Cultura

Crônica do Sábado: “Ofiçáide, lepitope e ispilicute”, p Marcelo Torres

Natural de Sátiro Dias-BA, servidor público federal, jornalista, formado na Facom/UFBA, especialista em Jornalismo Literário e Gestão da Comunicação, mora e trabalha em Brasília ( marcelocronista@gmail.com)
Marcelo Torres , Brasília | 11/05/2013 às 09:12
Está aí o "filho do beque"
Foto: Google

Certa vez li o Millôr, que foi o milorde do humor, mandar “site” (a palavra) para a casa do Catete. Com ele, não tinha site certo, muito menos sítio - era “saite” e pronto. Aí, este escrevedor passou a imitar o Millôr, e o mundo que não lia Millôr caiu de pau: “Sai-te daí, maluco, com este ‘saite’!”
 
Tempos depois, lendo “Já Podeis da Pátria Filhos”, livro de Ubaldo, deliciei-me com o trecho que o narrador dizia: “Se aquele filho da puta não fosse goleiro, toda vez que ele pegasse na bola eu marcaria ofiçáide”. O termo “ofiçáide”, que no futebol significa impedimento, assim entrava no campo linguístico.
 
Em outra parte desse mesmo texto, o narrador mandou o laser para escanteio, preferindo usar “leise”, essa arma que, segundo ele, teria sido usada pelas melhores seleções estrangeiras. “Ninguém me diga que a Hungria não usou o raio leise em 54, quando eles davam de 11 a 8 e 19 a 15 e 48 a O em quem aparecesse”, relatou. 
 
Quando é agora, esse menino, eu abro o Estadão e leio a crônica “Dois + Dois”, de LF Verissimo. O trecho que me interessou foi este: “Difícil imaginar que eles não tenham recorrido aos seus lepitopes, ou aos lepitopes de assistentes, para fazer suas contas. (‘Veja aí, dois mais dois quanto dá’). E os lepitopes podem ter fracassado”.
 
Como não sou besta nem menino, tratei de trazer esses três monstros sagrados para me ajudar, pois, com essas citações, ninguém se atreve a botar gosto ruim no meu filosofismo. Ora, depois do lepitope de Verissimo, do saite de Millôr e do leise e ofiçáide de Ubaldo, eu também vou escrever meus eticéteras e tais e pê-pê-pê caixa de fósforo aqui no feicibique.
 
Agora eu vou escrever tudo assim: fidibeque, baibai, becape, necessé, istripitise, laite, apigreide, chequin, uorquichópi, checaute, marquetingue, aifone, aipede, aipode, uanderfú, beirifú e eticétera...  
 
Veja, por exemplo, o zoom, que virou zum: é mil vezes melhor com “u”, pois ninguém merece uma palavra com o “o” dobrado – até parece um jogo 0x0. Não, já nos bastam o voo, o zoo e o álcool. Nada de zoom nem de boom.   
 
Esse “boom”, para mim, não é bom, melhor usar “bum”, mas cuidado para não confundir com pum, esta palavrinha cujo sentido etimológico é estrondo. Tanto é que, em livro de 1908, Artur Azevedo, escreveu: “Entro em casa dela de revólver em punho, e digo-lhe: - Mulher, contempla a tua obra! e pum!" É a este pum que me refiro, não ao eufemismo de ventosidade mal cheirosa.
 
Agora, olhe aí, esse menino, como ficou bonitinha e ordinária a palavra istripitise, cheia de “i”, e cujas consoantes parecem serpentear, dançando, ficando nua. E o chequin, hein? Não parece um mineirinho se referindo a cheque pequeno? É ou não é algo espirituoso?
 
Desde os tempos de Banco do Brasil, escrevo fidibeque, por parecer com “fio/filho de beque”, a lembrar que beque é aquele que, no futebol, bate até no vento, que é invisível. Para concluir, pois senão esse mimimi vai até o reveion, lembro de uma palavra porreta, que encontrei no linguajar dos cearenses: “Ispilicute”.
 
Ispilicute é nome de comércio em Fortaleza, nome de festa, nome de muita coisa. Em Brasília é nome de um forró que rola toda sexta-feira no Clube Cota Mil. A palavra significa algo bacana, legal, coisa porreta, coisa bonita. É que, tempos atrás, no Ceará, quando passava uma coisa mais linda, mais cheia de graça, aquela moça do sol de Iracema, os gringos diziam: “She’s pretty cute”.
 
Aí o cearense, para universalizar, para todo mundo entender, simplificou: “Ispilicute” e estamos conversados.