Cultura

POSSE NA ABAP:FESTA QUE NÃO TEM EXAGERO NÃO É FESTA, POR MARCO GAVAZZA

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| 22/07/2009 às 10:24
Os sonhos e o otimismo exagerado do mercado publicitário na Bahia
Foto: MG

A posse da nova Diretoria da ABAP-Bahia, como não poderia deixar de ser, foi pontuada por discursos otimistas, carregados de esperanças e também de promessas.  Isso é bom, pois o setor anda precisando realmente elevar o astral. Algumas coisas entretanto soaram um pouco fora de prumo diante da realidade. 


Uma delas foi a afirmativa de Luiz Lara, presidente da ABAP Nacional, de que o mercado publicitário -brasileiro- vai fechar 2009  com um crescimento de 7%.  Os diversos institutos que medem esses índices de crescimento setoriais bateram no mesmo número em relação ao crescimento da propaganda (verificado e não o previsto)  no primeiro trimestre de 2009: 3,9%.  O segundo trimestre que ainda está sendo calculado, deve apresentar um índice semelhante, pois se o carro-chefe do período, o Dia das Mães, registrou investimentos bem menos significativos que em 2008; as revendas de automóveis compensaram aumentando a presença por conta da isenção de IPI. Isso deve deixar o crescimento do 1º semestre de 2009 em torno de 3,5%. 


Para chegar aos 7% antevistos por Lara, a propaganda brasileira precisará crescer no 2º semestre 10,5%  o que somente acontecerá se as verbas públicas municipais, estaduais e federais forem gastas até o último centavo, o que não é muito provável. 


Como aqui na nossa Bahia ainda não existe sequer resultado oficial da concorrência do Governo do Estado; o mercado imobiliário deu uma segurada em seus lançamentos para baixar o estoque da última temporada e no varejo até as revendas de automóveis pararam de anunciar a isenção de IPI pois não tem automóveis para entregar; podemos nos considerar desde já fora destes 7% vislumbrados por Lara.  Basta conversar com alguns empresários do setor para ver que estamos longe disso.


Outro arroubo de otimismo veio da parte de Sidônio Palmeira, que se despedia do seu mandato na ABAP-Bahia, ao afirmar que o setor gera 60 mil empregos.  Como se chegou a este número? A própria ABAP-Bahia registra apenas 18 agências associadas, incluindo-se aí -e ainda- a Eurofort, que hoje opera no Rio de Janeiro não tendo sequer representante em Salvador e a Link, que concentrou seu pessoal em Brasília, mantendo aqui quase somente a parte administrativa. 


Como as agências registradas na ABAP são as maiores em estrutura e recursos humanos, temos portanto 16,5  agências grandes  operando em Salvador.  Sendo generosos e colocando uma média de 60 profissionais por agência (a maioria possui bem menos, mas deixemos assim)  não chegamos a mil empregos.  Vamos arredondar para mil. Onde estarão os outros 59 mil cargos? 


Tudo bem. Vamos incluir na conta de Sidônio as agências não registradas na ABAP e que podem chegar a duas centenas.  Como a maioria destas é formada por  uma ou duas pessoas, vamos novamente ser generosos e  considerar uma média de 5 profissionais por agência. São mais mil empregos. Faltam 58 mil. 


Podemos colocar nesta conta os profissionais que trabalham em pequenas agências do Interior, em clientes, em veículos, em fornecedores, em escolas de propaganda, em carros de som, os temporários em esquinas distribuindo panfletos, os estagiários, os freelancers, seus parentes e amigos que ainda assim não chegamos sequer a vinte mil empregos.  É uma pena, mas este exercício aqui realizado está mais próximo da realidade que o número discursivo.


Finalmente, coube também ao próprio Sidônio afirmar que "o profissionalismo do setor, proporcionado pelos cursos de publicidade, está aumentando de forma rápida".  


Desculpem, mas quem sai dos cursos de publicidade -não questiono sequer a qualidade destes-  pela lógica se profissionaliza nas agências de publicidade e não o inverso.  Sempre achei que fosse assim e posso agora estar enganado,  mas lido com estudantes de publicidade e propaganda há bastante tempo, desde o famoso Vestibular Para Estágio realizado pela Pejota por volta de 1996 e que contou com mais de 300 candidatos.  Até hoje converso com eles e sua principal queixa é que ao por os pés numa agência de propaganda pela primeira vez, encontram uma realidade completamente diferente do que aprenderam em suas aulas.   E é nelas que eles aprendem a profissão.


Não vejo qualquer possibilidade dos cursos de publicidade serem responsáveis pelo profissionalismo do setor. Exceto se na contramão da história e dos mais recentes acontecimentos, passarmos a considerar diploma em propaganda como sinônimo de criatividade, qualificação e profissionalismo.  O que por sua vez, comprometeria grande parte dos empresários de propaganda do mercado, que não possuem uma formação acadêmica e sim autodidata.  


Na verdade este profissionalismo existente, por pouco que seja, é o resultado de esforços gigantescos de alguns empresários da propaganda e por necessidade absoluta dos próprios profissionais diante da nova realidade  globalizada e informatizada.  Quem não for múltiplo, propositivo, disponível full time e  extremamente profissional, está fora. No mundo todo, em todas as áreas.


Como os discursos e a festa não foram acontecimentos públicos, me achei na obrigação de tecer estas considerações tendo como objetivo esclarecer quem não estava lá mas ouviu falar estas coisas; de que festa é assim mesmo.


A maioria dos excessos fica por conta do momento, do entusiasmo, da esperança de que tudo aquilo que alí é proclamado se realize, embora certas coisas, precisem ser corrigidas depois que a orquestra guarda os instrumentos e os convidados se despedem no estacionamento.


Melhor que estragar a festa.