Cultura

PARIS AO SOM DO BANDOLIM, CAP 40 CEMITÉRIO PÈRE-LACHAISE E ALAN KARDEC

Père-Lahcaise é o mais famoso cemitério de Paris e portanto o mais visitado
Tasso Franco ,  Salvador | 12/01/2023 às 10:18
Visita a tumba do fundador do espiritismo Alan Kardeck
Foto: OG
    O Cemitério do Père-Lachaise é o maior e mais famoso de Paris situado no 20º arrondissement (distrito) acesso pela linha 3 do metrô estações Père-Lachaise e/ou Port Bagnolet. Fica situado na zona leste da cidade e para quem está hospedado (ou mora) na região da Praça da República, Hotel de Ville, Bastilha, dista 20 a 30 minutos de metrô. De outros distritos gasta-se em torno de 40 minutos e 1 hora. 

   Quando foi inaugurado no século XVIII os franceses não gostavam dele porque era longe demais e havia outros mais próximos. A partir do momento que personalidades da literatura, música, artes, política, economia e outras passaram a ser sepultados em Lachaise ganhou fama e se tornou uma referência internacional.

   Ocupa uma área de 44 hectares e abriga milhares de tumbas, uma capela, crematório, jardins de contemplação e uma infinidade de ruas, avenidas e caminhos internos todos bem sinalizados onde estão sepultadas as pessoas. O ingresso é gratuito. Na entrada principal do cemitério vende-se os itinerários impressos (3 a 4 euros) contendo todos os detalhes e quem tem iPhone pode seguir o que deseja pelo Google Maps. 

   Há visitas guiadas (20 euros) para quem deseja e especialistas em explicar a arquitetura do local e onde se situam as tumbas dos famosos. Ganha-se tempo com isso. Em média com guia ou sem guia gasta-se de 2 a 3 horas para percorrer as avenidas internas. Há 5 entradas no cemitério: a principal, a des amadieres, du repos, de la reuninon e gambetta. A Avenue Gambetta e o Boulevard de Ménilmontant são as vias externas do bairro com infra adequada: casas de artigos funerários e restaurantes.

   As avenidas principais do cemitério são calçadas em paralelepípedos com pisos irregulares. Portanto, recomenda-se sapatos de saltos baixos ou tênis. Os caminhos entre as tumbas estão mal cuidados com matos e pedras soltas além do que há milhares de tumbas precisando de reparos. Algumas são assustadoras para quem tem medo do sobrenatural. 

   Recomenda-se que, antes de fazer uma visita a Lachaise decidir quais personalidades você quer ir às suas tumbas. Eu selecionei 4: Allan Kardec, Édith Piaf, Marcel Proust e Jim Morrisson. 

   A lista é grande de personalidades sepultadas: Honoré de Balzac, Paul Éluard, Oscar Wilde, Savinien Cyrano de Bergerac, Jean La Fontaine, Colette, Eugene Delacroix, Jean-François Champollion, Auguste Comte, Maria Callas, Frédéric Chopin, Gioacchino Rossini, Marcel Camus, Yves Montand, Maria Schneider, só para citar alguns.

  HISTÓRIA

  "Au fil du Pére-Lachaise" a propriedade pertencia aos jesuítas no século XVII. O cemitério recebeu este nome em homenagem a um dos sacerdotes católicos, François d'Aix de La Chaise (1624-1709), "o padre La Chaise", confessor do rei Luís XIV da França. Após a expulsão dos jesuítas, o terreno passou para as mãos da cidade graças a Napoleão Bonaparte, e assim foi construído o cemitério, inspirado no estilo dos jardins ingleses.

  No início do século XIX, vários novos cemitérios substituíram as antigas necrópoles parisienses. Fora dos limites da cidade foram criados o cemitério de Montmartre ao norte, o cemitério do Père-Lachaise a leste, o cemitério de Montparnasse ao sul e o cemitério de Passy ao oeste (16º arrondissement).

   A concepção do Père-Lachaise foi confiada ao arquiteto neoclássico Alexandre-Théodore Brongniart em 1803 e, desde a sua abertura, o cemitério conheceu cinco ampliações: em 1824, 1829, 1832, 1842 e 1850, passando de 17 hectares a 44 hectares.

  Ao sul do cemitério encontra-se o Muro dos Federados, contra o qual 147 dirigentes da Comuna de Paris foram fuzilados em 28 de maio de 1871. Há, ainda, um muro com o nome de todos os franceses mortos na I Guerra Mundial. 

  Eu a madame Bião de Jesus visitamos mais detalhadamente as seguintes tumbas, em meados de julho de 2022.

