Cultura

PARIS AO SOM DO BANDOLIM, CAP 23: A TORRE EIFFEL, MONUMENTO MUNDIAL

A torre tem um significado muito grande para milhares de pessoas que vivem em função de sua existência
Tasso Franco ,  Salvador | 13/11/2022 às 09:28
Em maio de 2022 em visita a torre
Foto: BJÁ
   Descrever a Torre Eiffel é a coisa mais fácil que há. Uma torre de ferro a beira de um rio. Simples, assim! A simplicidade é o registro da primeira impressão. Depois, quando se observam os detalhes da tecnologia da época de sua construção (1887/1889), a importância da torre para o turismo, a indústria e a área de serviços - e Paris vive disso em sua essência nos dias atuais - o monumento tem um significado muito maior, mais abrangente, e envolve, também, a poética, a literatura ensaística e romântica, o cinema, o audiovisual, a propaganda, a pintura, as artes visuais, a música e quase tudo que se relaciona a ville.

  Veja que coisa curiosa: uma moradia nas proximidades da torre com vista para o monumento custa uma fortuna. Um apartamento distante do 7º Arrondissement - distrito onde se localiza a torre - pode ser no 4º, no 15º ou no 9º desde que tenha uma visão da torre tem um preço diferenciado de um estúdio ou um 3 quartos nesses mesmos distritos, sem vista para a torre. Então, até o mercado imobiliário tem relação com a torre.

  Diria, meu encantado leitor, minha Branca de Neve e fada leitora, que pelo andar do século - a torre foi concluída em 1889 para simbolizar os 100 anos da Revolução Francesa e estimular a economia em recessão na Exposição Mundial que Paris sediava - a torre representa além desse símbolo inicial (serviu como porta de entrada da Expo e seria, posteriormente, desmontada) uma gama de atividades e negócios que giram em torno dela, incalculáveis são de serem dimensionados. Ora, quantos africanos camelôs vivem e se sustentam em Paris vendendo réplicas da torre? São centenas, quiçá milhares se contarmos também os indianos, os paquistaneses, os asiáticos de vários países que controlam o comércio de souvenirs. 

  Isso tem repercussão na Ásia e na África. Os africanos - em sua maioria - enviam recursos que ganham em Paris com as vendas de réplicas da torres expostas em panôs - de todos os formatos, modelos, cores, iluminadas, prateadas, chaveiros, abajures, etc - para suas famílias no Senegal, na Guiné-Bissau, Camarões e outros que falam a língua francesa. Uma perna da indústria chinesa fabrica as réplicas da torre, creio mais de 90% delas, e chegam a França em containers enviados do Porto de Pequim. Isto é, chineses vivem em função da torre.

  Diariamente, milhares de turistas fazem "tours" pelo rio Sena, nos "bateaus mouches", a maioria dos passeios tendo como destino a área do torre até a Pont D'lena que liga o Trocadero ao Campo de Marte. Somente entre julho e agosto - temporada de verão - a cidade recebe 10.2 milhões de turistas (dados de 2019, antes da pandemia da Covid) e a França durante todo o ano abriga 77 milhões de turistas. Em 2022, os turistas já retornam e a visita a torre de barco o passeio mais procurado (custa 17 euros).

  Gravei em 3 de maio 2022, um vídeo para meu canal do YouTube no Campo de Marte (Champ de Mars) - local onde estão fincados os quatro pés da torre, correspondendo aos pontos cardeais e apoiados em bases de concreto de 26 m2 com 9 a 14 metros de profundidade. A torre tem três estágios e seu peso total é de 10 mil toneladas, sendo necessárias 60 toneladas de tinta para pintá-la. É repintada a cada sete anos, com os trabalhos durando de dois a três anos. 

  Falei de aspectos gerais da história do local e como a torre imortalizou Gustave Eiffel, o engenheiro construtor, que bancou sua edificação, o maior ícone da capital francesa, um símbolo mundial. Estima-se em torno de 7 a 8 milhões de pessoas ano somente considerando quem sobe num dos seus pavimentos. No geral, contando as pessoas que apenas visitam o local, mas não sobem na torre (os preços variam para cada estágio, a partir de 27 euros), são mais de 30 milhões de pessoas que visitam a torre todos os anos.

   O Campo de Marte também foi urbanizado no final do século XIX e é considerada a maior área verde de Paris (24 hectares) e que já foi campo de treinamento militar reunindo mais de 10 mil soldados, sargentos e oficiais de uma vez só. Hoje, sua área foi reduzida com a urbanização e surgimento da Avenida Suffren entre o 7º e o 15º distritos.

   No final do século XIX, a Europa vivia um momento revolucionário e Paris, em especial, a "Belle Époque" (1871-1914) uma efervescência cultural intensa, mudanças no modo de morar e viver, novas áreas de consumo com os magazines, moda, abertura dos boulevards, repaginação da arquitetura, ambiente político republicano com eleições diretas no voto popular e avanços na ciência. François Marie Sadi Carnot era o presidente eleito (1887/1894). Foi assassinado numa visita a Lyon por um anarquista.

  Louis Pasteur descobrira a vacina contra a raiva; Clément Ader inventa o termo “avion” (1890) e realiza primeiro voo de máquina motorizada mais pesada que o ar (há discordância sobre este feito); inicia-se o uso e expansão da telefonia a partir da invenção de Alexander Graham Bell; a invenção da lâmpada incandescente do Thomas Edison mudou toda planta energética; o surgimento da máquina de escrever Remington modifica a escrita; o uso da energia hidráulica se intensifica. 

