Cultura

A HISTÓRIA DOS BAIRROS DE SERRINHA, CAP 25: PARQUE SANTANA E CANDOMBLÉ

Antes da urbanização do local havia no espaço o candomblé de caboclo Lurdinha Cincuncizão de Carvalho
Tasso Franco , Salvador | 10/05/2023 às 10:28
Terezinha Lima Carvalho, viúva de Manoel Pequeno, antiga moradora do bairro
Foto: BJÁ
  
   Vamos tentar montar uma história do bairro Parque Santana, em Serrinha, observando-se a configuração do quadrilátero no Google Maps e de acordo com informações de moradores uma vez que, na Prefeitura, não há um estudo sobre o tema e a Câmara de Vereadores até o momento não me informou sobre os projetos de leis que criaram os bairros, embora já encaminhei ofício ao presidente da Casa há mais de um ano. Há uma confusão enorme entre os bairros Parque Santana, Ginásio, Estádio e Rodoviária e os limites de cada qual e nem os moradores desses locais sabem, ao certo.

  Pelo que consegui identificar, o Parque Santana (grafado assim e não Sant’Anna, a santa) é um quadrilátero que vai da margem direita da Avenida ACM (sentido centro) portanto, a área sul do bairro; até a Avenida Mario Andreazza (acesso à cidade a partir da BR-116), a área norte; faz divisa com a BA-409 estrada para Coité, na área leste; e a oeste, com o bairro Ginásio, com as áreas da AABB até a Pousada Belíssima integradas ao Parque Santana. As duas principais avenidas deste bairro são a Álvaro Augusto e parte da Lauro Mota.

  Vou colocar um pouco de história para que os leitores possam entender melhor. Toda essa área de Serrinha, no meu tempo de menino (1950/1955) era constituída por sítios e fazendas, a exceção do prédio da Sericicultura (atual Colégio Rubem Nogueira) construído no governo de Juracy Magalhães, 1935, ainda integrado a Secretaria de Agricultura para ser a sede do projeto do cultivo e industrialização do bicho da seda. O prédio era imponente e isolado com um imenso largo em barro vermelho cujo acesso se dava pela atual Avenida Luiz Viana Filho, que ainda não tinha este nome (LVF só foi ser governador da Bahia em 1967) e existia um portal enorme em pedra com portão de madeira guarnecido na corrente e logo após um tanque. 

  Só entravam nessa área os técnicos da Sericicultura e assessores com credenciamento. Mas, nós, as crianças, pulávamos a cerca e íamos tomar banho neste tanque e também brincar em frente ao prédio do bicho da seda que, a essa altura, no início dos anos 1950 já estava em decadência e servindo de sede de um órgão chamado: Serviços Gerais de Leguminosas. 

O projeto (bicho da sede) não deu os resultados esperados e quando foi criado o Ginásio Estadual do Nordeste por projeto de lei do deputado Rubem Nogueira (1952) o estado transferiu o prédio da Agricultura para a Educação e instalou o ginásio, em 1953. O primeiro ano do ginásio, 1952, só com primeira turma, aconteceu na sede da Prefeitura, prédio que está desabando, há anos, ao lado da matriz de Sant'Anna.

  Com a chegada do ginásio essa área ganhou vida nova e o portão da Sericicultura foi retirado, a Prefeitura instalou o Campo de Futebol da Cidade (antes na área da ACS) ao lado do cemitério paroquial. Mas, ainda assim, tudo que existia depois da sede do ginásio era mato, fazendas e sítios e uma estrada vicinal que seguia para as fazendas Regalo, Saco do Correio e outras e o distrito do Lamarão. A entrada de Serrinha pela estrada federal no governo Getúlio Vargas (1933) vinda de Santa Bárbara pelo Matão, Alto, Campo de Aviação, linha do Trem e seguia onde é a Avenida ACM na Cidade Nova, com posto fiscal e corrente na altura do Hospital Antunes. 

  Isso significa dizer que o miolo à direita desta estrada (onde estão Rodoviária, Parque Santana, etc) continuava como fazendas e sítios e a esquerda abriu-se uma via próxima a charqueada do Novaes com a instalação do Matadouro, hoje, bairro Novo Horizonte.

  Quando entrei no ginásio, em 1957, nossa praia era do largo do ginásio para o centro, nada de se aventurar pelos matos, como dizíamos, pois, havia cobras. Num desses sítios, numa roça (como se fala na linguagem do povo de santo), se instalou o candomblé da Lurdinha, de caboclo (daí que precisava de uma roça para o culto) com integrantes da família Circuncizão de Carvalho.

  Essa família era natural de Conceição de Feira e parte veio morar em Serrinha e a outra parte foi para Salvador. Além de Lurdinha seu irmão Manoel Circuncizão (conhecido em Serrinha como Manoel Pequeno e/ou Perna Torna, mecânico de autos) foram morar exatamente na roça onde é, hoje, o Parque Santana.

 Todas essas pessoas já faleceram, a exceção da Terezinha (mulher de Manoel que ainda mora no local) e Anízio Carvalho, que, aos 93 anos, fotógrafo, foi meu colega no Jornal da Bahia nos 1960/70 e mora no Engenho Velho de Brotas, Salvador (depois falaremos dele).

