Um dos nomes mais proeminentes do chamado Cinema Marginal, o baiano André Luiz Oliveira faz, em SAGRADO SEGREDO, sua quarta incursão em longa-metragem. O cineasta nascido em Salvador retorna à terrinha para a pré-estreia do seu novo filme, nesta quarta, dia 1º, às 21h, no Espaço Unibanco de Cinema - Glauber Rocha.

O também roteirista, compositor e músico já assinou filmes de longa e curta-metragem, de ficção e documentários, criou argumentos, roteiros, vídeos, gravou CDs, DVDs, trilhas sonoras, fez shows, programas de televisão, já escreveu livro e peça de teatro.  

O diretor de cinema encantou o público e a crítica do Brasil logo em seu filme de estreia, Meteorango Kid, O Herói Intergalático, de 1969, vencedor do Prêmio Especial do Júri do V Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, ganhador do Prêmio Margarida de Prata oferecido pela CNBB e O.C.I.C. - Office Catholic International du Cinema. E filmou ainda A Lenda de Ubirajara, entre 1974/5, e Louco por Cinema, em 1997, ambos também efusivamente premiados. Nós conversamos com o diretor André Luiz Oliveira que admite: "SAGRADO SEGREDO é autobiográfico".  

1. Por que a opção pelo formato que mistura ficção e documentário? Em que isso facilitou na abordagem do tema?

O filme começou como um documentário. Depois de ter o documentário pronto - que se chama "O Teatro de Deus" - é que caiu a ficha que desde menino, na Bahia, me impressionara intensamente com a história de Jesus e de seu drama e de que esta era uma oportunidade de fazer um filme sobre essas impressões infantis, incluindo todas as minhas leituras posteriores, abordagens heterodoxas e questionamentos adultos do cristianismo. Assim, imaginei uma equipe filmando a Via Sacra para incluir o que faltava no documentário e ficou um ficção/documentário. Outra coisa que me atraiu para esse formato híbrido foi o risco que iria correr recorrendo a uma abordagem diferente de tudo que já tinha feito antes ou visto na época. Gosto sempre de arriscar.  

1. O filme Sagrado Segredo se distingue de toda sua produção anterior. Antes, seus filmes caminhavam pelas trilhas da contracultura; neste, o foco é a fé. Por que esta guinada?

Essa palavra "contracultura" está habitualmente usada em um contexto midiático reduzido à cultura. Mas para mim ela se aplica a um conceito muito mais amplo. Tenho uma leitura diferente do que acho que a mídia considera contracultura. Para mim, é sinônimo de rebelião, oposição ao estabelecido, renovação etc. Se você for olhar com esse viés, SAGRADO SEGREDO segue na mesma linha dos meus outros filmes e em certos aspectos lembra muito de perto Meteorango Kid (sem falar no personagem principal crucificado no início deste). Foram filmes feitos sem um tostão, na base da guerrilha, arriscando tudo na linguagem, e ambos se antepondo a uma estrutura rígida e anacrônica que é a Igreja Católica e, no caso de Meteorango, a ditadura militar na época. Não creio que o foco do filme esteja reduzido apenas à fé.  

1. O filme é autobiográfico? Por que a escolha de uma equipe de filmagem?

Sim. A escolha da equipe de cinema foi um recurso simplório que recorri por incapacidade de imaginar algo mais criativo, mas poderia ser uma trupe de palhaços, um grupo de teatro etc.  

1. Você se considera um homem de fé?

Sim. Espero que você esteja se referindo à fé "jungueana", assentada no conhecimento de Deus cruzada com a experiência do transcendente em si mesmo. Não dessa fé do devoto que eu denuncio no filme, mas se verdadeira, não tenho nenhuma crítica.  

1. Quando se interessou pela encenação da Via Sacra em Planaltina?

Desde que assisti pela primeira vez em 1991 quando vim morar em Brasília. Subi o morro da Capelinha naquele calor infernal, no meio da multidão e fiquei muito mexido com aquilo tudo. Pensei, vou filmar isso um dia.  

1. Como foram feitas as filmagens? Em que período?

As primeiras cenas foram feitas em 16mm na quinta e sexta feira santa (se não me engano) de 1999. Fiz o documentário e acredito que um ou dois anos depois comecei a filmar a ficção com os atores e a equipe, em duas semanas. E nos anos seguintes, enquanto não conseguia recursos financeiros para prosseguir o filme, voltei lá sozinho com minha câmera fazendo cenas adicionais, olhares, coberturas etc.  

1. As falas do físico, escritor e místico Amit Goswami ampliam a compreensão sobre a vida de Jesus Cristo, inserindo-o na tradição mística da humanidade. A certa altura, ele fala que a mensagem do Cristo é tão radical, tão viva, tão à frente de seu tempo que só agora pode ser compreendida. O filme vem para atuar neste campo?

Sim, exatamente. Essa é a minha pretensão, embora tenha que concordar que não coloquei literalmente dessa maneira. Não fui competente suficiente para colocar de maneira mais clara todas as minhas pretensões e essa é uma delas. Acho que o filme não está sendo olhado com essa perspectiva.  

1. O filme mexe em dogmas da Igreja Católica, afirma que obediência às regras não combina com a mensagem deixada por Jesus, que pregou a liberdade, que dizia "que a verdade nos liberte". Você tem ideia de como será recebido pelos católicos?

Não tenho ideia, mas espero que seja recebido com corações abertos e mentes disponíveis a uma reflexão profunda sobre a verdadeira mensagem de Jesus e sobre si mesmos; aí então, poderá até haver, entre as pessoas menos dogmáticas, uma esperança de autotransformação.  

1. Como você definiria Sagrado Segredo?

É difícil definir assim em poucas palavras. São muitas as abordagens possíveis. Estou escrevendo um livro para dizer tudo isso que não consegui dizer no filme. Mas posso resumir no seguinte: é um filme honesto e verdadeiro até o limite em que um autor possa ser - mesmo correndo o risco de comprometer a própria obra em questão. Arisquei tudo (inclusive a minha filmografia) porque o tema me é muito caro e creio que somente com esse tipo de atitude desapegada (de egos) poderia chegar perto do que pretendia e pretendo: relativizar visões dogmáticas, capturar corações amorosos, expandir consciências etc. e muito mais...  É um filme que pode surpreender incautos e capturar não somente alguns poucos corações fervorosos, como consciências errantes em busca do milagre fora, em Jesus, mas que podem encontrá-Lo dentro de si mesmos.     SERVIÇO   SAGRADO SEGREDO Pré-estreia em Salvador Quando: 1º de agosto, 21h Onde: Espaço Unibanco de Cinema Glauber Rocha Cofirmação de presença: contato@sagradosegredo.com.br