Cultura

NINGUÉM MAIS EMBRULHA PEIXE COM JORNAL, POR MARCO GAVAZZA

Marco Gavazza é publicitário e comentarista deste site
| 15/07/2009 às 08:01
O papel dos midias na Bahia diante dos novos meios de comunicação
Foto: Ilustração
 

Houve um tempo em que ser mídia numa agência de propaganda em Salvador era a coisa mais fácil do mundo. Bastava saber usar uma calculadora. A programação dos veículos era quase automática: jornal A Tarde, TV Aratu (na época Rede Globo), Rádio Sociedade e estávamos conversados. Quando a verba era generosa, colava-se alguns outdoors na Av. de Contorno e ficava beleza pura, como se dizia na época. Cobertura total para qualquer produto ou serviço e palmas para o mídia.


Mas os tempos mudaram. A propaganda ficou muito mais cara, a cidade cresceu e desmembrou-se em células, o mercado foi segmentado e a concorrência acirrou-se. Surgiram formatos específicos de consumo, nichos determinados de consumidores e dezenas de mídias novas, no início chamadas de "alternativas". Hoje elas são mídias mesmo, com sua eficiência comprovada como ferramentas principais para inúmeras ações de comunicação.


A propaganda mudou e muito. O que menos se encontra hoje em uma banca de jornal, são jornais. Em mídia, a calculadora sozinha já não resolve o problema nem é mais possível usar bala de canhão pra matar passarinho.


Querem ver? A tiragem média do jornal A Tarde -de maior circulação em Salvador e na Bahia- de 2ª a sábado é de 40 mil exemplares/dia.  O Correio e a Tribuna -juntos- tiram em torno 12 mil exemplares/dia. Fazendo as contas de um encalhe em torno de 10%  e uma média de 4 leitores por exemplares, chegamos ao resultado que interessa: um público em torno de 160 mil leitores/dia de jornais no estado. 


Na internet, os sites e blogs de notícias -ou portais e webjornais, como queiram- tipo Bahia Já, Bahia Notícias, Notícia Capital, Política Livre e Ibahia  chegam facilmente a 200 mil pageviews (leitores) por dia. Se incluirmos aí as versões na web dos próprios jornais impressos, o número ultrapassa os 300 mil pageviews (leitores) dia.  Isso auditado e com mais segurança que os meios impressos, pois cada acesso é registrado eletronicamente, por institutos como o Locaweb e outros de credibilidade nacional.  Mede-se até quanto tempo o leitor fica no site.


Se considerarmos que o custo de um anúncio (página) de jornal impresso pode chegar  aos 60 mil reais por dia de veiculação e que um banner  grande em um webjornal (com movimento, interação, som e link para onde o anunciante desejar)  custa em média 8 mil reais por mês, fica fácil entender porque a internet teve o maior crescimento entre todos os meios no bolo de investimento publicitário, aumentando 30% de participação de 2008 para 2009 (primeiro trimestre) enquanto os jornais impressos amargam uma queda de 16%  no mesmo período.  (Dados da revista Meio&Mensagem).


Entretanto -com certeza- esse crescimento registrado pela M&M não tem como referência a Bahia. Curiosamente, a opção internet é uma das últimas coisas que passa na cabeça dos mídias das nossas agências de propaganda quando montam um plano de divulgação para apresentar aos seus clientes. 


Digo curiosamente porque os profissionais de mídia são os mais organizados e atuantes no nosso mercado. O Grupo de Mídia funciona, os congressos de estratégias de mídia são sempre um sucesso de público. Mas quando eles sentam diante das planilhas eletrônicas, parece que mergulham no passado.  E tome-lhe televisão, jornal e outdoor para qualquer produto.  Sem falar naqueles terríveis cadernos regionais das revistas semanais,  um bloco de páginas de anúncios, geralmente em papel diferente, grampeado no meio da revista e que o leitor passa de uma vez só.  Ou arranca e joga fora.


Nossos mídias sabem disso tudo e estão muito mais bem informados que eu.  Acontece que ainda existe na terra da felicidade -além da urgência em gerar receita- aquilo que se convencionou chamar de "mídia política" quando na verdade deveria se chamar mídia "camorra" e em outros casos, mídia "filantrópica". 


No primeiro caso, anuncia-se para que o veículo não inicie uma seqüência de reportagens, matérias e denúncias contra o não-anunciante.  Paga-se para evitar a perseguição insana de algum editor carente de ética e faturamento. Nessa ordem.


No segundo caso, anuncia-se porque o dono do veículo é amigo,  já prestou alguns favores no passado, joga baba junto no mesmo clube ou até mesmo porque a mulher do anunciante adora aquele programinha das 4 da manhã que lhe ajuda a combater a insônia. 


Finalmente, como as despesas e custos internos das agências não são iguais a amantes  apaixonados, não esperam nem um minuto, a tentação de programar aquilo que gera uma comissão maior -mesmo que não seja o mais adequado ao problema do anunciante- é difícil de ser enfrentada e vencida.


Ou seja: passamos longe  do profissionalismo e enquanto isso a internet avança em passada larga, inclusive nos bairros de menor poder aquisitivo em dezenas de  lan houses. Assim, ao mesmo tempo em que a atenção do consumidor se concentra no futuro,  a verba dos anunciantes vai para os mesmos lugares que ia há 40 anos atrás e eles -acredito- nem param um pouco pra pensar.


Acho até que alguns deles -os anunciantes- inclusive seguem acreditando que o boca-a-boca ainda é um grande veículo de propaganda. Isso numa cidade com quase 3 milhões de habitantes e um considerável potencial de consumo. 


É complicado, principalmente se considerarmos que o mercado publicitário baiano é limitadíssimo e concentrado. Mas pode ser que isso continue dando certo ainda por muito tempo.  Como sabiamente disse Otávio Mangabeira: Pense num absurdo qualquer. Na Bahia há precedentes.