Valdomiro Silva
07/06/2021 às 18:06
Tornar-se jogador profissional de futebol. Este era o sonho dos cinco filhos homens de Ribeirinho e sua esposa Brígida. O mais velho, José Ribeiro, fez teste e foi aprovado para os juniores do Vitória, mas por falta de alojamento em Salvador, retornou a Serrinha; autor desta reportagem e segundo em faixa etária da família, atuei na divisão de base do Fluminense, tradicional time de Feira de Santana, onde vivo desde então. Lesionado gravemente no joelho, encerrei precocemente minha trajetória; Geovany esteve no mesmo clube, foi negociado ao Matsubara, do Paraná, mas, ainda muito jovem, não suportou a distância da família foi mais um que parou no meio do caminho e voltou para a "Serra".
Acometido de febre reumática ainda adolescente, Gildo, o quarto filho do violeiro e radialista, sofreu uma cirurgia na coxa que o impediu de fazer a mesma tentativa dos irmãos mais velhos. Gildeone, ou simplesmente Gil como é hoje mais conhecido, protagonista desta reportagem e o mais novo do grupo, até que teve uma oportunidade, mas seu desafio foi bem mais difícil que o dos demais. Não integrou divisão de base e, testado diretamente no elenco profissional do Flu de Feira, mesmo sendo um craque, não foi bem observado. É o que acontece muito no futebol, um esporte onde nem sempre os melhores são aproveitados. Mais pesam outros valores que o talento do candidato.
José Ribeiro tornou-se radialista de sucesso, eu também enveredei pela comunicação; Geovany apostou na educação física e foi um dos pioneiros das academias de musculação em Serrinha, hoje especializado em fortalecimento de joelho; Gildo é um guitarrista profissional que tocou para bandas como Caciques do Nordeste mas anda afastado da música e atualmente é consultor de apostas esportivas; Gil seguiu os passos de Geovany e faz destacado trabalho, no momento, com mulheres que buscam melhorar a saúde do corpo, além de torná-lo mais bonito, esteticamente falando. E ainda há Gisele, a caçula, que também era boa de bola, mas formou-se pedagoga.
Há 17 anos credenciado pelo Conselho Regional de Educação Física da Bahia (CREF), o personal Gil diz que deve ao irmão, Geovany, o ingresso na carreira. Aos pais, dedica os êxitos obtidos e agradece por "todo o apoio, desde o início". Corpo mais "sarado" e bem definido, claro, é um motivador das mulheres que buscam o seu trabalho personalizado. Mas ele faz questão de esclarecer que a estética não é, nem deve, ser considerada a principal finalidade do esforço. É fundamental saber, ele diz, antes de iniciar treinamento, que o mais importante a se atingir não é exatamente a beleza externa. Ela faz parte sim, do 'pacote' de benefícios, mas, para chegar lá, é preciso antes estar em dia com a mente. "Quanto mais saudável a cabeça, melhor será a resposta no corpo", avisa.
AUTOESTIMA, A META A SER ATINGIDA
Gil levou para a sua experiência com o condicionamento físico das mulheres a mesma categoria que desfila ainda hoje quando convidado para dar "show" nos campos de futebol. Com a classe com que faz lançamentos precisos, chutes certeiros a gol e dribles desconcertantes, ele aplica em suas alunas as noções de postura corporal, alongamentos e outros exercícios capazes de promover mudanças estéticas radicais, redução de dores localizadas, um funcionamento mais efetivo do organismo e, em consequência de tudo isso, elevar a autoestima destas mulheres, um desafio que se revela em algumas de suas alunas logo de pronto, aos primeiros dias de exercícios. "Há casos mais severos", diz. Não raro, recomenda acompanhamento terapêutico especializado.
Assim, por várias razões, nem todos que tomam a decisão de buscar esse tipo de treino para melhorar suas condições gerais de saúde alcançam a meta. A dificuldade de cumprir uma rigorosa dieta alimentar está entre as maiores causas de evasão do treinamento. É fundamental, também, manter entre 6 e 8 horas de sono. A principal razão para não atingir os resultados almejados, conforme o personal, é a falta de paciência e disciplina, que faz alguns suspenderem o trabalho, após algum tempo de prática. Algumas pessoas não conseguem desvencilhar-se do "estresse muito alto" de sua rotina familiar e de trabalho, o que faz com que não se sintam suficientemente motivadas.