  Ora, quem desbravou essa área de Serrinha, finalmente, já com algumas casas aqui e acolá primeiro foi a mudança de trajeto da BR-116 com estrada asfaltada e acesso ao centro de Serrinha pelo largo do ginásio (Avenida Mário Andreazza) e depois, na década de 1980, no governo de João Durval Carneiro (1983/1987) que determinou a construção de uma rodoviária (governo municipal de Josevaldo Lima) e a estrada do sisal.

  Foi essa estrada (BA-409) que descortinou essa área da cidade, uma via transversal norte-sul, e vai dá margem a criação dos bairros Rodoviária, Parque Santana e Estádio, que são vizinhos uns dos outros e se misturam. Moradores e casas comerciais instaladas no Parque Santana e que ficam à margem desta BA (Casa Palmeira, MM Autopeças, etc) dizem que são do bairro Rodoviária e moradores a oeste dizem que são do bairro Ginásio. É uma confusão dos pecadores. Como Serrinha só tem 1 CEP vai ficando ao gosto dos moradores.

 CONVERSEI COM TEREZINHA

  Uma das moradoras mais antigas do bairro Parque Santana chama-se Terezinha de Lima Carvalho, 76 anos de idade, viúva de Manoel Circuncizão de Carvalho Neto (Manoel Pequeno e/ou Manoel Perna Torta) irmão da mãe-de-santo Lurdinha, a qual, ainda hoje, mora no local onde existiu o candomblé (Rua Álvaro Augusto, 725). 

Conversamos na última semana santa e ela me disse que, pelo que sabe, mora no bairro Rodoviária, e a oficina (o local) que funcionou a mecânica de Manoel, seu esposo, hoje, é uma oficina que pertence a seu filho Marconi, que é mais conhecido pelo apelido de "Maresia".

  "Nunca ouvi falar nesse Parque Santana. Cheguei aqui em 1963 e era tudo sítios. Para chegar no centro da Serrinha tinha um caminho da roça que íamos andando até o largo do Ginásio e depois no centro. Aqui não havia nada e todos nosso abastecimento era feito na feira livre dos sábados, lá na Luís Nogueira. Eu me casei com Manoel e morávamos nessa roça onde havia o candomblé e a irmã dele era quem batia e recebia o povo", confessa.

  Diz que, ao longo dos anos viu toda a área se modificando com a construção da BA-409 e da estação rodoviária, abertura de novas ruas e que continua morando no mesmo local. "Eu conheço todo o povo antigo da Serrinha, mas tudo foi mudando e agora são novos tempos, a cidade cresceu e a vida segue como Deus quer", diz

   Fomos andando até a oficina de Maresia, o conheci, pessoalmente, porém, não consegui novas informações. Ele estava muito concentrado no trabalho e há um letreiro na oficina intitulado "Auto Peças e Serviços Nenê e Careca". A oficina fica em frente a rodoviária e diz-me que é bairro Rodoviária.

 ANIZIO CARVALHO

  Anízio (hoje, com 93 anos, único filho do velho Manoel, irmão de Lurdinha e Manoel Neto todos nascidos em Conceição da Feira), ao invés de Serrinha se mudou para Salvador e, aos 14 anos, foi trabalhar na casa da família do fotógrafo Leão Rosemberg. Não demorou e Anízio progrediu dos serviços gerais na casa a ajudante de laboratório no estúdio. 

  Ingressou no Jornal da Bahia, em 1957, como laboratorista, permanecendo por mais de 30 anos como fotógrafo, até o fechamento do diário. 

  Pois bem, quando entrei no Jornal da Bahia, em 1968, conheci Anízio e ele ficou alegre em saber que eu era de Serrinha. Então me contou que ia sempre a Serrinha nas festas do candomblé de sua irmã. Eu, abismado, porque não conhecia o candomblé, disse, comigo mesmo, que quando fosse a Serrinha iria conhecer Lurdinha. Mas, nunca fui. Mudei de jornal no final de 1969 indo trabalhar na Tribuna da Bahia e vez por outra encontrava Anízio.

  Confesso que não cheguei a conhecer o candomblé de Lurdinha, mas mantenho amizade com Anízio até hoje, já fui conhecer o peji que tem em sua casa e, recentemente, compareci a uma exposição de suas fotos no Museu da ABI.

   COMO ESTÁ HOJE O BAIRRO

  Recentemente, o prefeito Adriano Lima, afirmou que pavimentação do bairro Parque Santana é uma reivindicação antiga dos moradores, e o projeto faz parte de uma ação que está beneficiando outras localidades do município. "Foram mais de 30 anos de promessas da pavimentação dessa área, e graças a Deus vamos conseguir entregar, e esse processo está consorciado com algumas ruas pavimentadas como nos bairros do Cruzeiro e da Cidade Nova. É um investimento grande, de R$ 3 milhões de pavimentação e conseguimos contemplar essas localidades".

  Além das principais avenidas do bairro, a Álvaro Augusto e trecho da Lauro Morta, outras ruas mais conhecidas do local são Solidariedade, Rua José Sancho e Rua Mariano Santana. O bairro é também conhecido por sediar a Clínica de Nefrologia de Serrinha (hemodiálise) e ganhará uma maior visibilidade quando da inauguração do Colégio Estadual em Tempo Integral (ainda sem nome de alguma personalidade) que receberá os alunos do Colégio Rubem Nogueira e da Escola Normal e deverá ser inaugurado ainda em 2023.

  Trata-se, pois, de um bairro misto, estruturado, ainda com ruas sem calçamento, com boas residências, serviços de clínicas médicas e outros, comércio e agora com um grande colégio.