Walmir Rosário
16/04/2023 às 10:24
Confesso que me divirto bastante com os meandros da política de Itabuna. Diferente de outras cidades, ela é viva, presente nas esquinas, nos café, bares, becos, escritórios, repartições públicas, enfim, em todos os locais onde se juntam eleitores e pré-candidatos. Nesses locais são discutuidas desde as ruas esburacadas, as constantes falta de água, o cumprimento ou não das promessas dos prefeitos e o comportamento dos vereadores.
Um desses lugares é o tradicional Café Pomar, por anos a fio sob o comando da família Mariano, que se aposentou, embora os clientes continuam fiéis aos novos proprietários. À disposição dos clientes, um chá mate especial, doces, salgados e um cafezinho de fazer inveja aos concorrentes. Não só pela qualidade do pó, da água, do modus operandi, ou de quem gentilmente o serve, e sim por uma turma que o bebe pela manhã e à tarde.
Na verdade, alguns deles nem mesmo têm o hábito de tomar café, e sim encontrar seus pares da tradicional conversa política. Não é de hoje que o Café Pomar é conhecido como o “Senadinho”. Esse nome foi dado há décadas, quando ainda a Câmara de Vereadores era localizada no centro da cidade (praças Olinto Leone e José Bastos) e frequentado por alguns vereadores e políticos.
Pelas minha lembranças, um outro bar e lanchonete era o local preferido do políticos: o Avenida, de Olímpio, ponto de encontro de prefeitos, vereadores, cacauicultores, profissionais liberais e quem mais gostasse de política e futebol. O prefeito José de Almeida Alcântara era um frequentador habitué e passava pelo Avenida várias vezes ao por dia, nem que seja para cumprimentar os amigos.
E José de Almeida Alcântara sempre foi um político nato, populista como só ele sabia ser para ganhar as eleições de prefeito ou deputado. Pois um dia Alcântara se encontrava engraxando os sapatos em frente ao Avenida, rodeado por amigos e correligionários, quando um popular se apresentou e pediu uma ajuda financeira. Imediatamente, Alcântara mostrou os bolsos vazios e disse que a única coisa que tinha eram os sapatos.
O popular retrucou que estava precisando e o político os tira dos seus pés, entrega ao pedinte, e vai embora calçado em meias brancas. Pois bem, Alcântara morreu em seu segundo mandato, mas elegeu seu parente Fernando Cordier. Ainda hoje é lembrado pelos antigos eleitores e colaboradores, um deles, seu chefe de Gabinete, Paulo Lima, ou Paulo Índio, jornalista, grande tribuno e um dos líderes das conversas políticas do Café Pomar.
Todos os dias, os jornalistas Paulo Lima e Joselito Reis, entre outros confrades, recebem no Senadinho candidatos a candidatos de todos os matizes para conversas sobre Itabuna e as influências políticas. Por ser um local eminentemente democrático, a frequência muda constantemente, que até temos que lembrar a frase da “raposa política” Magalhães Pinto: “A política é como as nuvens, você olha está de um jeito. Olha de novo e já mudou”.
A cada convidado ou cliente que chega, o cardápio é a política nacional, estadual e municipal, esta em alto escala. Alguns deles se apresentam como candidatos a candidato ao executivo ou legislativo e mostram uma prévia do plano de governo. Encerrado o expediente, uma foto é feita num celular e imediatamente distribuída pelas redes sociais, dando visibilidade ao pretenso futuro prefeito ou vereador.
Um dia desse recebi a foto com uma pequena nota com a presença do empresário, cacauicultor e arquiteto Ronald Kalid, o médico Ronaldo Neto, o ex-prefeito de Barro Preto, Sérgio Costa, o aposentado José Verdinho, o advogado Rui Correa, Paulo Lima, dentre outros. Me chamou a atenção Ronald Kalid, tido como o mais capaz secretário de Viação e Obras de Itabuna, um dos responsáveis pela modernização da cidade.
Em 1998, apesar dos esforços para ser o candidato do prefeito Ubaldo Dantas, Ronald declinou do convite, o que equivale a deixar passar o cavalo selado. Em outras eleições, encontrou dificuldades em homologar sua candidatura a prefeito pelo PSDB, partido que se perdeu no tempo e no espaço da política nacional, estadual e municipal. Em Itabuna não conseguiu eleger um prefeito e pouquissimos vereadores.
Dentre as dificuldades encontradas por Ronald Kalid junto aos partidos, estava seu comportamento sisudo, sem a disposição de dialogar com eleitor por meio de artifícios como os tapinhas nas costas e as promessas feitas para não serem cumpridas. Ronald acreditava que o diálogo com o eleitor deveria ser diferente, baseadas na construção de plano de governo bem estruturado e com perfeitas condições de executá-lo.
E aí é que estava – e está – seu maior erro na velha e atual política de tirar vantagem em tudo, principalmente a econômica. Ainda consigo recordar as reclamações dos políticos do PSDB contra uma possível candidatura de Ronald Kalid a prefeito de Itabuna: “Ora, como é que vamos ganhar com um candidato que sequer cumprimenta um eleitor enquanto está caminhando no calçadão da beira-rio?”.
O PSDB perdeu sem Ronald Kalid, que por sua vez não aceitou ser secretário de Obras de outro qualquer prefeito de Itabuna.
Acho muito simpático o modo do pessoal do Senadinho fazer política, que embora improdutiva, incentiva e promove candidatos a candidatos. E o motivo é somente um: hoje as candidaturas não são mais decididas em redutos como o Café Pomar, mas em Salvador e Brasília, nas reuniões sigilosas em gabinetes da Assembleia Legislativa, Congresso Nacional e sedes de Executivos. Mas a política do Senadinho jamais perderá seu charme.