Cultura

JEFFINHO ENTRA NA ONDA PRÉ-VERÃO E COMEÇA A MALHAR. POR OTTO FREITAS

Otto Freitas é jornalista e escreve uma crônica a cada 15 dias sobre "Vida de Gordo"
Otto Freitas , Salvador | 18/11/2012 às 20:14
Verão chegando, Jeffinho quer ficar em forma
Foto: BJÁ

 

Com a chegada do verão e o peso aumentando em proporção geométrica, desde que parou de fumar, Jeffinho acaba de se render à corrida para as academias que sempre precede o verão - e começou a malhar. Assim, o gordo quebrou juramento antigo de jamais fazer esforço desnecessário, principalmente exercícios físicos.

Na verdade, ele havia aderido ao pacto firmado, nos anos 50 do século XX, entre o poeta Vinícius de Moraes e o jornalista e compositor Antonio Maria. Vinham os dois pela avenida Atlântica, em Copacabana, voltando felizes de mais uma farra. Apreciavam o amanhecer pela janela do carro, quando bateram os olhos em algumas pessoas correndo no calçadão. Nesse momento, fizeram a promessa; em seguida, riram muito e foram ao bar mais próximo, para tomar a saideira.

Para Jeffinho, portanto, a decisão de se iniciar na atividade física não foi questão de força de vontade ou de convicção, mas necessidade de sobrevivência: levando a vida sedentária de sempre, desde que parou de fumar engordou uns 30 quilos. Sem fumar, o paladar e o olfato ficaram limpos e o apetite aumentou. O cigarro acabou substituído por mais comida. A situação era tão grave que o gordo já não aguentava sequer ficar uns poucos minutos em pé; e a noite virou um tormento, pois ele passou a acordar muito mais vezes, com apnéia.  

Então, foi chegada a hora de Jeffinho tomar uma atitude - logo ele, que jamais fez qualquer atividade física além de levantamento de talheres e copos. Cansado das dietas malucas que experimentou por toda a vida e como não vê a cirurgia bariátrica como solução para o seu caso, por razões diversas, partiu para o simples e convencional: fez um check up, procurou “o trio de ouro Regina” (endocrinologista, nutricionista e personal trainer) e começou sua via crucis, empurrado por um monte de amigos, mais a força de todos os santos e orixas: é boca quase fechada, muito suor e dores por todo o corpo.

 

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A tarefa de fazer Jeffinho se mexer está entregue a Don Filipe, um jovem príncipe português com o pezinho na Angola da velha África, a avó da Bahia, como diz o pai véio e grande mestre das africanidades, Zedejesus, autor de várias obras sobre o assunto.  Fazer o gordo acordar, levantar da cama, vestir short e camiseta, calçar o tênis (a essa altura ele já está exausto, sem fôlego, quase morto!) é uma missão muito mais impossível do que a de Tom Cruise.

Mas Don Filipe é um personal paciente, compreensivo, com visão de longo prazo, quase infinita. Além do mais, é um psicólogo nato e nunca desiste. Efetivamente, ele não é aquele tipo tradicional de professor de academia, todo malhadão, fortão, que conduz o treinamento como se fosse uma sessão de tortura, de tal forma que faz o capitão Nascimento parecer um monge do Tibet.

Desse jeito, Don Filipe está conseguindo levar o treino de Jeffinho, que toda noite, antes de dormir, reza para não ter aula no dia seguinte, por causa de algum imprevisto. Se isso não acontece, ele levanta da cama na raça, irritado, angustiado, se queixando da vida. Mas, como está convencido de que não tem saída, vai à luta, mesmo resmungando.

Pelo menos, há um consolo imediato: depois dos exercícios, as endorfinas liberadas no organismo causam aquela sensação de bem estar e felicidade. É por isso que Jeffinho defende a tese: no fundo, no fundo, ninguém gosta de fazer atividade física; na verdade, é todo mundo viciado em endorfina.

Certo mesmo é que o começo está sendo muito difícil. Na primeira semana, um banquinho de madeira, de abrir e fechar, logo apelidado de Jeffinho, era a salvação da lavoura, já que o atleta neófito não conseguia andar mais do que 30 metros. Ficava exausto, ofegante, quase sem respirar.

Don Filipe, que carregava garbosamente o banquinho e os equipamentos para medir a pressão arterial e acompanhar os batimentos cardíacos, logo abria o banquinho, para Jeffinho sentar e se recuperar. E assim prosseguia, com várias paradas ao longo de um curto percurso. Era um minuto de caminhada e três anos de descanso!

Na água, é relaxante e menos cansativo. Mas no dia de atividade na piscina é preciso chamar os bombeiros, para colocar e retirar o gordão da piscina. Dentro d’água, Jeffinho mais parece uma baleia dançando “ai, se eu te pego”. O único problema é a pororoca que provoca, ao caminhar de um lado para o outro. Muito maior do que aquela do encontro do rio Amazonas com o Atlântico. É tanta onda que os meninos do condomínio vão logo chegando com suas pranchas para surfar na piscina.

O fato é que, seja na água, na pista ou na academia, puxando ferro, o dia seguinte é de descanso, para que Jeffinho possa curar o rosário das dores que toma todo o seu corpo. Dói até a consciência.

Mas Jeffinho desenvolveu um pensamento ao qual se agarra, para seguir em frente: quem malha e queima calorias abre espaço para continuar comendo o que gosta - moderadamente, mas comendo.

E assim vai se equilibrando nesse perde e ganha, “vivendo e aprendendo a jogar”, queimando o seu karma. Antes assim. Pior é morrer cedo, ou virar um velho gagá, que toma aqueles comprimidos, fica de pau duro, mas não lembra para o que serve.