Uma frase que nunca esqueci e talvez o próprio autor nem lembre mais da autoria, pois o tempo e a quantidade imensa de informações que acumulamos acabam por fazer algumas coisas desaparecerem de nossa memória:
Na Bahia, propaganda é a arte de evitar a merda.
Ela foi criada por Fernando Barros, Presidente de Propeg e acho uma definição irretocável do nosso trabalho de publicitários, especialmente quanto ao cotidiano dos departamentos e mais especialmente ainda no contexto em que ela foi construída, quando não havia computadores, internet, e-mails ou os softwares miraculosos de hoje. O risco de alguma coisa dar errado era imenso e constante.
Apesar de todo o avanço tecnológico e do tempo, ainda hoje a frase de Barros é atual, principalmente se aplicada ao segmento dos anunciantes de varejo, quando tudo ainda é decidido em cima da hora. É preciso esperar o concorrente mover uma peça até o último segundo para em seguida fazer o próprio lance. Basta piscar o olho no momento errado e a camabox de 84,30 mensais é anunciada por 30,84.
O varejo, primeira das colunas de sustentação da propaganda baiana, é um segmento repleto de armadilhas. É só esquecermos a frase "objetos decorativos ... não fazem parte etc." e o consumidor vai querer levar o sofá, as almofadas coloridas, o quadro na parede e até mesmo a modelo que está sentada, se houver.
Além de todos os detalhes relacionados aos produtos anunciados, dos cuidados com o Código de Defesa do Consumidor e a legislação comum, o varejo ainda precisa correr atrás da criatividade, pois sendo um segmento com um volume considerável de comerciais, anúncios, encartes e outras peças, não se pode correr o risco de passar despercebido ou -pior ainda- ser confundido com um concorrente.
Ser criativo no chamado "varejão" (eletroeletrônicos, móveis, material de construção etc.) não é fácil, pois tendo que passar uma quantidade enorme de informações ao consumidor, resta à Criação apenas tema ou chamada para trabalhar e isto de forma direta, objetiva e numa linguagem quase horizontal.
A luta pela criatividade no varejo é antiga e registra esforços e fracassos monumentais. A laureada e impecável DPZ criou tempos atrás para o Peg-Pag, um casal de apresentadores, a Peggy e o Pag. Não durou seis meses. O casal era muito jovem, bonito, não criava identificação com o consumidor e pior: invadia o tempo onde deveriam estar sendo anunciadas ofertas.
Na Bahia o cenário também era assim e tivemos exemplos de grandes idéias que funcionaram por algum tempo. O Tio Corrêa, da Correa Ribeiro e o Cheque Tartaruga, do Superbox são dois deles.
Mas aconteceu no varejo uma violenta alteração em sua configuração. As maiores redes locais desapareceram e as menores não conseguiram ocupar o espaço aberto porque lojas de departamento de atuação nacional o fizeram antes.
Além disso, os supermercados tornaram-se concorrentes, abrindo espaços em suas lojas para móveis e eletrodomésticos, entrando fortes no ramo. Surgiram na esteira as pequenas lojas de bairros. Como se não bastasse, vieram as seqüências de crises financeiras nacionais, as verbas cooperadas minguaram e o custo de produção baixou quase a zero.
Praticamente voltamos à pré-história da propaganda de varejo, com quadros fixos, letreiros e imagens estáticas, tudo isso sendo movimentado de qualquer forma por um programinha na mesa de edição de vt. Ficamos assim por um longo tempo; com preços piscando no vídeo sobre fotos de guarda-roupas enquanto um locutor em off parecia narrar um páreo de corrida de cavalos.
A chegada da Ricardo Eletro à Bahia mexeu com este cenário. Estrategicamente a mudança foi feita a partir do foco das campanhas. O varejo sempre procurou vender três diferenciais: preço, prazo e qualidade. Mas os longos prazos tornaram-se acessíveis a todos, com as novas parcerias de financiamento que acabaram o quase monopólio da Fininvest. A qualidade dos produtos nivelou-se e até as commodities também se tornaram praxe. Entrega e montagem grátis por exemplo transformaram-se em padrão de atendimento.
Apostando que a esta altura o consumidor já entendia prazo e qualidade como obrigatórios, restava portanto mexer com o bolso. A Ricardo então reduziu tudo a um único diferencial: preço. Deu certo. À estratégia de focar diretamente no preço, foram aliadas uma linguagem agressiva e uma utilização intensa dos recursos de computação gráfica, em lugar dos já exaustos efeitos de mesa.
Com essas alterações no cenário da propaganda de varejo, a Ricardo precisou de pouquíssimo tempo para ocupar os primeiros lugares no segmento, dentro do comércio da Bahia. E também para -evidentemente- ser seguida pela concorrência em seu formato de anunciar. Hoje, a fórmula vem sendo adotada por diversos concorrentes, inclusive de outros setores, para incômodo -ou orgulho- da Pro Brasil, agência responsável pela conta.
Buscar diferenciações de mercado vendendo os mesmos produtos dos concorrentes é realmente muito difícil.
Esta frase agora é de Euler Brandão, Diretor da Pro Brasil, parceira da Ricardo Eletro desde o início de sua investida no varejo brasileiro. Se pensarmos um pouco, veremos que ela não é muito diferente da frase de Fernando Barros, décadas atrás.
Embora contemporânea, contêm a eterna angústia que acompanha os responsáveis por grandes contas de varejo. A necessidade de ser diferente, de cativar rápido o consumidor, saindo da mesmice e sem erros. Isto não é simples nem vai acabar tão cedo. Mas sempre existe alguém para empurrar a realidade adiante, fazendo com que todos avancem um pouco. Evitando mais uma vez, a merda.