Cultura

MOBILIDADE URBANA! Viajar no quadro de bikes na RMS é uma prática (TF)

Esse texto mostra um costume arraigado na vida da população de algumas cidades baianas
Tasso Franco , da redação em Salvador | 23/01/2015 às 10:24
"Andar no quadro', "viajar no quadro": prática comum na RMS
Foto: BJÁ
​   A expressão 'mobilidade urbana' está em moda. O que se tem falado, ultimamente, nesse termo não está no gibi. A urbanização crescente, o inchaço da cidade do Salvador e de seus satélites na RMS mostram isso. 

   Mas, como todos sabem, Salvador é a capital mais atrasada do país em termos de mobilidade urbana. Deu uma melhoradinha nos últimos anos e só. Nosso metrô é o mais ridículo do mundo, com seus 6km de extensão e vias expressas para bicicletas ainda sã poucas, mais até turísticas do que para servir aos trabalhadores. O transporte por ônibus é, quase sempre, 'lata de sardinha'.

   Veja que não existe, por exemplo, uma via expressa para bicicletas entre Lauro de Freitas/Camaçari e Salvador pela /Avenida Paralela. Entre Lauro e Salvador, via Paralela, são apenas 14 km. Daria para muita gente ir trabalhar usando bicicletas.

   Então, há um antigo costume que ainda se pratica e muito nas ruas de Lauro de Freitas no deslocamento da tal da mobilidade urbana, a condução no quadro da bicicleta. Existe o "Vou de Bike", idealizado no marketing da Prefeitura de Salvador; e existe o "Andar no Quadro", "Viajar no Quadro".

   'Andar no quadro' é até redundante, mas, é assim que muitas pessoas falam. Andar, na real, significa caminhar. No baianês, no entanto, essa expressão é muito usada: 'Andar de ônibus', 'Andar de Táxi', 'Andar no quadro". 

   O correto é se dizer 'viajar de ônibus', 'viajar de táxi', 'viajar de bicicleta'. No caso das bicicletas, como são utilizadas em áreas urbanas, nunca se diz "viajar de bicicleta" e sim "trabalhar de bicicleta", "passear de bicicleta", "eu uso a bicicleta para ir de casa do trabalho". 

   E muitas dessas pessoas que fazem esses pequenos percursos - as bicicletas são muito usadas nos bairros de Itapuã, Boca do Rio, Marcehal Rondon e outros - só o fazem nos prórpios bairros. 

   As bicicletas também são muito usadas entre Itinga e o centro de Lauro de Freitas; entre Portão e Vilas do Atlântico; entre Praia do Flamengo e Ipitanga; entre São Cristovão e o Jardim das Margaridas; entre a Cascalheira e Camaçari; Monte Gordo e Guarajuba; Jauá e Vila de Abrantes; e assim por diante.

    E muitas pessoas vão no quadro, conduzidas no quadro das bicicletas, que é a haste que se situa entre o guidão e o selim. As bicicletas modelos para mulheres não têm quadro.

   As pessoas usam o quadro sentadas de lado e as pernas são cruzadas embaixo nos tornozelos. O bicicleteiro pedala com a a perna esqueda mais aberta para não chocar com o (a) carona. Nem pra ficar fazendo 'terra'.

   É uma arte levar uma pessoa no quadro. A velocidade que se pratica nesses momentos é menor do que a usada por um ciclista solitário, é preciso ter todo cuidado com possíveis buracos nas pistas porque o quadro não é acolchoado, e o ciclista faz mais esforço nas pernas para pedalar a bike.

   Ciclista de bairro, ciclista popular, trabalhador - as empregadas domésticas usam muito as bicicletas nos condominios de Lauro de Freitas - não se chamam de ciclistas e sim bicicleteiro. E tampouco falam em bike e sim em bicicleta.

   Na condução de pessoas em quadros, normalmente a relação mais comum é um homem (bicicleteiro) levando uma mulher (carona). Às vezes, acontece homem conduzindo outro homem. E, raramente, ou não se vê, mulher conduzindo homem. Essa é a prática.

   O quadro - fora o uso para caronas - tem pouca serventia na bicicleta. Tem alguns trabalhadors que levam pequenas encomendas nesse local - laranjas em pequena quantidade, sacos de gelos, cocos e assim por diante. 

   Também é pouco compreensível que somente as bicicletas para homens tenham quadro e as das mulheres não. Deveria ser o contário porque os homens têm os aparelhos genitais com bolotas e quando elas se chocam com os quadros a dor é intensa.

   Outro detalhe interessante na condução de uma mulher no quadro é o cuidado no montar e desmontar da bike. Normalmente, o condutor fica sentado no selim, firma os pés no chão, segura a mão direita no guidão e com a esquerda ajuda a senhora a acomodar-se no selim.

   Diz-se que, as mulheres sentem maior prazer quando pedalam elas própias suas biciletas e existe uma infinidade de ensaios, crônicas e textos eróticos envolvendo os selins e as mulheres. Muita gente querendo ser selim. Ninguém quer ser quadro.

   O certo é que, 'viajar no quadro' ainda é uma prática muito usada na RMS.