Cultura

SALVE Sexta, 27, dia do caruru para Cosminho, por ZÉDEJESUSBARRÊTO

A mesa do caruru de são Cosme – ou de Cosminho servido nas residências baianas no dia 27 é farta e trabalhosa.
ZédeJesusBarrêto , da redação em Salvador | 26/09/2013 às 17:15
Prato na esteira e sete crianças comendo o caruru usando as mãos
Foto: Jeito Baiano
Setembro, na Bahia, é o mês de São Cosme. Do caruru de Cosminho, servido em casa de pobre e rico, festa dos meninos, obrigação nos terreiros. É comum, em toda cada baiana, até nos escritórios, se ver entronizado ou em cima de um móvel de um canto de sala a imagem dos santinhos gêmeos, os mabaças, de todos os tamanhos e formatos, espécie de amuleto das famílias, para guarda e proteção dos filhos. 

O dia de São Cosme e Damião, festa católica, é 27 de setembro. Dia de missa, caruru, brinquedo, doces e festança para as crianças até na paróquia dos santos, no bairro da Liberdade. Dia de folia, comilança, oferendas e agradecimento também nos terreiros de candomblé baianos, para  os Ibejis , o dois-dois, alegria dos erês (meninos). A festa do caruru, do pagamento de promessas feitas pela saúde dos filhos menores. Uma tradição na Bahia.    

Missa Pedida pra São Cosme

Nas ruas da capital e cidades do recôncavo, sobretudo, ainda se vê, desde o começo de setembro, jovens ligados à religião do candomblé, vestidos como num terreiro, levando na cabeça um tabuleiro cheio de pipocas, doces e uma pequena imagem ou um quadro de São Cosme e São Damião amarrados com fitas de cores verde e amarelo, abordando as pessoas na tentativa de angariar fundos para a festa da comida farta : “Missa pedida pra São Cosme!” , dizem, enquanto mostram o tabuleiro com alguns trocados.   A pessoa dá se quiser e quanto quiser, o santo agradece. Costumes baianos, que perpassam a história e tem suas origens na mistura de etnias, culturas e crenças que na Bahia se deu, desde o século XVI, e ainda se dá.

São Cosme e São Damião, rezam os católicos, eram irmão gêmeos nascidos de uma mulher árabe, convertida ao cristianismo, de nome Teodora, no século III  DC, plena decadência do Império Romano. Adultos, dedicaram-se à cura dos males do corpo e da alma, pela palavra, sendo por isso perseguidos e martirizados por ordem do então imperador Deocleciano. Com o martírio, veio o culto e a santificação católica dos santos médicos. Os portugueses trouxeram a devoção às terras baianas. 

SIMBIOSE

A simbiose com as crenças trazidas pelos escravos africanos aconteceu a partir da mitologia dos iorubas. Nancy de Souza (Dona Cici), contadora de histórias da Fundação Pierre Verger, diz que os mabaças ou gêmeos Ibejis (ib = nascer e ejis = dois) foram fruto do amor de Xangô com Iansã, criados por Oxum, a entidade das águas doces. Eram um casal, macho e fêmea, dualidade da energia da vida. Os ibejis representam a  prosperidade, a energia e a alegria infantil. A eles recorrem os adeptos quando uma criança adoece. Os rituais dos terreiros, no dia 27, são de agradecimento pela cura de alguma doença e pedidos pela vida e saúde das crianças.

 Entre senzalas e casas-grandes, mãe-pretas e vigários, batuques e orações o caruru de cosminho tornou-se uma tradição tipicamente baiana, manifestação de uma fé única, como só acontece na Bahia.  Na paróquia de São Cosme, que fica no bairro negro da Liberdade, há missas de hora em hora, das seis da manhã às sete da noite. A mais solene, celebrada pelo cardeal Dom Agnelo Magela,  acontece às 10 e a procissão pelas ruas do bairro, com  imagem dos santos, às 17 horas.  É comum a presença de pessoas na igreja em trajes de candomblé e a distribuição de balas e brinquedos para as crianças na porta do templo.  

O Caruru de Cosminho

A mesa do caruru de são Cosme – ou de Cosminho servido nas residências baianas no dia 27 é farta e trabalhosa. Geralmente, uma tarefa executada em mutirão por toda a família, vizinhos e amigos desde o amanhecer do dia com o corte dos quiabos, a feitura dos pratos que o acompanham, a decoração e enfeite da casa e a arrumação da mesa para receber bem os convidados e, sobretudo, as crianças. O caruru, prato principal, é colocado na mesa ao lado dos acompanhamentos: acarajé, abará, vatapá, feijão de azeite, banana da terra frita, arroz branco, xinxim de galinha, feijão preto, milho branco cozido, farofa de dendê, pipoca, rolete de cana, pedaços de coco seco e rapadura, no mínimo. No preparo do caruru, a dona da casa coloca sete quiabos inteiros e quem tiver um deles no prato tem a obrigação de oferecer um caruru em sua residência, no ano seguinte. 

Os convidados devem ser servidos um a um e recebem o prato arrumado com todos os elementos. A festa deve começar por volta das cinco da tarde e só termina à meia noite. 

Mas, antes de começar a servir os convidados, um prato bem grande de cerâmica ou uma gamela de madeira, contendo todos os elementos da mesa, é colocado numa esteira no chão e sete crianças, em torno, devem comer dali, com as mãos, e se lambuzar até se fartar. Só então os convidados devem ser servidos. 

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