Cultura

CRÔNICA: TAPIOQUINHA COM FRANGO GRELHADO E FOLHAS, POR TASSO FRANCO

Vide
| 21/09/2009 às 09:04
Cronista disfarçado de lagarto submetido a dieta das folhas e da tapioquinha
Foto:

   Desde que a doutora Ana Cláudia Moraes da Silva, da Clínica do Coração de Dr. Edson Nemi, advertiu-me do colesterol nas alturas e de alterações da pressão arterial durante às noites, oscilando mais do que os ônibus da Verde Mar subindo a Ladeira da Barra, estou submetido a uma rigorosa dieta, proibido de ir ao Porto Moreira, tendo ainda que engolir diariamente buferin cárdio, ramipril e tantos outros, e condicionar-se à refeições a base de tapioca com descafeinado e frango grelhado com folhas.


 Só não virei um lagarto porque, como dito, o mesmo não come tapioca, nem beijus com recheios de queijo coalhos importados da tenda de Amaral, da Santa Bárbara, além do que, à moda doutor Graciliano Bomfim, o nobre procurador de Justiça da Assembleia Legislativa, também aprendi a comer escondido no Bar de João Farjala, no Chame-Chame, ou no Yan Ping do Salvador Shopping.


   Agora me diga se o sujeito, acostumado como tal a comer cuscuz com meia dúzia de ovos pela manhã, uma carne de sol com lombada de gordura e queijos do Pepe, além de latões bramosos e vinhos de Mendoza, vai se submeter com faciliade à dupla tapioquinha com frango. Segunda, duas folhas de alface, duas rodelas de cenoura, um palmito, punhado de arroz e três chapinhas de frango. Isso no almoço. Porque no café da manhã e no jantar é uma cumbuca de tapioquinha e meia xícara de café ralo.


               Terça-feira, idem. Quarta-feira, tapioquinha à noite. Quinta-feira repete. E assim segue o ritual durante toda a semana. No domingo, a exceção com uma posta de peixe e meio latão de skol. Então, é vero, o sujeito diminui a taxa do colesterol e morre de desgosto. Doutor Graciliano que é um camarada experiente em dietas, da lua, do sol, da melancia, do vento, e coisa e tal, tem hora que manda tudo às favas e traça uns espetinhos de porco lá no João, digo não João tome obras, mas o dito Farjala do Posto Luanda.


 Quando mais eu que nasci na roça da Bola Verde, bandas da antiga Pedra, hoje, gloriosa Taofilândia, acostumado com leite in-natura das tetas das vacas mais batata doce com manteiga de Sêo Sílvio Murta e chouriços produzidos artesanalmente pela família Novais vai agüentar um repuxo dessa natureza. Não dá. Tem que haver um meio termo porque o coração tem  razões que a própria razão desconhece (dizem os poetas) e  não pode ser tratado dessa forma.  


De sorte que, num ato republicano, para citar uma norma vigente no atual governo da Bahia, coloquei democraticamente meu cardápio para ser seguido pela secretária Márcia, na porta da geladeira, com almôndegas, na segunda; cozido na terça; macarrão a alho e óleo na quarta; moqueca de vermelho rabo aberto na quinta; carne de sol na sexta, mas esta não obedeceu e instalou uma rebelião convocando seu órgão de classe, com o apoio da senhora Bião de Jesus. O que ouvi da secretária foi seguinte: - Se seguir isso aí é a morte do "home".


          Só quem saiu em minha defesa foi à senhora Antonia Leda, digníssima sogra, a qual, se encontrava em nossa residência convalescendo de uma cirurgia estética, mas, também submetida a tal dieta, porque se o dono da casa come tapioquinha com frango grelhado, em tese, como não se produzia outra coisa no fogão de Bernardino, com a tampa fechada, ela também tinha que se satisfazer com tais iguarias e até prometeu arregimentar a vizinha dona Tati Seixas, nora do escritor Adinoel Mota Mata, para fazer um protesto e derrubar a maldita dieta, inclusive prometendo levar o assunto à divulgação pública na Rádio Continental de Serrinha, do doutor Plínio Carneiro.

           

            E vocês não avaliam o choro que derramou a senhora Leda quando deixou a nossa casa neste final de semana, retornando à magnífica Serra depois de devidamente recauchutada pelo doutor Omar, não se sabendo exatamente se as lágrimas eram de alegria por ter se livrado da dieta, ou porque deixaria o genro sozinho à sanha daquelas que querem transformá-lo num lagarto. Pobre de mim, agora esverdeado e desamparado até mesmo pelo professor Graciliano, o qual, estudando a Constituição para encontrar uma saída ao subteto dos servidores públicos do Estado, não tem tempo para uma Bohemia. 


Mas, não há de ser nada. Minha revisão médica está marcada para o dia 29 e, em sendo liberado, vou agradecer aos santos beneditinos num domingo do advento do Senhor, apreciando a missa de Dom Emanuel D'Able do Amaral, e depois seguirei ao Moreira para um périplo gastronômico à base de moqueca de carne com pimenta de cheiro, e mais meia dúzia de ovos de duas gemas, adquiridos na feira do Mocambinho. É o troco que darei a esse povo que deseja me transformar num lagarto.


Depois que Dom Cappio comparou Lamarca a Jesus e o prefeito de Cafarnaum passou em primeiro lugar num concurso que ele próprio administrou estarei perdoado de quaisquer pecados, inclusive o da gula.