Cultura

PROPAGANDA NÃO SERVE PRA NADA. SÓ ATRAPALHA, POR MARCO GAVAZZA

A teoria de Al Ries se encaixa como uma luva para o próprio
| 12/08/2009 às 11:20
Olivetto: "Bobagens quando ditas em inglês parecem coisas sérias"
Foto: MG
 

Calma. A afirmativa não é minha. Quem defende esta idéia estranha é Al Ries, o guru americano do marketing, em seu  livro A Queda de Propaganda.  Segundo Ries, a propaganda perdeu sua função como ferramenta de construção de marcas e  agora só tem utilidade para mantê-las, quando já consolidadas.  Ele defende a teoria de que num cenário cada vez mais competitivo, com recursos de comunicação em que o consumidor é quem está no comando -essencialmente a internet- uma marca ou produto só obtém sucesso quando se posiciona no mercado  de forma diferenciada.  Depois é que vem a propaganda e sem nada muito criativo.


O diferencial  de marketing é que fará o sucesso e a conseqüente construção e fixação da marca ou produto. As ferramentas para que este diferencial chegue ao público consumidor resumem-se as ações de Assessoria de Imprensa, Relações Pública e Promocionais.  Nada de anúncios, outdoor ou televisão.  Tudo bobagem.


Ele propõe alguns exemplos. Um deles é  o carro-chefe de sua tese. Ries afirma que um dos produtos mais consumidos no mundo, em seu segmento, é o Windows e ninguém jamais viu  comercial ou anúncio do sistema operacional campeão de utilização.  É verdade; mas não é bem assim.


Acho o exemplo meio sem vergonha.  Algo próximo da falsidade ideológica.  Dizer que a música mais cantada no mundo todos os dias é Parabéns Pra Você também não é uma mentira; mas não é exatamente o que entendemos como liderança.  Quase ninguém escolhe o Windows. Ele vem junto com o PC e acabou.  Já o inverso ocorre. Algumas pessoas descartam o Windows trocando-o por outros sistemas operacionais, mesmo que isso não chegue a abalar o percentual de 96% de utilização da criação de Bill Gates, em computadores espalhados pelo planeta.


Ries segue  reduzindo a importância da propaganda convencional e ataca mostrando o mal que ela faz.  Ele afirma que a campanha das pilhas Energizer usando aquele coelhinho que nunca pára de tocar o tambor, popularizou o brinquedo e não as pilhas.  Relembrando que cada vez existem menos marcas novas -o que é verdade- Ries afirma que isto se dá em razão da falta de diferenciais e não do custo sideral necessário  para criá-las e sedimentá-las.  Segundo ele, o público fica com o que já está consagrado e fim de papo. A menos que surja uma coisa realmente inusitada e aí a propaganda não é necessária. Só muito depois.


Clareando: segundo a lógica Ries, um apartamento da Zezinho Empreendimentos só irá derrubar um OAS ou um Odebrecht se  tiver -por exemplo- a suíte do casal no Horto Florestal, os quartos dos garotos no Iguatemi,  a sala de jantar na Tancredo Neves, a varanda  na Vitória, a  cozinha em  Patamares e uma área de  convivência comum no Cidade Jardim. Tudo interligado via web com sistemas de teleconferência. E mais barato que a concorrência. Aí a Zezinho não precisa nem anunciar. Basta um pouco de RP e tudo vendido. Senão, estará destinada à vala comum e anônima dos milhares de corporações comerciais e empresariais que não conseguem sair do lugar nem da luta árdua e cotidiana pela sobrevivência.


Com isso Ries aposta que diante do ambiente mercadológico atual e das mudanças de comportamento do consumidor, é indiscutível a supremacia da publicity (em inglês são as menções aparente ou realmente espontâneas sobre marcas e produtos em veículos de comunicação, tendo assim o valor de notícias) sobre o advertising (em inglês é a propaganda como a vemos, com anúncios, outdoors e comerciais sabidamente pagos), sendo portanto o boca-a-boca  mais forte que um anúncio.


Além do livro, Ries anda pelo mundo afora fazendo conferencias sobre o tema e jogando água na fogueira das vaidades. Ele ataca especialmente o pessoal de Criação, acusando-os de terem criado uma espécie de Meca profissional, com seus festivais como o de Cannes ou os locais mesmo, para não perder um suposto, cultuado, decadente e inútil -para todos- glamour da propaganda. Uma declaração em uma de suas palestras foi que "o lema entre diretores de criação é ganhar prêmios é o que importa" sem qualquer preocupação com o dinheiro dos clientes.


Nisso ele não está totalmente errado, mas o certo é que por onde Ries passa é devidamente apedrejado. Com sempre, uma das críticas mais inteligentes e mordazes a Al Ries partiu do Washington Olivetto.  Ele disse: "bobagens, quando ditas em inglês, às vezes parecem coisas sérias".


Não acho que Ries esteja totalmente certo nem totalmente errado. Algumas reflexões diante do que ele fala parecem dar-lhe razão. Quando  tínhamos  90% de Fuscas entre os veículos que circulavam em nossas cidades, isso não era por conta da propaganda. Foi o posicionamento do produto. Barato, não requer manutenção, não tem radiador pra botar água toda hora, não quebra. E se quebrar qualquer um conserta.  Ries estaria correto.  Por isso o novo Fusca -New Beetle- nunca deu certo.


O Bradesco tornou-se o maior banco brasileiro em pouco tempo porque aceitava como correntistas pessoas que não conseguiam abrir uma conta bancária em lugar nenhum.  Um banco popular numa época em que talão de cheques era sinônimo de status social.  Ries novamente estaria certo.  Mas e o crescimento exponencial do Itaú que vive colado no Bradesco e até o ultrapassa em determinados índices, deve-se a que?  À propaganda. Ries então estaria errado. A galeria de exemplos é vasta.


A questão é muito ampla e na tese de Ries cabem variáveis demais para que se possa afirmar simplesmente certo ou errado.  Não acho que num espaço como este caiba tal discussão e menos ainda me considero capacitado a construir e sintetizar uma opinião relevante, seja a favor ou contra.


Abordei aqui a tese de Al Ries, suas teorias extravagantes sobre propaganda e marketing (ou melhor, propaganda x marketing) por uma outra razão.


Cada palestra de Ries custa 25 mil dólares. Este também é o custo de uma consulta-relâmpago de um dia realizada pela Ries&Ries (o segundo Ries é de Laura, filha, sócia e co-autora do livro), sua empresa de consultoria em marketing.  Como tem gente que sabe ganhar dinheiro com propaganda.  É o que realmente me espanta.