Cultura

SALVADOR 466 ANOS: A primeira evangelização dos tupinambás, em 1549

Faltam estudos mais aprofundados desse período da história da cidade do Salvador
Tasso Franco , da redação em Salvador | 28/03/2015 às 13:03
Seis padres jesuítas foram pioneiros na evangelização dos tupinambás
Foto: ILS
   Somente após 49 anos da descoberta do Brasil, em 1549, com a chegada da Esquadra de Tomé de Souza a Baía de Todos os Santos, é que se iniciam as primeiras evangelizações dos nativos tupinambás pelos padres jesuitas que vieram sob o comando de Manoel da Nóbrega. Foram eles: Leonardo Nunes, João de Azpilcueta Navarro, Antonio Pires, Vicente Rodrigues e Diogo Jacome.

   Todos eram portugueses e jovens. Essa Companhia fora fundada por estudantes da Universidade de Paris, em 1534, com a liderança de Inácio de Loyola. Em 15 de agosto de 1534, Inácio e seis outros estudantes (o francês Pedro Fabro, os espanhóis Francisco Xavier, Alfonso Salmerón, Diego Laynez, e Nicolau de Bobadilla e o português Simão Rodrigues) encontraram-se na Capela dos Mártires, na colina de Montmartre, e fundaram a Companhia de Jesus - para "desenvolver trabalho de acompanhamento hospitalar e missionário em Jerusalém, ou para ir aonde o papa nos enviar, sem questionar". 

   Inácio de Loyola escreveu as constituições jesuítas, adotadas em 1554, que deram origem a uma organização rigidamente disciplinada, enfatizando a absoluta abnegação e a obediência ao Papa e aos superiores hierárquicos (perinde ac cadaver, "disciplinado como um cadáver", nas palavras de Inácio). O seu grande princípio tornou-se o lema dos jesuítas: "Ad maiorem Dei gloriam" ("Para a maior glória de Deus")

   Na companhia de Fabro e Laynez, Inácio viajou até Roma, em outubro de 1538, para pedir ao papa a aprovação da ordem. O plano das Constituições da Companhia de Jesus foi examinado por Tomás Badia, mestre do Sacro Palácio, e mereceu sua aprovação. A congregação de cardeais, depois de algumas resistências, deu parecer positivo à constituição apresentada.

   Em 27 de setembro de 1540 Paulo III confirmou a nova ordem através da Bula "Regimini militantis Ecclesiae", que integra a "Fórmula do Instituto", onde está contida a legislação substancial da Ordem, cujo número de membros foi limitado a 60. A limitação foi porém posteriormente abolida pela bula Injunctum nobis de 14 de março de 1543.

   Portanto, a Companhia de Jesus só havia sido reconhecida pela igreja em 1540 daí que, os jesuitas que aqui chegaram foram pioneiros na evangelização de povos indigenas na América do Sul.

   Essa tarefa se deu, inicialmente, na aldeia do Monte Calvário - não se sabe o nome tupi dessa aldeia - onde hoje se situa o Convento do Carmo e isso representou um feito extraordinário, pois,os primeiros contatos com os tupinambás aconteceram no mesmo ano da chegada de Tomé de Souza, em 1549, noticia confirmada por carta de Nóbrega a Dr Martin de Azpilcueta, que fora seu professor em Coimbra, destacando que "possuimos uma casa a maneira de ermida, onde está um dos nossos, o irmão Vicente Rodrigues, que tem cuidado de ensinar e pregar aos neo-batizados e a muitos outros catecúmenos que estão nela".

   Esse fato era de enorme relevância uma vez que a cidade do Salvador foi erguida como uma fortaleza e havia duas portas - portões de madeira pesados - que eram guarnecidas por soldados armados e viviam fechadas, sendo uma ao Norte na altura da rua da Misericórdia - entrada da Praça da Sé - e a outra ao Sul - no final da rua dos Mercadores na altura da entrada da atual Praça Castro Alves, sendo que a leste ficaca o penhasco protetigo por canhões e o mar embaixo; e a Oeste uma vala onde corria um rio - posterior Rio das Tripas que nasce no morro do Mosteiro de São Bento - e é hoje a Baixa dos Sapateiros.

   Havia uma recomendação expressa do governador que os colonos não poderiam se afastar do perimetro da fortaleza e aqueles que fossem até a Vila Velha - no atual Porto da Barra - estivessem protegidos em armas. Os jesuitas, no entanto, desobedeciam essas ordens e mesmo correndo risco de vida porque os tupinambás eram antropofágicos, comiam gente como se come peixe, visitavam as aldeias de São Sebastião - onde hoje é o Mosteiro de São Bento, cujo mayorial se chamava Tubarão; a aldeia de Simão, no atual Forte de São Pedro; a aldeia onde é atual Praça da Piedade; e no decorrer dos anos chegaram até São Tomé de Paripe e Vila de Abrantes, esta batizada de Aldeia do Espírito Santo.

   Vocês podem ter uma dimensão do pioneirosmo desses destemidos jesuistas, nenhum deles foi devorado pelos tupinambás, mas, houve casos em que precisaram intermediar a briga entre correntes de guerreiros de uma aldeia, quando capturavam e matavam o guerreiro de outra aldeia e iriam comê-lo, como era tradição, o que motivava muitas dicussões, mais mortes, e até mudanças dos nativos para outros locais.

   A aldeia comandada pelo mayoral Simão se situava na região do atual Forte de São Pedro. Em carta do último quadrimestre de 1556, o irmão Antonio Blazquez narra que nesta aldeia havia "60 moços que aprendiam muito bem, sendo que o Principal, Simão, é o indio que desde os primeiros dias padre Nóbrega apresentou ao governador Tomé de Souza e que, em pouco tempo, se instruiu na fé e foi batizado. Na sua aldeia estão muitos indios pela fama que Simão tem, que são seus amigos os brancos; tem ordenado que os grandes, de noite, em a rede, ensinem aos pequenos; assim nos tem dito o padre João Gonçalves que os houve de noite, em sua pousada, repetir e praticar a doutrina louvor a Deus por tanto".

   Nos relatos de Carlos Bresciani SJ que escreveu sobre essas evangelizações entre 1549-1569 há muitos casos de submissões aos ditames dos colonos, de revoltas, de mudanças de aldeias, de conquistas e de fugas. Donos da terra, sempre que os indios se viam acossados pelos colonos fugiam para locais mais distantes.

   A rigor, nem os jesuistas; nem os colonos respeitavam a cultura dos tupinambás. 

   Os jesuitas impriam a fé cristã e os dogmas de igreja católica e não queriam saber de respeitar a fé dos nativos na natureza, em tupã e assim por diante. Para eles, o gentio era desprovido desse sentimento e o que  valia era os ensianementos da ordem em nome da igreja e do papa.

    Os colonos tinham uma visão ainda mais cruel. Para eles, os tupinambás tanto poderiam adorar tupã, raios, trovões e luas; quanto Cristo e os santos desde que trabalhassem para eles em suas culturas agrícolas a troco de nada. Era trabalho escravo mesmo.

   Esse periodo da colonização também é pouco estudado da história de Salvador.