Cultura

O ANDARILHO DA CIDADE DA BAHIA,CAP 25: SALVADOR ENCALHADA NA VIOLÊNCIA

Salvador, hoje, tem a marca nacional da capital mais violenta do país
Tasso Franco , Salvador | 15/10/2023 às 09:26
Residência no Chame-Chame, bairro classe média de Salvador
Foto: BJÁ
     Salvador está como um navio imenso e belo que encalhou na violência à beira da Baía de Todos os Santos esperando o socorro de alguém, um deus do olimpo, uma vez que os homens não se mostram interessados em mudar a realidade já por nos comentada de termos perdido a condição de cidade civilizada e ser a urbe de um turno pois às noites a população tem medo de sair de casa e às ruas ficam entregues aos ladrões e a Policia

   O que aconteceu com ti oh! Cidade da Bahia? Estuprada, maltratada que proíbe os cidadãos de circularem livremente pelos bairros e pelas ruas, mesmo os do centro histórico, temerosos de uma bala perdida, de um assalto a mão armada com alguém apontando um pau de fogo para suas narinas? Onde os turistas, para visitarem o centro histórico, só as ruas principais e praças, não os becos e vielas, só o fazem com a proteção da Polícia?

   É triste, é doloroso e ninguém enxerga uma luz no final do túnel observando o que virá, o futuro para os nossos filhos e netos, mais adiante, tão incertos estão de viver nesta cidade com segurança, como devaneio e sonho de ideal, que o melhor é nem pensar e deixar acontecer uma vez que força não tem mais de lutar e há uma acomodação geral

  Tenho visto e ouvido ao longo de minha extensa trajetória como jornalista nas palavras desenvolvimento, empoderamento, nova Bahia, impulso, progresso, e diria que até conseguimos muita coisa, mas esbarramos a atolamos na incivilidade, no grotesco, no chulo, e estamos literalmente encalhados, a cidade e sua população, ricos e pobres, vivendo cada grupo em seu gueto, segregados num apartheid que avança a passos largos

   Se só quem resolveria esse impasse, destravar esse encalhe, é uma ação presente forte e dinâmica e esquecer o futuro, porque ele é incerto, pode até piorar se a sociedade não se mobilizar, abrir os olhos, deixar o supérfluo de lado, parar de ficar discutindo temas que até podem ser relevantes como o aborto, a família trans, gênero e coisas tais e não cuidarmos da base, da educação, de um programa vigoroso de tolerância zero, da geração de empregos, para sairemos do atoleiro

  Frantz Fanon em “Pele Negro, Máscaras Brancas” conceitua: “Todo problema humano exige ser considerado a partir do tempo. O ideal seria que o presente sempre servisse para construir o futuro. E esse futuro não é o cosmo, mas sim o do meu século, do meu país, da minha existência. De modo algum devo me propor preparar o mundo que me sucederá. Pertenço irredutivelmente a minha época”

   Isso foi escrito em 1952 texto que integra um dos livros mais influentes dos movimentos de luta antirracistas do colonialismo francês a partir da Martinica, Antilhas, e autor via seu saber com lentes mais amplas ao alcance ou rumo a um novo humanismo mundial e como estamos falando de Salvador cuja população mestiça e negra é majoritária, indevidamente culpada pela violência e também citada por sofrer um genocídio na periferia da cidade onde a Policia chega atirando sem investigar e matando os ppps – pretos, pobres da periferia - tem amplo sentido que citemos Fanon

   Primeiro, creio, é preciso extirpar o bode expiatório da colonização portuguesa em Salvador e na Bahia, em boa parte acusada de ser culpada da imensa massa da pobreza, de um apontado racismo estrutural pecaminoso que não permitiu a ascensão de grande parte da população e esse fator seria o fulcro a ser analisado na raiz da explosão da violência, mas lembremos que a República já tem 123 anos de existência, tempo suficiente para a estruturação de um projeto de cidadania e humanismo, e o jugo português foi esmagado há 2 séculos

   A igreja católica destruiu as bases da cultura tupinambá desde quando a cidade da Bahia começou a ser edificada, no século XVI e já nos livramos desse ressentimento há séculos, deixamos de ser prisioneiros dessa história e louva-se nos templos da cidade um papa jesuíta e igualmente devemos nos libertar da herança portuguesa, Portugal fez o que tinha de fazer dentro do tempo espaço, e agora somos nós que temos que erguer o novo mundo, o que ainda não aconteceu

   Onde, então, erramos? A Coreia saiu de uma guerra em 1950 e venceu pela educação; o Japão arrasado na II Guerra Mundial venceu pela educação; a Finlândia, educação em tempo integral e é esse é o caminho, óbvio, exemplar, mas insistimos em desprezá-lo

   Agora vai! Eventualmente escrevo isso, até com frequência, para citar alguns disparates das autoridades com projetos cabalísticos e que não levam a lugar algum, mas são vistosos, são enganosos com outdoors que espalham pelas encostas e pelos matos tecendo loas, edificações de viadutos e pontes, trens voadores e outras invenciones sem cuidarmos da educação e da cultura da paz e o crime, o tráfico organizando avançando  e matando, cobrando pedágios e limitando o direito de ir e vir dos cidadãos

   Leio que a Arquidiocese de São Salvador da Bahia está liderando uma iniciativa especial dedicada a promover o respeito e a paz na sociedade, a “Semana pelo Respeito e pela Paz” e o esforço surge em resposta à crescente onda de violência urbana que afeta a capital e o estado da Bahia, incentivando a reflexão sobre a importância do respeito mútuo e da paz em uma sociedade cada vez mais adoecida pela violência e pela intolerância

   Nesse contexto, o andarilho observa uma luzinha no final do túnel com pautas da rede católica elaboradas para abordar temas que reflitam as causas estruturais da violência nos diversos âmbitos atuais, avaliando a conjuntura da violência no estado, formas de cooperação social para construção de uma cultura de paz

   O cultivo de uma comunicação não violenta e o respeito ao próximo evidente que não se encerra apenas nessa direção, de afirmativas radiofônicas de cientistas sociais, atores políticos e sociais, operadores do direito, religiosos, psicólogos e comunicadores, pois, requer ação política de base. 

   Sem ela, eminente cardeal, será mais uma a ação fugaz, passageira, transitória e estamos vivendo nesse circulo que parece não ter fim a ponto de, hoje, estarmos literalmente encalhados, ilhados, como símbolo e marca nacional de capital da violência