Cultura

DIOGO BERNI POR DIOGO BERNI E A MATURIDADE PARA ESCREVER SOBRE CINEMA

O homem cresce quando se acresce , e talvez isto ainda falte para que minha ambição se torne maior no sentido de precisar pensar não apenas só em mim, mas na prole
Diogo Berni , Salvador | 08/02/2023 às 11:18
Diogo Berni
Foto: REP
    Tudo começou quando tinha um mês; mentira, tinha uns dois ou três anos de idade quando comecei a querer ter o monopólio da minha mãe, deixando meu pai, obviamente enfurecido. Tinha problema de intestino preso e só conseguia obrar quando mamãe cantava pra mim, tarefa esta que demorava horas para a merda sair do meu pequeno furico , geralmente pela noite na hora de dormir, ou meus pais fazerem brincadeira. 

  A fase de ódio e ciúme do meu pai era nítida até para uma criança de três anos, só não saia fumaça das suas orelhas porque saia da boca e do nariz , que tanto fumava até morrer de câncer de pulmão com 63 anos, eu com 33 ( fiquei no lucro até, ele perdeu o pai dele com 7 anos). 

  Ainda criança, porém mais velho, tinha incontinência urinária e fiz xixi na cama até meus dez, onze anos. Li que fazer xixi na cama é sintoma de criança insegura, e de fato era, apesar de enérgica. Anos passaram , fiz o que toda pessoa normal faz, ou seja, acabei o segundo grau e fiz faculdade ( de administração ). Formado com o canudo na mão nunca emplaquei como administrador; tive inclusive a chance de administrar a agência de propaganda em que o meu pai era sócio: desastre total; acabei somente ajudando o office-boy a pagar contas nos bancos. 

  A faculdade definitivamente foi errada, tinha tentado antes educação física e só não passei porque encontrei os portões fechados no prédio das provas de segunda etapa da UFBA. Morei em São Paulo por um ano trabalhando com meu pai e mais uma vez acabei como office-boy pagando contas nos bancos paulistas. 

  A experiência foi como luz de alerta indicando que talvez o ramo burocrático empresarial não seja a minha praia. Voltando a morar em Salvador passei a escrever críticas de filmes, sempre fui rato de cinema. Fiquei muito tempo como crítico de cinema: é um ofício perigoso porque você acha que é mais inteligente que o diretor do filme, e divaga sobre o que ele teria que fazer e não fez. 

  Também o fato de escrever me fazia bem, todavia entendi, após mais de uma década na profissão, não remunerada escreva-se de passagem, que escrever sobre o que um outro faz enfraquece sua personalidade sem ao menos você perceber. Não que seja uma profissão pequena, mas acho que “desaumenta[U1]  “ a criatividade , embora respeite todos os críticos de cinema aos quais tive o prazer de conhecer, me parece mais do que um ofício, mas sim uma missão a crítica de qualquer arte: profundo respeito por quem ainda faz. 

  Todavia a crítica foi a porta de entrada para a arte , não agora como mero espectador, mas sim opinador, cobrindo os principais festivais de cinema do país. Paralelamente aos festivais cursava letras, já que escrever é ponto essencial para ser crítico. Fiquei ,durante dez  anos, coquetemente  em duas funções, ambas inumeráveis. 

  Durante tal período , sendo estudante de Letras, apaixonei-me pela literatura. Tenho a paixão, e não o hábito de ler todos os dias, senão o faço fica parecendo que faltou algo pra fazer. Escrever é difícil, mas torna-se impossível se não ler. A arte veio da crítica cinematográfica e da literatura, no meu caso; e aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo ( 45 anos ), resolvi trocar o curso de letras pelo de cinema pra ver no que vai dar. 

  Ver no que vai dar porque talvez pela maturidade, vejo que  arte pode ser consumida não somente em ser artista: a arte está em tudo, até no mais mercenário trabalho não artístico. Durante minha  existência apenas me interessei em ler literatura, excluindo-se os livros técnicos que tive de ler na faculdade de administração. 

  Agora isto mudou: começo a ter prazer em ler artigos e livros relacionados a economia, política, negócios em geral e uma porta desconhecida começa a se abrir. 

  Dinheiro nunca foi o resultado que queria alcançar: sempre tinha outras coisas mais importantes a serem conquistadas como o intelecto e o conhecimento do ser humano, por exemplo, até mesmo porque tive a graça de nunca falta-lo ou a ambição de querer mais que o necessário que julgava suficiente para entender os principais dilemas da vida. 

  O homem cresce quando se acresce , e talvez isto ainda falte para que minha ambição se torne maior no sentido de precisar pensar não apenas só em mim, mas na prole. Maturidade é o que dita o que escrevo, seco e sem arrodeio de que é isto mesmo; só o tempo nos faz sábios e menos orgulhosos e vaidosos. A vida só acaba quando morre, enquanto isto vamos evoluir.