  ALLAN KARDEC 

  O túmulo de Hippolyte Léon Denizard Rivali (Allan Kardec) é o mais visitado pelos brasileiros. Kardec criou uma teoria dando conta de que existe uma realidade além da visível, lançando, em 1860, o "Livro dos Espíritos". 

   Nasce, assim, o espiritismo visto por muitos como uma religião, porém, entendido como uma filosofia de vida (doutrina) com vários templos espalhados pelo mundo especialmente no Brasil. São milhões de espíritas no país e meu pai (Bráulio Franco), kardecista de carteirinha, foi um dos fundadores do Centro Espírita Deus Cristo e Caridade, em Serrinha, na década de 1940, que funciona até hoje com obras espiritual e de assistência social. O mais destacado espírita na Bahia é Divaldo Franco.

  Encontramos por lá dezenas de brasileiros e uma baiana de Santa Maria da Vitória. Ela conversou bastante com a madame Bião e falou que mora em Paris há 17 anos, casada, 4 filhos, e era praticante do espiritismo. 
   O túmulo é uma peça de granito vazada onde se insere uma estátua em bronze do pai do espiritismo, local bem cuidado com jarros contendo flores em todo o redor do dólmen. Algumas pessoas tocam com as mãos na estátua durante suas visitas. 

   Na lápide está escrito: “Nascer, morrer, renascer ainda e progredir sempre, essa é a lei”, mensagem mais conhecida da Doutrina Espírita. O túmulo está localizado na Divisão 44, Avenida dos Combatentes Estrangeiros Mortos pela França. 

    MARCEL PROUST

   Nos detivemos, também, no túmulo do escritor Valentin Louis Georges Marcel Proust autor da obra "Em Busca do Tempo Perdido", publicada em 7 volumes entre 1913 e 1927 (Prost faleceu em 1922, Paris).

    Marcel Proust considero meu preferido autor francês, de complexa interpretação porque traz em sua escrita aparentemente simples análises profundas sobre a realidade da vida europeia no início do século XX. Imagina-se, o choque que seus escritos representaram numa sociedade aristocrática provinciana onde aconteciam encontros amorosos, amores invertidos e outros - visto, então, à luz de um novo foco.

    Proust foi um intelectual refinado e recluso em si mesmo. Quando jovem frequentou a École Libre des Sciences Politiques cursos de Albert Sorel e Anatole Leroy-Beaulieu; e na Sorbonne os de Henri Bergson (1859-1941) cuja influência sobre a sua obra será essencial.

   A obra de Proust se resume a um livro base "Em Busca do Tempo Perdido" dividido em 7 partes: Em Busca do Tempo Perdido: No Caminho de Swann (Grasset, 1913) Parte 1: Combray; Parte 2: Um Amor de Swann - no original Un amour de Swann; Parte 3: Nome de Terras: o Nome À Sombra das Raparigas em Flor, (NRF, 1918, prix Goncourt); Parte 1: Em Torno da Sra. Swann; Parte 2: Nome de Terras: a Terra; O Caminho de Guermantes (NRF, 1921-1922); Sodoma e Gomorra (NRF, 1922-1923) A Prisioneira (NRF, 1923) A Fugitiva ou (Albertine Desaparecida, 1925) O Tempo Redescoberto (NRF, 1927)

    Para entender o autor é preciso ler todos esses volumes no Brasil publicados pela Nova Fronteira com suas interpretações familiares desde Combray até Sodoma e Gamorra, na sua fase de amadurecimento, se é que podemos chamar assim, pois, morreu aos 51 anos de idade. 

    Era um homossexual assumido tratando o assunto de forma aberta e com detalhes, o que representou um pioneirismo na Paris no início do século XX.

   A TUMBA - Imaginei que sua tumba em Père-Lachaise (pela importância do escritor) fosse algo mais destacada ou até majestosa. Mas, pelo contrário é modesta, em granito preto de baixo relevo, com inscrição apenas do seu nome e a data do nascimento e falecimento. 

   Quando da minha visita (17 julho 2022) três caqueiros mal cuidados com plantas ornamentavam o local. É, no entanto, um dos túmulos mais visitados por pessoas de média idade e idosos seus leitores e admiradores como eu. 

   EDITH PIAF

   Paramos, também, com mais tempo no túmulo da cantora Edith Piaf, considerada uma das mais destacadas da França intérprete de "La vie en rose" - salvo engano a música mais cantada e tocada na França e no mundo ocidental - como símbolo da Paris e da França. 

  Para o que representa a cantora no mundo artístico francês, trata-se de uma necrópole modesta com base tumular retangular baixa em granito negro composta por dois níveis. O superior representando um esquife com a superfície inclinada para cada lado. No centro, sobre o tampo uma cruz latina com Cristo crucificado em bronze vendo-o deitado. 

