Cultura

PARIS AO SOM DO BANDOLIM, CAP 24: O ROMANTISMO NA TORRE EIFFEL

O próprio Gustave Eiffel construiu a torre num momento em que estava apaixonado
Tasso Franco | 17/11/2022 às 07:44
Juras de amor em Trocadero
Foto: BJÁ
   Imaginei reunir todos os casais que já fizeram juras de amor diante da Torre Eiffel, em Paris, a cidade 'mais romântica do mundo', assim considerada e amada pela maioria dos autores e turistas que a visitam. E há um sonambulo perturbador na vida do próprio engenheiro construtor Gustave Eiffel, viúvo na época em que começou a obra (1887) e apaixonado por uma ex-namorada da adolescência então casada com um dos lobistas em finanças do monumento e aquele que mantinha relações de marketing político com a imprensa. 
  
   Um clarão do céu, uma luz de inspiração fez-me ter essa ideia quando estive com minha amada - a madame Bião de Jesus - no platô do Trocadero, observando o que ela, desde o momento em que pisou seus pés no chão desta terra chamava-a de "minha linda" nas suas palavras matinais, todos os dias que se dirigia ao curso de línguas saudando-a com "bonjour ma belle". 

  Minha ideia - provavelmente - não seja original, pois desde que a torre foi erguida há 133 anos, uma espécie de ritual do amor se realiza aos seus pés, no Campo de Marte ou em Trocadero, ou até mesmo num dos estágios da própria torre olhando o Sena e Paris do alto. Tenho o direito de abrir e fechar as portas dos sonhos em frente "la dame de fer" quando quiser e vi que minha ideia não seria absurda, pois até os 'promoteres' de rua têm balões com corações nas proximidades da torre para servirem de cenários aos casais.

  E são tantas as juras de amor 'eterno enquanto dure' nesse cenário, quer seja com corações emoldurando os casais, quer discretamente n'algum cantinho ou em "bateau mouche", à noite, tomando champanhe ao som de violinos e navegando nas águas do Sena. Os cenários são múltiplos e comportam todo tipo de arte. Já teve gente que saltou de paraquedas, gente que usou bikes, declarações com poemas em forma de música, todo tipo de coisas.  

  O escritor e poeta Guy de Maupassant que detestava a torre porque assombrava a cidade, mas creio que também a amava, dizia com seu tom cáustico que almoçava todos os dias no restaurante da torre porque, de lá, não a via.  

  Há, na atualidade, na Amazon um filme intitulado "Eiffel" (lançado em outubro de 2021, Netflix) dirigido por Martin Bourboullo e estrelado por Romain Duris (no papel de Gustave Eiffel), Emma Mackey (no papel de Adrienne Bougèrs) e Pierre Deladonchamps (empresário casado com Adrienne) que narra como o engenheiro, já viúvo de sua esposa Marguerite Gaudelet reconheceu e tentou conquistar sua namorada de adolescência, de quem era apaixonado e prometeu casar-se com ela, porém, a família da jovem proibiu o casório e esta tentou fugir de casa sofrendo um acidente.

  Toda a trama é mostrada na tela por Borboullo, diretor que não coloca em cena Gaudelet com quem Eiffel teve 5 filhos, sua esposa que morreu precocemente aos 32 anos de idade, em 1887, creio que o fez propositadamente para não criar possíveis polêmicas na França onde vivem os descendentes do casal. Mostra os filhos e, sobretudo a filha mais velha, e até faz comparativos em lembranças quando esta jovem anuncia que vai se casar com um trabalhador da empresa de Eiffel, o "novato", o que remete ao não que ouvira, no passado, pelo monsieur Bougèrs.

  E também deixa claro que, apesar de um encontro fugaz com Adrienne onde Eiffel revive sua 'paixão' em cenas numa cama, ele não a consegue de volta ela preferindo viver com o empresário financista onde tinha uma vida - exposta no filme como de altos e baixos na felicidade - porém, de luxo. 

  O diretor mostra, ainda, cenas de protestos dos moradores e intelectuais de Paris diante da construção da torre, as dificuldades financeiras e trabalhistas que Eiffel encontrou para ergue-la, os entraves tecnológicos (a ponte erguida na beira do rio Sena) e a obstinação do engenheiro em enfrentar a tudo e a todos, momentos de greve de operários e falta de recursos quando decide hipotecar até a casa onde morava, até o êxito da construção em 31 de março de 1889. O projeto que os intelectuais e refinados francesas chamavam de "monstruoso" estava pronto e foi (e é) um grande sucesso.

  A roteirista do filma coloca a paixão de Eiffel por Adrianne numa simbiose com o formato em A, do monumento, o que supostamente seria uma homenagem do engenheiro a amada. Quem conhece a história da ponte nos detalhes sabe que o projeto original não nasceu de Eiffel e sim de dois engenheiros Maurice Koechlin e Emile Nouguier, que fizeram um esboço descrito como "um grande pilão, consistindo de quatro treliças que se separavam na base e se juntavam no topo, unidas por treliças de metal em intervalos regulares". 

