Cultura

ROSANA JATOBÁ COMENTA NO SEU BLOG A ARTE QUE VEM DO LIXO

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| 06/09/2011 às 07:27

Aqui mesmo neste portal leio a notícia: batido no último dia 12, o recorde de preço pago por obra fotográfica de um artista brasileiro. O trabalho "Bloody Marilyn", ( Marilyn Monroe de chocolate), do paulista Vik Muniz, ultrapassou US$ 300 mil no leilão de Arte Contemporânea do Pós-Guerra, realizado pela Sotheby's em Nova York!

Vik Muniz já era uma sumidade quando o conheci num seminário sobre Responsabilidade Social , promovido pelo maior Banco privado do país. Ele acabara de vender uma de suas obras num leilão em Londres por vinte e oito mil libras, na época quase R$ 100 mil reais. O disputado quadro de Vik parodia o trabalho de um pintor francês que retratou o revolucionário Jean Paul Marat no momento de sua morte. Marat foi assassinado numa banheira por causa de suas posições em defesa do povo . Na tela do brasileiro, quem aparece desvanecido é Sebastião Carlos dos Santos, o Tião, catador de lixo do Jardim Gramacho. Mas em vez de sais de banho, está rodeado de materiais, detritos e resíduos, que lhe garantem a sobrevivência.

"Tião mostra o catador de lixo não só como uma figura marginal que está em uma ocupação alternativa, mas como uma classe de trabalhador com potencial de organização", explica Vik.

A parceria com Tião rendeu o documentário Lixo Extraordinário, indicado ao Oscar este ano. O filme mostra a mudança de vida de vários catadores de lixo no Rio de Janeiro quando começaram a colaborar com os trabalhos do artista plástico.

"O filme serve para mostrar o poder de transformação que a arte tem". Tião, por exemplo, ganhou visibilidade até se tornar uma "figura central" do setor da reciclagem no Rio, onde se impulsionaram vários projetos ecológicos, assinala Muniz.

Vik declarou que recorreu ao lixo em seu trabalho criativo por se tratar de "um elemento que ninguém quer ver" e que, por isso mesmo, possui um "alto poder provocador". Para Muniz, é "especial" e "paradigmática" a relação psicológica que o homem mantém com o lixo, orgânico ou inorgânico, que produz.

A minha preocupacão com os resíduos que produzo é recente: coisa de 4 anos. Comprei os 4 recipientes coloridos de separação dos recicláveis em vidro, papel, metal e plástico, e treinei as minhas assistentes a passar uma água no material antes de descartar, para evitar insetos. Como não há coleta da prefeitura no meu bairro, a cada 2 semanas transporto o lixo até o posto de coleta de um supermercado, distante 3 quilômetros de casa.

É claro que a tarefa não é das mais atraentes, mas faz parte do leque de atitudes necessárias à militância de uma cidadã amiga da natureza. E quando checo os números do descaso do poder público com a questão do lixo, aí é que reconheço a importância do esforço de cada um nesta empreitada de deixar a nossa Casa mais limpa.

A Lei nº 12.305/10 determina que até 02 de agosto de 2012, todas as prefeituras do Brasil deverão apresentar um plano de gestão de resíduos sólidos e colocá-lo em operação em 2014.

Por enquanto, das 240 mil toneladas de lixo urbano produzidas por dia no país, apenas 3% são coletados para reciclagem nos municípios. Somente 14% da população brasileira conta com o serviço de coleta seletiva. A maior parte dos detritos segue para aterros sanitários, lixões ou é jogada diretamente no mato, rios e oceanos. São mais de 200 mil toneladas de rejeitos e resíduos que ocupam espaço, degradam o ambiente, geram doenças. A decomposição do lixo produz metano (CH4), gás carbônico (CO2) e outras gases poluentes que reforçam o aquecimento global. O chorume, por exemplo, se infiltra no solo e contamina os lençóis freáticos, com o seu alto teor de acidez e bactérias.

De acordo com o professor José Eustáquio Diniz Alves, já temos o caminho das pedras. Em alguns aterros, se implantou um sistema de captação de gás metano para gerar energia. Existem usinas pilotos (Usinaverde) que são capazes de transformar 30 toneladas de lixo, por dia, em energia suficiente para atender 20 mil habitantes. Portanto, se todo o lixo produzido no país fosse transformado em energia poderíamos economizar bilhões na queima de petróleo e carvão vegetal e mineral. Existem também biodigestores anaeróbicos capazes de processar o lixo em sua forma "natural", tal como é coletado pelos caminhões nas casas, em energia útil para as residências e as comunidades. Além de gerar energia, o reaproveitamento dos resíduos contribui para mitigar o impacto sobre o meio ambiente, possibilitando reciclar papéis, plásticos, vidros, metais, etc, o que gera empregos e minimiza problemas de saneamento e saúde pública.

Estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2010) mostra que se a sociedade brasileira reciclasse todos os resíduos urbanos que são encaminhados aos lixões e aterros, poderíamos economizar cerca de R$ 8 bilhões ao ano, três vezes mais do que o montante poupado hoje.

O nosso grande expoente das artes plásticas já provou que o caminho entre um lixão e um leilão de arte não é tão distante assim, e pode ser muito valioso!