete tem dois momentos distintos em relação aos camelôs (ambulantes): na baixa estação do turismo (entre março e julho) e na alta estação (entre agosto e fevereiro, com pico maior dezembro, janeiro e fevereiro). Na alta, o número de camelôs triplica, pois, no final da Sete na área mais larga é ponto onde param os ônibus interestaduais e com estrangeiros para visita o Farol da Barra e o Museu Náutico, um dos pontos turísticos mais apreciados da capital baiana, e assim surgem os vendedores de colares, fitinhas, óculos, chapéus, protetores solares, etc, e também nos finais de semana que muitas pessoas vão as praias e fazem cooper. 

    Também durante o período do Carnaval - no Largo do Farol se inicia o circuito Barra a Ondina - e são dez dias de folia (fora os shows e manifestações culturais e sindicais que têm neste largo no decorrer do ano) os trios elétricos estacionam ao longo da Avenida Sete até o Porto da Barra. São veículos imensos (Volvo) que após o desfile no circuito carnavalesco (entre 18h e 4 da manhã) retornam de Ondina no amanhecer do dia para estacionarem neste local e aguardarem a partida do desfile do dia seguinte. A manobra desses trios é feita no final da Sete e haja habilidade dos motoristas que seguem de ré até estacionarem na fila. Daí que, durante o Carnaval, há eventuais atrasos de trios e outros.

    Portanto, nessa época do Carnaval os moradores da Sete dizem que é o período do "inferno" e aqueles que têm casas de veraneio se mudam. Alguns apartamentos nesse trecho também são alugados para foliões que veem de outros estados.

    A Associação de Moradores da Barra já pediu n vezes para mudar o Momo e outros eventos, mas não consegue. Há, a promessa de que o Carnaval se mudará para a Boca do Rio. 

    Ando muito neste trecho da Sete e observo com frequência as mudanças que ocorreram ao longo dos anos e nos dias atuais. O bairro da Barra, a cada dia se verticaliza mais. Subiram nos anos 2023/2024, 25 novos prédios e neste trecho caiu a Pousada Noha Noha para dar lugar a um prédio. O calçadão implantado em 2015 melhorou bastante o aspecto do lugar, embora a Associação dos Moradores da Bahia siga protestando sobre a quantidade de eventos no Largo do Farol.

    Cento e nove anos depois de inaugurada a avenida pelo governador JJ Seabra, a Sete se movimenta para o alto e veremos isso adiante quando chegarmos na Ladeira da Barra e no Corredor da Vitória. O céu é o limite.