  Inicialmente, Eiffel estaria interessado em construir o metrô de Paris embora tenha aprovado mais estudos sobre o projeto da ponte, e os dois engenheiros pediram a Stephen Sauvestre que acrescentasse adornos arquitetônicos. Sauvestre acrescentou os arcos decorativos à base. Eiffel, então, comprou os direitos sobre a patente do projeto exibido na Exposição de Artes Decorativas no outono de 1884 como um novo símbolo da França. O A de Adrianne é, portanto, fantasia cinematográfica para dourar a pílula do filme.

  E a torre, ainda nos dias atuais, tem esse encanto e cada qual ao fazer juras de amor para sua amada pode dizer o que quiser dela, até que uma dia também há de construir uma ponte em forma de O para simbolizar Ohra; ou de V para representar Vitória; ou de L para significar Lua. 

   Vários livros sobre a torre em especial de com NicoleD'Estioanne D'Overs estão à vendas nas livrarias da França. O melhor local para apreciar a torre é nos "Jardins du Trocadéro" - ou simplesmente Trocadero, em português - área localizada à direita do Rio Sena num morro urbanizado. Ponto preferencial dos turistas, pois tem-se a melhor visão do monumento. Em 2022, além de ter ido ao Trocadero mais de uma vez tive a oportunidade de assistir o concerto e a queima de fogos durante os festejos do 14 juliet, a data magna da França.

   É um lugar público gratuito e pode-se passear à vontade e até atravessar a ponte d'Lena - construção ordenada por Napoleão Bonaparte, em 1807, com vista para a Escola Militar - passar por baixo da torre (hoje, passa-se pelo lado diante reforma da estrutura) e chega-se à margem esquerda do rio onde fica o Campo de Marte, uma área verde imensa, e a Escola Militar.  

   Cada coisa de uma vez. Já falamos do Campo de Marte - vide capítulo anterior - e agora nos restringiremos ao Trocadero, área urbanizada em 1937, com 93.930 m² de espaços verdes, jardins, fontes, escadarias, platôs, assentos, etc, e vista deslumbrante da Eiffel. É, digamos assim, o lado romântico.  
   No centro deste espaço ergueu-se a fonte Varsóvia equipada com canhões de água e esculturas de cavalos dourados, cabeça de touro, "L'Homme" de Traverse e "La Femme" de Bacqué.  

   A época melhor para visitar esse local é no verão - às noites - quando a torre, fonte e demais áreas ganham iluminações especiais. Uma multidão fica esperando o momento em que a torre começa a piscar e o jogo de luzes se alterna em coloridos diferentes, isso de hora em hora, sob aplausos e lágrimas das pessoas. É cenário de cinema, na real. Muitas cenas de filmes já foram feitas nesse local e, quando visitei o local, em maio de 2022, no final da tarde, havia uma produção - provavelmente de comerciais para TV - com modelos e uma parafernália de equipamentos e luzes.

 No Trocadero, encontram-se o Palácio de Chaillot, museus, jardins e a Praça do Trocadero com aquário subterrâneo e seus bares e restaurantes ao redor. É possível tomar um drink vendo a chegada da noite observando a Eiffel.  
 
   A praça data de 1869 e o nome Trocadero foi inspirado em uma batalha travada por Napoleão Bonaparte, em 31 de agosto de 1823, na Espanha. A praça tem no seu centro uma estátua do Marechal Foch montado em um cavalo e um memorial do exército francês. 

  Nos jardins do Trocadero se apresentam, diariamente, dezenas de músicas de rua tocando violino, violão, acordeon, guitarra, sax, pequenas bandas sinfônicas e outros e você pode se sentare n'algum canto - e muita gente faz isso - e ficar ouvindo o que os músicos cantam e tocam. A gorjeta fica por sua conta. Não é obrigatória, mas, se você tira fotos ou filma os músicos sempre é bom dar um ou mais euros, a depender de sua condição financeira. 

  Onde tem muitos turistas todo cuidado com as bolsas é o aconselhável. Em Paris, tem batedores de carteiras à mancheia e quando furta uma delas e sai correndo em direção ao Sena, ninguém segura. Tem aquela gritaria "pega-pega" mas bye-bye. O lado romântico também tem esse tom de aventura.

  O local sempre tem policiamento ostensivo e nessa época de terrorismo internacional policiais portam fuzis automáticos e metralhadores, o que é comum. Há, como já narramos no capitulo anterior, uma quantidade enorme de camelôs africanos e indianos vendendo réplicas da torre. 

 Uma estação de metrô deixa os passageiros em Trocadero (no alto da praça) e se você quiser ir andando até o Arco do Triunfo, na Élysées, é perto. Mas, como disse acima, cada dia sua agonia, se concentre no Trocadero’ à tarde esperando a noite chegar. É quando se tem a melhor imagem da torre e o momento especial para uma declaração de amor: a sua amada e a Paris.

 Inspire-se em Eiffel - o filme pelo menos mostra isso - o engenheiro tascando um beijo na amada do alto da ponte olhando as águas do Sena a correr mansamente para o mar.