   Na parte frontal está gravado em baixo relevo o nome da família (Famille Gassion-Piaf) e gravações nas laterais (Louis Alphonse Gassion 1881-1944, pai da cantora); (Madame Lamboukas dite Edith Piaf 1915-1963); (Theophanis Lamboukas - Sarapo - 1936 - 1970 - último marido de Edith Piaf) em torno da base. 

   O vaso azul sobre o tampo contém as suas iniciais gravadas, EP,o que representa a separação da alma do corpo. Estava repleto de flores, em especial, rosas. Na parte da base onde lê-se o nome da família há um pequeno canteiro de flores. O túmulo fica na Divisão 97 e centenas de pessoas, de vários países, o visitaram no domingo (17/julho/2022).

   O funeral de Edith Piaf, em Parusm 1963, é considerado até hoje um dos maiores com multidões na França. Seu nome completo era Edith Giovanna Gassion (1915-1963) e morreu jovem diante uma vida tumultuada, exploradores de sua arte, amores frustrados, morte da filha pequena, bebidas e farras regadas a champagne.

    Entre seus maiores sucessos estão "La vie en rose" (1946), "Hymne à l'amour" (1949), "Milord" (1959), "Non, je ne regrette rien" (1960). Participou de peças teatrais e filmes. Exisgtem várias biografias e livros sobre Piaf e seu legado. 

   TOM MORRISON

    O túmulo mais visitado nos dias atuais é do roqueiro rebelde das músicas de protestos contra a Guerra do Vietnã, James Douglas Morrison - conhecido como Jim Morrison - da banda The Doors. Fica localizado numa das primeiras vias da entrada principal do cemitério, a partir da Av Gambetta, e está cercado e protegido por uma grade de ferro de 1m40cm de altura, dessas usadas pela Policia nos eventos cívicos e em manifestações de protestos nas ruas. 

   Pessoas de todas as idades visitam essa tumba, mas, a maioria é de jovens dos Estados Unidos e da Europa, onde o cantor era mais conhecido. Morrison nasceu em Melbourne (Flórida) e morreu em 3 de julho de 1971, numa viagem a Paris (França), morte polêmica e até hoje repleta de dúvidas. Diz-se ter falecido de uma overdose de drogas com álcool; e atesta-se que a morte foi causada por um infarto.

   Jim era considerado símbolo sexual provocador com comportamento deliberadamente excessivo e se tornou um ídolo do rock, mas também um intelectual engajado no movimento da canção de protesto, em particular contra a Guerra do Vietnã. Tem uma extensa biografia na formação acadêmica com estudos de política e psicologia social. Portanto, era um compositor que tinha base de conhecimento cientifico da realidade mundial.

   Comenta-se, ainda hoje, que o culto de seus fãs, mais ligado na zoeira do rock, eclipsa uma obra poética de grande riqueza. Não vamos aqui entrar em detalhes sobre sua obra como roqueiro exatamente na década mais polêmica dos anos 90 (1960), pois, existem dezenas de publicações sobre o cantor, muito livros inclusive, e nas revistas especializadas. Portanto, quem quiser conhecer mais sobre sua vida, deve se aprofundar nessas leituras.

   Nesta matéria falamos apenas da tumba onde está sepultado Jim, numa área próxima de Oscar Wilde, considerado seu autor favorito. O local era mal cuidado até foi erguido um jazigo em pedra esculpiada onde está escrito no frontispício o nome completo do cantor e sua data de nascimento e morte. Em 1981, o artista croata Mladen Mikulin  (es) adornou-o com um busto, que desapareceu em 1988. Em 1990, o túmulo foi renovado. A família do falecido tinha a inscrição “Fiel aos seus demônios” gravada ali em grego. Em 2004, foram instaladas barreiras de segurança. 

   Tem polêmica até hoje em relação ao túmulo. Grupos pagãos deixam garrafas de álcool no local (o cantor era considerado alcóolatra). Uma das últimas cenas do - quarta temporada da série TV Ten Percent é filmada ao amanhecer ao redor do túmulo. Há várias fotos do cantor espalhadas sobre o túmulo, flores murchas e flores vivas, caqueiros, uma mistureba enorme. Não dá para ver mais detalhes devido as grades de proteção.

   O relatório policial que testemunha a morte de Jim Morrison menciona como origem um ataque cardíaco, ocorrido em sua banheira, no apartamento da rue Beautreillis, 17-19, no 4º arrondissement. Rumores de diversas causas circularam, até recentemente depoimentos e confissões de familiares confirmaram a morte por overdose 23.

   Partiu aos 27 anos de idade. Ficou a lenda. Foi o que vimos em Père-Lachaise. Muita gente fazendo fotos, vídeos, gravações e até cantando suas músicas.