Cultura

ELA, INSINUANTE. ELE, RICARDÃO. FUNDIU. - POR MARCO GAVAZZA

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| 31/03/2010 às 09:02
Qual marca sobreviverá na fusão? A propaganda baiana pode gemer de dor
Foto: BJÁ
Minha intenção era escrever hoje sobre a comunicação humana no cotidiano, na convivência das pessoas, coisa que considero como uma das vertentes mais complexas deste vasto universo que é a troca de informações e idéias seja entre humanos no bate-papo ou entre grupos sociais, empresariais, políticos, intelectuais, artistas, formadores de opinião, lideranças etc. através dos meios de comunicação de massa.

Partindo de uma frase de Ovídio, que desde a Grécia antiga afirmava "comunicação não é aquilo que você fala, mas o que o outro entende" ia tecer algumas considerações sobre a estranha crença feminina na capacidade do homem em adivinhar-lhes o pensamento quando elas desejam alguma coisa.

Longe de ser uma lenda ou argumento para dizer que mulheres são seres complexos, tal fenômeno é corriqueiro e está entre as principais queixas dos homens quanto aos relacionamentos. Sempre há uma mulher que se irrita com o seu parceiro porque ela queria ir tomar uma água de coco no Farol de Itapuã e ele nem pensou nisso.

Mas, deixemos agendados para a próxima semana Ovídio, as mulheres e a inexistente paranormalidade masculina quanto aos seus desejos e vamos tentar raciocinar um pouco sobre o fato mais importante da semana -até agora- na área comercial e por conseqüência na propaganda: Ricardo e a Insinuante, juntos, derrubaram um dos últimos grandes grupos empresariais baianos do seu já minguado portfolio. A Insinuante deixa de ser uma empresa baiana e passa a ser nacional, com sede provavelmente em Belo Horizonte, onde já reside o Ricardo.

Com o Brasil profundamente abalado por não haver enforcamento seguido de esquartejamento do casal Nardoni e chegando aos limites do êxtase e da excitação por conta do BBB, a notícia não foi muito longe. Causou algum impacto no próprio comércio varejista, nos funcionários das duas empresas que temem pela demissão de pessoal e pelo consumidor que percebe no horizonte um ajuste de preços a favor dos próprios recém-amigados e não de quem pretende comprar um fogão ou um ventilador.

Mas a propaganda gemeu.

Há bastante tempo a propaganda baiana vem acusando os golpes representados pela perda de grupos empresariais baianos de grande porte. Desde as remotas fábrica de tecidos Empório Industrial do Nordeste e de refrigerantes Fratelli Vita, depois o Baneb e Banco Econômico, até desaguar nesta 2ª feira na Insinuante, perdemos a rede Paes Mendonça/Unimar e a rede Petipreço de supermercados, a linha de produtos de limpeza Atol, uma ou duas cervejarias (Chopp 70 e Carlsberg, se não me engano), a Telebahia, as fábricas de biscoitos Tupy e Águia Central, as lojas do Tio Correa, a Pneus Tropical além de muitas outras que não consigo lembrar agora.

Acho que hoje nos resta apenas a Odebrecht, pois até a OAS, outro gigante do setor de engenharia, hoje tem sua sede em São Paulo.

A cada vez que um destes grupos empresariais da Bahia é incorporado por grupos nacionais ou multinacionais ou simplesmente deixam de existir, perde a economia da Bahia, somem empregos, reduz-se a geração de impostos e ficamos na dependência cada vez maior do Sudeste e até mesmo do Nordeste.

Não conseguimos produzir uma simples garrafinha de leite de coco e compramos o produto indispensável à culinária baiana de empresas sergipanas, alagoanas e por aí vamos. A propaganda por sua vez, perde anunciantes poderosos sendo obrigadas a reduzir suas operações (fazer um "downsizing" digamos, para não passar muito vexame), dispensando profissionais e abrindo mão da qualidade para continuar atendendo os clientes de menor porte.

Se acaso Mario Kértész lesse esta coluna, imediatamente me incluiria na sua lista dos que só enxergam o lado ruim das coisas, pois que através da sua rádio, ele considerou a união Ricardo/Insinuante uma coisa esplendorosa, magnífica, digna do orgulho de ser baiano. Não explicou muito bem porque, mas como Mário tem tanta coisa a explicar à Bahia, isto passa a não ter qualquer importância.

Não sou um caçador de lados negativos de nada. Vejo o que está à minha volta com a necessária e possível isenção, ouço opiniões e avalio as possíveis variáveis de um fato antes de formar a minha opinião. No caso da fusão Ricardo/Insinuante, olhando especificamente pelo ângulo da propaganda, não consigo ver nada positivo. O melhor resultado que se poderá obter como decorrência disso, é tudo ficar como está. Se assim acontecer já está de bom tamanho.

Não sei como a Propeg e a ProBrasil estão posicionadas dentro do "day after" da operação empresarial, mas acredito que em ambas o alerta laranja esteja aceso. Talvez em uma delas, o alerta vermelho. Seja lá como for, não me parece que daí saia algo de bom para a propaganda baiana.

Por enquanto lidamos apenas com hipóteses, mas é certo que a nova rede terá um só comando, pois se já não existiam objetivos mercadológicos muitos diversos entre cada uma das partes, daqui pra frente é que não existirão mesmo. Claro que a nova rede tem porte suficiente para ser atendida por duas agências, porém estas deverão estar onde o chefe estiver e isto tende mais para as Alterosas que para Vitória da Conquista.

Todos nós já assistimos ao filme em que dois empresários se unem, juram abraçados diante dos flashs e microfones que embora juntos cada qual manterá a sua identidade, porém tempos depois um deles simplesmente desaparece. Estamos assistindo neste momento exatamente esta fase do filme Itaú e Unibanco, em que o primeiro está ficando um pouco mais azul enquanto o segundo começa a desaparecer. V. tem visto alguma campanha do Unibanco no ar?

Ao final de tudo, não temos provas periciais que mostrem o que ninguém viu e eu acabei por tomar todo este espaço com hipóteses. Mas não tem como fechar os ouvidos a mais um gemido da propaganda baiana. Mesmo que depois, para felicidade geral, tudo fique como está nesta nossa terra do "já tivemos".