Cultura

495 ANOS DO BATISMO DE CATARINA PARAGUAÇU: OS MISTÉRIOS COM DIOGO (TF)

Catarina se casou antes ou depois da viagem a França? Há ainda muitas dúvidas, a maior delas, a origem de Diogo Alvares
Tasso Franco , Salvador | 31/07/2023 às 11:11
Quadro pintado por Henrique Passos (coleção de TF)
Foto: BJÁ
     O maior mistério da história da Bahia é saber a origem de Diogo Álvares, o Caramuru, personalidade lendária e que chegou a Baía de Todos os Santos entre 1509/11 e aqui permaneceu até sua morte, em 1557, gerando as familias mais importantes da Bahia e parte da região Nordeste e que dominaram esses territórios por mais de 300 anos.

  Talvez sejá irrelevante esse conhecimento de sua origem, se português do Norte de Portugal ou de Lisboa, fidalgo da Corte não era porque se assim fosse haveria registros de sua família. O mais coerente é assegurar que se tratava de um marinheiro ou aprendiz na arte de navegar deixado nas terras da Bahia, na localidade do que seria a futura Salvador, a partir de 1549, para intermediar negócios de madeira com os nativos.

  Há indicativos bem seguros dessa possível realidade ainda que, os documentos e as citações que existem sobre Diogo, sejam poucos, alguns oficiais e mais precisos como a sesmaria doada pelo rei dom João III e outros contando em diários de bordos navegadores que estiveram na Baía de Todos os Santos.

  A primeira citação data de 1º de julho de 1526 quando visita a baía a nau São Gabriel, comandada por dom Rodrigo de Acunã, espanhol. O historiador baiano Inácio Accioli - autor de Memórias Históricas e Políticas da Bahia - juntamente com Braz do Amaral - transcreve trecho do diário e cita a presença de Diogo, o qual, "teria dito está na terra havia uns 15 anos já".

  A segunda referência data de 13 de março de 1531 quando aporta na baía Martin Afonso de Souza. O irmão deste comandante Pero de Souza escreveu em seu diário que "nesta baía achamos um homem português, que havia 22 anos que estava nesta terra; e deu razão larga do que nela havira".

  Observem que há duas datas diferentes: no primeiro caso, de 1526, subtraindo-se os 15 anos citados, chega-se a data de 1511; e na segunda data, 1531, subtraindo-se os 22 anos citados, obtem-se a data de 1509.

  Daí a dúvida se Diogo chegou na Baía de Todos os Santos e estabeleceu-se em terra, em 1509 ou 1511. Vale observar que, nessa época, já existia a escrita, mas, ele vivia entre os tupinambás provavelmente na aldeia do Rio Vermelho, que ficou conhecida como Aldeia dos Franceses, isolado da Europa e só mantendo contato com comerciantes de madeira, e pode ter confundido o tempo de sua permanência no Brasil. 

  Outro dado relevante nessa história é o seguinte: até a data de 1509 ou 1511 sabe-se que aportou no Brasil, no litoral de Santa Catarina a nau francesa L'Espoir comandada por Binot Paulmier de Gonneville que saiu do porto de Honfleur, com 60 homens, com a ajuda dos navegadores portugueses Bastião Moura e Diogo de Couto, em viagem comercial às Índias. 

  Esses dois portugueses citados foram contratados pelos franceses porque já haviam integrado a missão de Vasco da Gama, primeiro a descobrir o caminho às Índias, entre 1497-1499, e no livro editado pela UFSC, "São Francisco do Sul - Muito além da viagem de Gonneville", organizado por Silvio Coelho dos Santos, Anelise Nacke e Maria José Reis" há o registro de que essa nau aportou em São Francoisco do Sul em 5 de janeiro de 1504 e permaneceu durante 6 meses, em conserto com a ajuda dos nativos locais Guarani-Carijó.

  Gonneville desistiu de seguir para as Índias e retornou à França levando consigo dois nativos Carijó: o jovem Içá-Mirim, filho do mayoral rei de Arosca, e um guerreiro chamado Namoa. 

  No retorno a Honfleur sua nau - segundo esta mesma públicada da UFSC - "no nordeste do Brasil, fizeram paradas para abastecimento de viveres e de produtos comerciáveis". Não há detalhamento onde se deram essas paradas e o que levaram. O certo é que, durante o retorno, Namoa morreu e outros tripúlantes, do total dos embarcados (60) só sobreviveram 28 inclusive Içá-Mirim.

