Cultura

O 25 DE JUNHO E A INDEPENDÊNCIA DA BAHIA, COMENTÁRIO DE TASSO FRANCO

Tasso Franco é editor deste site
| 23/06/2008 às 11:01
Os cronistas e historiadores mais abalizados atestam que a vitória do 2 de julho de 1823, data que se comemora a Independência da Bahia, foi sobretudo uma vitória dos proprietários de terras do Recôncavo. Mas, evidente que houve a reunião de um conjunto de forças, embaladas pelo sentimento nativista, com o apoio do príncipe regente Dom Pedro, depois imperador Dom Pedro I, a partir de 7 de setembro de 1822, para que a Bahia
se integrasse ao novo Império nascente, desmembrado da Corte de Lisboa.

Com justo sentimento cívico, o governador Jaques Wagner, instalará o governo na cidade de Cachoeira, neste 25 de junho, data simbólica daquela comunidade quando se comemora o 25 de junho de 1822, momento em que a Câmara cachoeirana declara Dom Pedro como regente e se insurge contra o chefe da Junta de Governo da Bahia, brigadeiro Inácio Luis Madeira de Melo, empossado que fora em janeiro de 1882, depois de revoltas na cidade do Salvador.

Os episódios inicias no que se configuraria com a “Guerra da Independência da Bahia” (a rigor não houve uma guerra e sim conflitos, pequenas e médias batalhas localizadas e arruaças) se iniciaram a partir da decisão de Dom Pedro em permanecer no Brasil (dia do Fico, 9 de janeiro de 1822) e, logo depois, em 31 de janeiro de 1882, quando é eleita a Nova Junta de Governo da Bahia, composta por Francisco Vicente Viana, presidente; e Francisco Elesbão Pires de Carvalho e Albuquerque, secretário (de tradicionalíssimas famílias dos engenhos do Recôncavo).

Em 11 de fevereiro de 1822 o navio português Danúbio aportou em Salvador trazendo a notícia de que o governo de Lisboa nomeara governador das armas o brigadeiro Madeira de Melo, notícia confirmada através de Carta Régia. A intenção de Dom João VI era, portanto, manter a supremacia política sobre o Brasil, embora, seu filho e príncipe regente, Dom Pedro, influenciado pela esposa princesa Leopoldina e pelos movimentos constitucionalistas brasis, já estivesse com a cabeça feita no Brasil.

Dom Pedro então mandou expulsar a Divisão Auxiliadora, comandada pelo general português Jorge de Avilez, que o tentara fazer cumprir a ordem de regressar a Lisboa. Em Salvador, o brigadeiro Madeira de Melo temendo que viesse acontecer o mesmo com ele, reuniu o Conselho Militar dos Corpos de 1ª e 2ª linha, recebeu o apoio do comandante da Brigada de Cavalaria e da Legião Constitucional Lusitana (todos portugueses) e foi pro pau contra os nativistas apoiados pelo 1º Regimento de Infantaria, Artilharia e Legião de Caçadores.

A batalha se deu no centro de Salvador entre o Forte de São Pedro e o Campo da Pólvora e Madeira foi o vencedor. O ponto alto das lutas foi a tomada do Forte de São Pedro quando o brigadeiro Manuel Pedro de Freitas Guimarães (comandante nativista) foi dominado, preso e enviado para Lisboa no navio Gaulter. Estima-se que morreram 100 combatentes nessa refrega, 60 do lado brasileiro e 40 do lado português. Veja que, hoje, em dois fins de semana morrem mais de 100 em homicídios na RMS.

Nesse embate, combatentes portugueses (alguns embriagados) perseguem brasileiros que escaparam do Quartel da Mouraria para as roças dos Barris e do Tororó, invadem o Convento da Lapa e matam a golpes de baioneta, a sóror Joana Angélica e abatem com coronhadas o capelão Daniel da Silva Lisboa. Joana Angélica, a qual, nada tinha a
ver com as lutas, passa a integrar, por acaso, como primeira heroína do panteão da independência. Justo se diga que foi uma morte, mas, casual.

Essas lutas iniciais em Salvador levaram os combatentes brasileiros que se evadiram e uma parcela da população civil (caixeiros e comerciantes apoiaram Madeira) para ocuparem as terras dos Bulcões e Pires de Albuquerque, nas cercanias de Salvador e Recôncavo. Dom Pedro, como se sabe, se proclama imperador em 7 de setembro de 1882, depois, portanto do 25 de junho de Cachoeira.

Sobre os episódios em Cachoeira, os historiadores não atestam que tenham ocorrido mortes, nem lutas. A escuna que Madeira de Melo enviou a cidade para bombardeá-la não teria feito estragos porque os tiros não atingiram o alvo. Além disso, o comando da junta de Cachoeira estava localizado em Belém, no altiplano. Agora, do ponto de vista emblemático foi um fato importante na medida em que, se difundiu a “insurreição” por outras localidades
do Recôncavo.

Mas, a rigor, não houve guerra propriamente dita, nem em Cachoeira; nem no Recôncavo. Com o passar dos meses, Salvador foi sitiada por cinco Brigadas do Exército Pacificador (Pirajá, Itapuã, Engenho Novo, São Tomé da Costa, Maré e Boca do Rio), as tropas de Madeira ficaram comida, graças ao cerco naval do almirante Lord Crochane. Na madrugada de 2 de Julho, “in silencio noctis” Madeira embarcou suas tropas nos vasos de guerra e
em grandes navios mercantes e zarpou para Lisboa.

A verdade é que, salvo algumas “pequenas e médias batalhas” como aconteceu em Pirajá, as lutas pela Independência obedeceram mais a uma estratégia de cerco, quer porque a esquadra de Crochane não tinha poder de fogo para atacar a esquadra portuguesa e ficou ao lardo no Morro de São Paulo; quer porque o Exército Pacificador temia as forças mais treinadas e armadas da Divisão Lusitana. Venceu-se mais pelo cansaço. Se Madeira tivesse resistido aí sim, poderia ter acontecido o pior.

De forma que, de maneira tal, trata-se de uma história que precisa ser recontada com as lentes mais próximas da realidade e não com esse ufanismo cívico exagerado dos baianos. Tanto que, na historiografia nacional, não existem referências da Independência da Bahia como relevantes a História do Brasil e a consolidação do Império (1822/1889).