Cultura

OBRA DO PARAIBANO JOSÉ RUFINO ABRE CALENDÁRIO DIMUS/IPAC 2010

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| 13/01/2010 às 16:39
Abeertura dia 19, 19h, no Palácio da Aclamação, centro de Salvador
Foto:

Ossos moldados em gesso e peças de mobiliário antigo compõem a obra criada pelo artista plástico paraibano José Rufino para mostra Faustus, que será inaugurada em 19 de janeiro, às 19 horas, no Palácio da Aclamação (Campo Grande, Salvador). O site especific - modalidade de instalação na qual peças são criadas para dialogar com o meio em que estão expostas - incita uma reflexão sobre memória e sobre o passado do próprio espaço.
 
A exposição é promovida pela Diretoria de Museus do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Dimus/IPAC/Secult - BA) e abre o calendário 2010 de mostras que irão propor um diálogo entre artes visuais e a arquitetura do Palácio.


"Em 2009, movimentamos o Palácio, sobretudo com eventos artísticos e culturais, além de uma exposição temporária de Cildo Meirelles, no começo do ano, do Encontro Baiano de Museus e da mostra Mudança, que relacionou dança com artes visuais.
 
Em 2010, enquanto o prédio não é inteiramente reformado, a proposta é manter o espaço com uma programação de exposições ao longo de todo o ano, com artistas contemporâneos que criem propostas de site especific", diz o diretor de Museus do IPAC Daniel Rangel.


Para o curador da exposição, o professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Marcelo Campos, a instalação se relaciona com a própria reabertura do lugar que a abriga. "Faustus sugere revitalização no sentido de trazer um público que, muitas vezes, nunca veio ao Palácio e não conhece a sua história. Ao mesmo tempo, suscita questões ligadas à memória: o que é patrimônio? O que deve ser guardado e recordado? Por que devemos preservar e lembrar?", explica.


A exposição      


A instalação Faustus é composta de móveis adquiridos em diversos lugares - reaproveitados e apropriados pelo próprio Rufino - que, de acordo com o artista, formam "uma quimera de pedaços de colunas de mesas, pernas e espaldares de cadeiras e adornos de camas assumindo condição de ossos, que se completa com imensas próteses de ossos de gesso". Na montagem, estão presentes representações do pé, mão, crânio e outras partes do esqueleto, que equivalem ao que seria um homem de 22 metros.


Inspirado nos desenhos do renascentista Leonardo da Vinci, José Rufino modelou os ossos e propôs a distribuição das peças nos salões do palácio, para revelar as próprias emoções e suscitar nos espectadores possíveis lembranças e memórias. "Em todas as minhas obras, a minha situação pessoal e as minhas lembranças estão presentes", revela. Outra inspiração é o personagem Fausto, do escritor alemão Wolfgang von Goethe, ao qual Rufino faz referência logo na denominação do trabalho. "Faustus vem de uma língua morta. A escolha do nome da exposição também passou por isso, pelo movimento de tentar aproximar o meu trabalho desse sentimento de resgate do que já se foi", esclarece.

O título, um adjetivo de origem latina (faustus), que se relaciona com ostentação, luxo e magnificência, remete à suntuosidade do Palácio da Aclamação. Ao mesmo tempo, faz referência à figura do Fausto, por diversas vezes retratada na literatura europeia."Fausto é o personagem angustiado de Goethe e de Fernando Pessoa. Através dele, estes escritores discutiram processos de crise, reflexão e produção. No caso de Rufino, o contato com o Palácio, um lugar carregado de memórias, gerou essa inquietação, que, posteriormente, se transformou na instalação. Isso revela, também, certo cunho filosófico do trabalho", complementa o curador, Marcelo Campos.

Aliada às características de memória e repertório pessoais, marcantes nos trabalhos de Rufino, a exposição desperta a atenção para a história do Palácio da Aclamação. O artista explica que os ossos ficarão acomodados nos salões nobres, como se tivessem acabado de ser retirado do subsolo do lugar. A carga emotiva associada ao passado confunde espaço físico e obra, de modo a causar a sensação de soma e pertencimento entre elas.

No site especific, os elementos foram organizados para transmitirem a sensação de uma descoberta. "Assim como a memória vem à tona de maneira desordenada, fragmentada, esse ser que surge exumado - alguém que, na metáfora, foi encontrado no Palácio e agrega todos os elementos de memória do ambiente - aflora aos pedaços", sintetiza Rufino. "Trazer Rufino neste momento é muito pertinente porque ele trabalha a partir da memória do local e das pessoas, criando instalações de grande potência visual que unem sua sensibilidade de artista e seus conhecimentos científicos", explica Rangel.


O artista


Paraibano de João Pessoa, José Rufino iniciou sua carreira na década de 1980. Tendo herdado do avô paterno um acervo documental - cartas e bilhetes - que conta muito da história de sua família, ele decidiu utilizar o memorial como meio de produção artística. A forte referência familiar também é expressa em seu nome. Registrado como José Augusto Costa de Almeida, ele optou por se apresentar no universo artístico com o nome do avô, José Rufino, homenageando-o.

Fora do Brasil, o artista participou de importantes exposições coletivas, a exemplo da Bienal Barro de América Roberto Guevara, na Venezuela (1998), da VI Bienal de Havana (1997), da 1ª Bienal de Arte Contemporânea do Fim do Mundo, na Argentina (2007) e na Embaixada do Brasil, em Berlim (2006). Além disso, entre as exposições individuais de destaque, está a mostra Náuseas, que teve quatro versões e foi apresentada, inclusive, em Milão, em 2009.

No Brasil, desenvolveu uma intensa trajetória nas artes visuais, expondo em diversos lugares, como o Espaço Cultural Sérgio Porto, na Galeria Vicente do Rego Monteiro, em Recife (1997), na Galeria Adriana Penteado, em São Paulo (1998), no Museu de Arte Moderna de Recife (2003) e no Museu de Arte Contemporânea, em Niterói (2004). Em Salvador, participou da mostra coletiva Saccharum, no Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM - BA), e da exposição Sertão Contemporâneo, na Caixa Cultural Salvador, ambas em 2009.

José Rufino é graduado em Geologia e tem mestrado e doutorado em Geociências pela Universidade Federal de Pernambuco. Na atualidade, é professor adjunto de Paleontologia da Universidade Federal da Paraíba.