Cultura

PUBLICITÁRIO GERALDÃO, QUEM DIRIA, VIROU PRAÇA - POR MARCO GAVAZZA.

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| 25/03/2009 às 14:45
Convite de inauguração da praça Geraldo Walter, no Rio Vermelho
Foto: Foto: Reprodução
   Pela primeira vez na história de nossa cidade e creio que da maioria delas pelo mundo afora, teremos a inauguração de  uma praça pública em homenagem a um -vejam só - publicitário. É a Praça Geraldo Walter, que será entregue a Salvador às 10 da manhã deste dia 28, data também de aniversário do homenageado.


     Na verdade a urbanização do espaço na Rua Almirante Barroso, no Rio Vermelho e sua transformação numa pequena praça, é resultado muito maior do esforço de seus amigos e da grana da própria propaganda que do poder público. Este se limitou a pouco mais que aprovar a designação do "logradouro"  como eles chamam os espaços públicos e já foi bom demais. Sem isso não tinha praça alguma, com ou sem dinheiro.


    Um grupo liderado por Cláudio Barreto e que envolve Sydney Rezende e Nizan Guanaes entre outros, tomou a si a tarefa de transformar a área lateral ao nº 64 da Almirante Barroso numa praça e dar-lhe o nome de Geraldo  Walter.  Nesta casa de nº 64, da ladeira que sai da Rua da Paciência e sobe até a Cardeal da Silva, aconteceu boa parte da história da propaganda baiana. Lá funcionaram a D&E, a CBVR, a Eurofort, a produtora Santo Guerreiro; funciona a Brasil Itália do nosso bravo Rasputin, a Graal Publicidade e outras empresas da área. 


    Por conta disso e como não poderia deixar de ser, surgiram no entorno diversos bares, como o Luz de Velas, o Vagão, o Bar da Esquina, o Sujinho e outros menos cotados mas igualmente prestigiados e altamente freqüentados.  Isso porque naquele nº 64, não importa qual razão social ele estivesse abrigando no momento, trabalhava-se a qualquer hora do dia ou noite em qualquer dia da semana. Outros publicitários de hábitos noturnos, findas suas rondas pelos bares da cidade e quando mais nada estava aberto, corriam para a Almirante Barroso, onde certamente encontrariam alguém,  o que comer, o que beber e o que mais lhe interessasse.


    Daquele endereço surgiram, passaram ou saíram grandes nomes da propaganda baiana. Sérgio Amado saiu para tornar-se Presidente da Ogilvy Internacional na América Latina. Vera Rocha se transformou em empresária e líder de classe, comandando hoje a Rocha Comunicação e o Sinapro. Cláudio Barreto criou a Eurofort que hoje é Eurofort Leblon, operando com sucesso no Rio de Janeiro. Sydney Rezende presidiu a ABAP e hoje é dirigente de diversas entidades comunitárias e presença ativa na comunicação governamental. 


    Tem mais. Rosenildo Franco veio do Pará, ficou por ali e criou a sua Factory antes de se render à saudade e voltar para Belém. Sérgio Guerra começou por lá como produtor gráfico e tornou-se dono da Link e autoridade em Angola. Waldir Pires entrou como candidato, saiu como Governador da Bahia e primeiro demolidor do carlismo. É verdade que depois, bem, esse depois já passou. O poeta paraense Age de Carvalho fez dali escala para a Alemanha onde dirige uma revista especializada em arte. Mauro Almeida criou em São Paulo uma bem sucedida empresa de telemarketing;  Zéroberto Berni tornou-se assessor dos mais importantes políticos brasileiros tendo trabalhado para eleição de FHC, entre outros.
 
    João Silva criou a Maria e está aí no mercado disputando espaço com as grandes agências. Vicente Cecim, Césio Oliveira,  Walter Passos, Soniamara Garcia, Marcio Nogueira, Jefferson, Marcelinho Simões, enfim, existe uma enorme lista de nomes memoráveis da propaganda baiana que viveu aquele endereço e que sempre estará incompleta, por melhor que funcione a nossa memória.


    É evidente que com esta entourage dali saíram campanhas magníficas, como a dos 25 anos do Jornal da Bahia, onde a cada dia um anúncio de página inteira resumia notícias de um ano desde a sua fundação. Uma campanha que esgotava diariamente edições do jornal, se transformou em trabalho didático em algumas universidades e chegou a ter cada anúncio lido no ar, diariamente, por uma rádio local. Ganhou todos os prêmios de que participou naquele ano.


   A campanha eleitoral de Waldir Pires, além de ajudá-lo a derrotar Josaphat Marinho, candidato de ACM, com um milhão de votos de diferença, entrou para história ganhando o prêmio Colunista Nacional como Campanha do Ano, deixando em segundo e terceiro lugares Kodak e Coca Cola.  Mais tarde ganhou o Prêmio Colunistas Melhores da Década na categoria Campanha Política.


   Naquele endereço aconteceram também as mais engraçadas, curiosas e surpreendentes histórias do folclore publicitário baiano.  Como Sérgio Amado saindo furioso de seu improvisado esconderijo embaixo da própria mesa, onde Sydney tentava acalmar um cobrador, para contestar o valor alegado pelo incrédulo visitante. Ou a carta enviada pela Diretoria do cliente Antarctica estranhando a proibição do uso do seu produto pelos funcionários da casa, depois que chegou até ela a denúncia de que Sérgio Amado havia baixado este decreto. O que a denúncia não informava à Antarctica é que este consumo era feito durante o expediente.


    Foi uma época de imensa criatividade, liberdade e individualidade na propaganda da Bahia, com sucessivas levas de profissionais extremamente criativos e responsáveis, por mais impossível que isso possa parecer. Um tempo em que a propaganda era mais espontânea, mais irrequieta, mais lúdica e mais vendedora. Primeiro sem, depois com computadores, notebooks,  photoshops,  googles, mas sempre com uma vontade imensa de fazermos todos, mais do que nos era solicitado.  No meio do duelo entre DM9 e Propeg para ver quem criava campanhas mais espetaculares e ganhava mais prêmios, entrou a D&E e o que se seguiu a ela, disputando de igual pra igual os mesmos títulos.


   Geraldo Walter ou Geraldão, como seus 2,10 m de altura e 150 kg o batizaram definitivamente e que agora dá nome à praça, esteve o tempo todo no centro de tudo isso que deu pra lembrar neste pequeno espaço. Ele era o elemento catalisador e difusor da energia positiva que contagiava a todos no nº 64 da Almirante Barroso, fosse para trabalhar ou para mostrar que tudo na vida valia a pena. Mesmo que aos berros. Ele simplesmente era tudo isso que aconteceu, concentrado em seu enorme corpo e imenso coração.


   Morreu jovem demais. Morreu quando não era hora de morrer. Mas deu vida a todas essas coisas que hoje podem ser relembradas com imensa saudade por tanta gente, entre sorrisos, gargalhadas, lágrimas, tragadas, goles de cervejas e uísque ou gigantescas colheradas de sorvete, sua maior paixão depois da própria vida.