Cultura

O CABOCLO PEGOU NA SEXTA DE BRANCO. ATÔTÔ MEU PAI, POR CÍNTIA MELO

Cíntina Melo é jornalista
| 04/07/2009 às 14:14
O Caboclo desfila no 2 de Julho protegido pelas crenças baianas
Foto: BJÁ

Foi feriado na sexta-feira (3)? Pelo que saiba a comemoração da Independência da Bahia ocorreu dia 2 de Julho.  Mas pareceu que o feriado da data também vale para o dia 3. Será que é pelo fato de os caboclos estarem no Campo Grande até domingo (5)?


Indagações à parte, o dia 3 foi apenas mais um de desrespeito aos cidadãos, principalmente, dos que precisam dos serviços públicos. Mas vamos ao Diário da sexta-feira (3)...


Foi o primeiro dia de uma pequena férias de 10 dias. Acordei cedo, com aquele ar de "tenho o dia livre". Peguei o carro e fui ao cartório reconhecer firma de um documento. Para surpresa, afinal trata-se de uma sexta-feira comum, estava fechado. Os tabeliões do Cartório do Centro Empresarial Iguatemi resolveram emendar o feriado.


Isso me fez lembrar quantos feriados foram emendados, nos últimos meses, pela Prefeitura e Governo do Estado.  Sem contar os prejuízos e transtornos que as greves vêm causando. Ambas as instâncias agem como se atuassem na iniciativa privada para decidir que parte dos serviços públicos pode parar e os servidores devem compensam as horas não-trabalhadas estendendo sua carga horária.


Bem, sei que ao menos os órgãos federais no estado trabalharam nesta sexta-feira, como vem acontecendo com todos os feriados caídos nas quintas ou terças-feiras. Não entendo o porquê de o governador, Jaques Wagner e de o prefeito, João Henrique, se utilizarem em demasia da prerrogativa do ponto facultativo, se as esferas estaduais e municipais existem para servir ao povo e prestar serviços públicos. Pelos menos na teoria é assim.


Mas tudo bem, voltando ao diário de bordo. Como era meu primeiro dia de descanso e com o cartório fechado, então, resolvi locar um filme. Peguei a Avenida Juracy Magalhães sentido centro. O trânsito fluía normal, mas de repente, a velocidade começou a reduzir e, em segundos, os carros paparam. Reduzi a marcha rapidinha e freei parando o carro. Em um átimo de segundo, o fundo do carro fora atingido e fui arremessada para o carro à frente que, por sua vez, também acabou atingindo de leve outro veículo a sua dianteira.


Foi mais um engavetamento, em Salvador, e o primeiro acidente de trânsito em minha vida. Bom, então, encostados os veículos, esperamos horas a fio por uma viatura da Transalvador. Ligamos para diversos números: três da antiga SET e ninguém atendia, nem para avisar "estamos em greve". O 190 da Polícia também não podia lavrar a ocorrência, pois, segundo eles, estava fora de sua governabilidade, mas avisaram que a Transalvador estava operando com um contingente de 30% dos profissionais.


Um dos atingidos pelo acidente pediu para alguém buscá-lo. No caminho, este cidadão encontrou uma moto da Transalvador e o profissional se negou a fazer a ocorrência. Mandaram-nos para a sede dos Barris. O carro que eu dirigia - coitado - dianteira e traseira imprestáveis. Era o único impossibilitado de rodar. Nessas horas aflição e esperança de que a Transalvador aparecesse, trocamos telefones, tiramos fotos, anotamos placas.


Chamei o guincho da seguradora. Afinal pago o seguro para ter socorro e bom atendimento em momentos como aquele, da mesma maneira que pago os impostos exigidos pelo governo (por sinal, caros) para ter o pequeno luxo de possuir um carro: IPVA, taxas, seguro obrigatório. A legislação diz que parte desse dinheiro é para manter as vias e rodovias em bom estado. Acredite! Além disso, sai de meu salário a contribuição previdenciária, imposto de renda, sem contar, com os impostos embutidos em cada coisinha que consumimos.


Retornemos ao triste diário. Horas se passaram, deixei o carro numa autorizada e chorei bicas. Então, recebi o telefonema de um dos envolvidos na pendenga, avisando-me que havia corrido Salvador inteira, numa sexta-feira (3) - que não era feriado - e que não havia lugar nenhum para se registrar uma queixa desse tipo, apenas uma espécie de trailer da Transalvador, que funciona dentro do Detran podia acolher a ocorrência, mas o Detran/BA também havia decretado feriadão: 2 (feriado regional) e 3 (dia comum em que todos deram aquela enforcada).


É claro que servidor público não age só. Ordens superiores de quem elegemos para cuidar e zelar pelo bem estar dos cidadãos decide isso. Aliás, essas criaturas estão entregando Salvador às baratas, pernilongos, dengue, ao desrespeito, a imoralidade, entre tantos adjetivos e bichos que cabem aqui. Porém, a rixa política Prefeitura/Estado e as fofoquinhas de bastidores para decidir o "bode" que vencerá as próximas eleições e estará na Governadoria não para. Para isso, não tem ponto facultativo, nem enforcamento.


Desabafo à parte, este é apenas o diário de um dia sem muita sorte em que precisei dos serviços públicos. Só consigo imaginar o sufoco dos menos desprotegidos, dos que precisam da saúde pública, educação, segurança, iluminação, transporte público (aliás, vou precisar por no mínimo um mês). Após a enxurrada dos corações amarelos por Salvador (marketing desavergonhado, deixa isso para outro desabafo), é só assistir a TV e tome propaganda... "Tome obra, e tome obra e tome obra". Não sei onde, pois as imagens, há meses, são as mesmas...


Finalizando, é uma falta de tudo, menos de vergonha... A nós, baianos de fé, de forma conotativa, sem distinção de religião, só nos resta mesmo "rezar no pé dos caboclos", como ensina a tradição e nosso belo baianês...