  Em Paris são instaladas as primeiras lâmpadas elétricas em 1886, surgem os pneumáticos para bicicletas e veículos, as transmissões por telégrafo avançam, isso sem falar que a literatura vivia sem momento áureo com Émile Zola, Victor Hugo, Anatole France e outros, os zepelins já voavam, enfim, era um momento revolucionário em mudanças provocado na primeira revolução industrial que começara no final do século XVIII.

  A Torre Eiffel se ergueu no céu de Paris nesse ambiente e não estava prevista para durar. Na ocasião do centenário da Revolução Francesa, um concurso havia sido organizado, tendo como tema a “possibilidade de erguer sobre o Campo de Marte uma torre de ferro, de base quadrada, com 125 metros de largura e 300 metros de altura”. Dos 107 projetos apresentados, o de Gustave Eiffel foi o escolhido. Ele tinha a seu lado Maurice Koechlin e Emile Nouguier, como engenheiros, e Stephen Sauvestre, como arquiteto. A torre foi erguida entre 1887 e 1889, sob o comando direto de Eiffel, que também financiou o projeto.

  Gustave Eiffel (1832-1923) era um dos maiores especialistas mundiais em construção metálica. Havia edificado uma série de pontes e viadutos, em especial, a ponte sobre o Rio Douro, na cidade do Porto, Portugal. A Ponte D. Luís I construída entre os anos 1881 e 1886, liga as cidades do Porto e Vila Nova de Gaia, ainda hoje um cartão postal português. 

  A Exposição Universal e a Torre Eiffel anunciaram o advento do século XX. Tendo o direito de propriedade sobre a torre durante 20 anos, seu construtor fundou em 1888 a Companhia da Torre Eiffel. Em 1909, ela deveria ser desmontada, mas continuou.

   A torre foi apelidada de “candelabro vazio” e de “esqueleto sem graça” pelo escritor Guy de Maupassant. O escritor Joris-Karl Huysmans foi ácido: “Não podemos conceber que este monte de ferro, em forma de funil, seja concluído, que este supositório vulgar e crivado de parafusos permaneça como tal”. 

  O projeto seria uma ameaça à estética da cidade. Uma torre de ferro erguida em pleno coração de Paris não convinha, segundo eles, por contrastar demasiadamente com a elegância e a beleza refinada da cidade. Verlaine, por exemplo, apelidou a Torre Eiffel de “esqueleto de Beffroi” para descrever a aparência pouco graciosa do monumento, uma torre gigante que iria “desfigurar” a cidade.

 Centenas de pintores, poetas e escritores liderados pelo arquiteto Charles Garnier assinaram uma petição pública contra a Torre Eiffel, porque temiam que a estrutura fosse destoar do ar parisiense de romance e beleza. Eiffel rebatia a todos dizendo que a cidade também era da inovação tecnológica e da engenharia.

  Assim que o projeto virou realidade, estava previsto que o direito de exploração ligado à convenção para a construção da torre durasse 20 anos. Ao fim deste período, a torre deveria ser destruída. Durante este período a torre obteve um imenso sucesso na Exposição Universal com 2 milhões de visitantes. Assim, ela se torna símbolo da potência industrial francesa da época. A torre faz sucesso também na Exposição de 1900. Gustave Eiffel vai então ter um papel determinante para que a torre não seja destruída: ele se empenha para provar a utilidade científica da torre ao multiplicar as experiências científicas em domínios como a astronomia e a fisiologia. 

  Finalmente, o que salvará a torre será sua utilização como antena de rádio, utilizada inicialmente para as comunicações militares e, em seguida, para uma comunicação radiotelegráfica permanente - que teve, aliás, sua utilidade na Primeira Guerra Mundial. Hoje, sem dúvida, o monumento mais querido da cidade com dimensão mundial. Existem réplicas dessa torre em várias cidades da França e do mundo.

  Em 21 de março de 1901, Alberto Santos Dumont, pilotando um balão dirigível contornou a Torre Eiffel em feito monumental.

  Custo da construção da torre: 7.7799 401,31 francos; altura 312 metros; altura atual 324 metros; 1º estágio, 57m; 2º estágio 115m; 3º estágio 276m; peso total 10100 toneladas; rebites metálicos 2.500.000; peças de ferro 18.038; pintura 60 toneladas de tinta; 15 a 18 meses para pintar; início da construção 28 de janeiro de 1887; término 31 de março de 1889; 50 engenheiros e desenhistas produziram 5.300 desenhos; foram pré-fabricadas 18.000 peças diferentes e usados 132 artífices em metais na montagem.

  Os monumentos mais altos em Paris nesta época eram o Panthéon 79m; mirante da Notre Dame 66 m; coluna da Bastilha 47 m; coluna da Place Vendôme 45m; na França, a Catedral de Rouen 150 m. A ponte Eiffel se tornou a edificação mais alta do mundo até o surgimento do Empire State Building (1931) com 381 m e incluindo a antena 443 metros.

  Mais uma curiosidade para encerrar esta crônica: Já tive muitos sonhos em minha vida e ainda os tenho, mas nunca havia pensado em tocar "Tico Tico no Fubá" no bandolim aos pés da Eiffel e toquei. Um pouco do Brasil de yoyô e yaiá.