Cultura

CADÊ O SÉCULO XXI? PORTO DA BARRA AINDA NO SÉCULO XX, POR TASSO FRANCO

vide
| 13/01/2010 às 21:01
A praia mais charmosa da Bahia, com tanque d'água pra lavar pés com regador
Foto: BJÁ

     Alguns leitores me solicitaram que escrevesse mais uma crônica sobre o Século XXI e Salvador. Então, seguem mais umas linhas para mostrar que nossos sonhos de juventude e adultos nos anos 1970/1980, de que os anos 2000 em diante seriam fantásticos, a civilização passaria por mudanças extraordinárias, por enquanto, passada essa primeira década, isso só aconteceu em parte. E, na velha Bahia cansada de guerra, ainda estamos vivendo no Século XX e veja lá.
  
    Sou frequentador da praia do Porto da Barra há quase 50 anos. Não é pouca coisa, trata-se de meio século. Ví na primeira quadra dos anos 1960 o uso dos biquinis pelas mulheres, aposentando uma boa parcela dos maiôs, e das sungas para homens, substituindo os calções. Pouca gente falava na palavra shorte. Nos anos 1970/1980, o Porto da Barra parecia que estava entrando no Século XXI, tal a liberalidade, os trajes sumaríssimos, a maconha consentida, o frescobol e assim por diante.
 
    O tempo foi passando e a praia do Porto estacionou. Aliás, piorou, tal a quantidade de lixo hoje existente. Nos anos 1980, existia a rede do Saldanha, dona Maria e Marcos vendendo cervejas numas barraquinhas mambembes e regando os pés dos clientes com regadores de plástico, queijo coalho, camarão no espeto e o aluguel de cadeiras. Pois dito; recentemente estive no Porto e eis que, tudo continua como se fossem os anos 1970/1980, ainda nem se chegou a década de 1990. 
  
    É claro que o camarada que aluga cadeiras agora é outro cidadão, mas, as cadeirinhas têm os mesmos modelitos; a rede do Saldanha ainda existe com outros clientes e Marcos continua molhando os pés dos fregueses com regadores de plástico. - Quer uma cerveja aí pai! - usa até a mesma expressão do século passado, agora com João do Camarão oferecendo petisco, outros vendedores de queijo coalho e a mesma bagunça e sujeira na escada de acesso a praia e entorno.
  
   A saída da praia para quem não tem carro é o mesmo sufoco que existia nos anos 1960/1970, agora, ainda pior, porque naquela época eram poucas linhas de ônibus que passam pela Barra, e, na atualidade, são centenas de ônibus de vários pontos da cidade. Nesse aspecto, até democratizou mais a praia, embora o que valia no passado dando conta de que a praia do Porto só era boa de segunda a sábado, pois, domingo é uma farofia, vale para hoje. 
  
   Inaginávamos, que, no Século XXI, tal como acontece na Barceloneta, poderíamos ir a praia de metrô. Nada, zero. Imaginávamos que a feijoada do Grande Hotel poderia ser servida na praia num quiosque longue, como existe no Atlântico português vianense, mas, nem feijoada existe mais. Aliás, até o leite de camelo desapareceu. Foi substituído por uma lodenta caipirosca poduzida à beira mar que, a luz de uma vigilância sanitária mínima, deveria ser proibido a sua comercializção.
 
    E se você quiser tirar a água salgada e aqueles grãozinhos de areia do bumbum com uma ducha de água potável, na saída da praia, esqueça. Vá curtindo o sal até sua casa porque o Século XXI não tem tecnologia para instalar uns míseros banheiros na praia. Fazer xixi? Na água. Coco? Na água. Você pode comprar uma garrafa plástica de água mineral que vale para matar a sede e asseio. Depois, como não há conteineres de lixo, joga-se o recipiente no chão.

   Então, meu caro leitor, minha nobre leitora, Salvador ainda não chegou ao Século XXI. Pode ser que, em alguns aspectos isso tenha acontecido. Mas, tomando-se como parâmetro a praia mais charmosa da Bahia, classificada como uma das melhores do mundo, vê-se que vivemos no Século XX. Por isso mesmo, toda vez que vou ao Porto, e faço isso toda semana, uso calcão e suspensórios.