  Teria Diogo Álvares participado dessa viagem e ficado no Nordeste?

  É improvável. Como há a recelação a Martin Afonso que estava na Bahia há 22 anos, ou seja, desde 1509, e a Acuña, desde 1511, não bate com a data da nau de Gonneville (L'Espoir) cuja viagem deu-se entre 1503/1504. 

  Além do que, ao ser deixado na Bahia nesse período 1509/1511 deveria ter entre 15 a 20 anos de idade o que se poder auferir é que nascera entre 1491/1493 a 1489/1811. Se não há registrto do local do seu nascimento, muito menos há sobre a data e de quem era filho. Sabe-se a data do seu falecimento, em Salvador, em 5 de outubro de 1577, em carta de Nóbrega aos seus superires.

   O padre Manuel da Nóbrega era jesuita e chegou à Bahia na missão de Thomé de Souza para fundar a cidade do Salvador, em 29 de março de 1549.
  
  Uma coisa parece certa: Diogo não foi deixado na Bahia pelo navegador francês, Jacques Cartier, o descobridor do Canadá (1534), uma vez que a primeira viagem que este fez para o novo mundo, ainda bem jovem, teria ocorrido em 1509 quando tinha 18 anos, ainda aprendiz de marinheiro, indo a zona ao sul do Labrador, área que já era conhecida para a pesca do bacalhau e fora descoberta, em 1497, pelo italiano Giovani Caboto e explorada pelo portugues Gaspar Corte-Real, em 1500. Essa rota não passava pelo Brasil.

  Cartier nasceu em Saint-Malo em 31 de dezembro de 1491 e se casou com Catherine des Granges em abril de 1520 celebração feita pelo vigário Lancelot Ruffier (anote este nome) ela filha do condestável de Saint-Malo Jacques Honoré Des Granges, senhor da Ville-ès-Gares e Françoise Dumast. 

  Sua primeira viagem com o objetivo de descortinar uma passagem do Pacífico para a Ásia dá-se em 1523 na expedição (bancada pelos financistas franceses) do italiano Giovanni da Verrazzano, em 1523, partindo do Porto de Dieppe, nas naus La Normande e Dauphine, sendo que, em 17 de janeiro de 1524, entram na Nouvelle Angouilême, hoje, New York. Planejaram uma coisa e deu outra.

  De retorno à França, Verrazanno organiza nova expedição, em 1526, e sabe-se que frequentou as cortes de dom João III (rei de Portugal) e Henrique VIII (rei da Inglaterra) trentando recursos econtratando navegadores experientes. A expedição de 1526 foi bancada pelos franceses. É nesta expedição que, no retorno, passa pelo Brasil com citação que este em "pernambouc". Retornou a França em setembro de 1527.

  Acontece, então, a terceira viagem, em 1528. Esta sim, a importante na história da Bahia. Depois de passar pela Flória, Bahamas, percorre as "pteites Antilles" quando, Verrazzano, ao desembarcar em Guadalupe é caputado pelos nativos Caraibes e morto.

  É nesta viagem, que Cartier assume o leme da nau La Flamengue e passa pelo costa do Brasil e faz um carregamento de madeira e leva consigo uma tupinambá para Saint-Malo, batizando-a como Catherine du Brésil, em 30 de junho de 1528.

  Há, ainda, muitas dúvidas em relação a viagem de Catarina. Não a viagem em sí mesmo porque ela existiu e há o registro do batismo, bem como que ela morou em Sain-Malo, ao menos até 1534/36, na casa de Cartier e sua esposa Catherine Des Granges, mas, se a essa época, Diogo Álvares já era casado com Catarina; se Diogo foi quem intermediou o negócio da venda da madeira? e que madeira foi essa uma vez que no território de Salvador não havia Pau Brasil.

  Essas dúvbidas são recorrentes e o que se poder deduzir é o seguinte: Em 1528, Cartier já tinha 37 anos de idade; e Diogo, na Bahia desde 1509/1511, também tinha em torno de 37 a 40 anos de idade e já morava entre os tupinambás, entre 17 e 19 anos. Ou seja, já tinha uma relação de proximidade com os nativos muito grande.

  Observe, também, que Portugal, a essa altura (1528) ainda mão decidira colonizar o Brasil e a costa breasileira era visitada por naus da França, Espanha e Portugal. A primeira tentativa organizada de Portugal em colonizar o Brasil só vai acontecer em 1536, com a instalação das Capitanias Herediárias.