Ele relata o caso de uma jovem, não faz muito tempo, que se apresentou com quadro aparente de depressão. Se encontrava muito abaixo do peso, chorava durante os treinos. Após alguns meses, melhorou sensivelmente o seu emocional e vontade para a atividade física . "Tornou-se outra pessoa, muito forte e saudável". Considera o atendimento psicológico um "complemento vital" para o sucesso do treinamento: "Especialmente nos dias que vivemos, de tamanha ansiedade e medo, a fórmula para atingir uma harmonia entre corpo e mente é a terapia, algo que sempre oriento".
O profissional respira aliviado, porém, ao informar que, cada vez, mais reduzem os casos de desistência. "Quem consegue vencer este primeiro momento de impaciência com a mudança de alguns hábitos e enfrenta o estresse, logo percebe o quanto sua vida modifica para melhor", frisa. Acostuma-se de tal forma com a rotina de treinos que não se quer perder um dia sequer: "Não se enxerga mais como um sacrifício, muito pelo contrário, passa a ser uma atividade prazerosa e companheira para sempre".
PRIMEIRO, ATACAR A DOR; ESTÉTICA VEM DEPOIS
A faixa etária do público feminino que procura Gil para treinar é de 20 a 50 anos. A maioria das mulheres, relata, chega com dores em diversas partes do corpo. A prioridade inicial do treinamento é o tratamento específico em cada área afetada, através de exercícios localizados. "Logo (as dores) desaparecem e a aluna vê uma mudança significativa em sua qualidade de vida". Apenas depois de superada esta fase surgem os efeitos na estética, que vem a ser "uma consequência das correções na postura e no tratamento corporal".
Por trabalhar com mulheres em uma atividade em que é inevitável o contato físico, o treinamento "exige profissionalismo no nível máximo", diz Gil. "Em qualquer época é delicado, mas nos tempos que vivemos, devemos ser ainda mais atentos, prudentes e transparentes, até para evitar interpretações equivocadas". Ele afirma não acreditar que exista espaço, ao menos por longo período, para o profissional que "não tenha ética e zelo por seu nome e respeito pelo ser humano".
Mulheres em período de gravidez também podem, e devem, manter o treinamento, adaptado às suas possibilidades. "Treinei a doutora Joilma Lima (médica) e também a professora Patrícia Bastos, há pouco tempo, durante quase toda a gestação delas e o resultado foi excelente". A comunidade médica, ele lembra, indica treinamento para mulheres gestantes, salvo casos excepcionais, que requerem cuidados especiais.
Do mesmo modo, garotas portadoras de algum tipo de deficiência física podem, sim, fazer musculação. "Eu diria que não apenas podem, mas devem. As prefeituras precisam implantar políticas públicas voltadas para a atividade física e, em seus projetos, possibilitar a inclusão dessas pessoas, que muitas vezes pela falta de oportunidades, não conseguem desfrutar de uma atividade tão fundamental para o seu bem-estar".
NUTRICIONISTA E FISIOTERAPEUTA, ALIADOS DE SEMPRE
Qualquer que seja o perfil do interessado, primeiro deve fazer um teste de esforço e, evidentemente, consulta e exames médicos necessários. Uma vez com autorização médica para treinos físicos, é importante passar por nutricionista. A dieta deve ser compatível com a carga de atividade a ser prescrita. Em casos específicos, é necessário suplementação alimentar e a orientação deste profissional se torna imprescindível. Nutricionistas, ao lado dos fisioterapeutas, são "nossos eternos e grandiosos aliados" considera o preparador físico. No geral, a comunidade médica, hoje, diz Gil, "super-indica" os exercícios, incluindo a musculação, aos seus pacientes, e estão de mãos dadas com as diversas especialidades, promovendo saúde para a população.
O ritmo do treino atende ao que os instrutores chamam de "periodização", ciclos semanais que começam com uma dose menor de atividades (no início do trabalho) até o aluno atingir um percentual entre 75 e 95% de sua capacidade máxima, reduzindo depois para cerca de 50% em vista da proteção dos tendões e, sobretudo, evitar desgaste mental em virtude do esforço físico. As metas também são definidas assim, por períodos. A maioria das alunas apresenta evolução corporal e de bem-estar entre quatro e 12 semanas de trabalho, variando em razão de que cada ser humano tem condições e características físicas específicas.
Não há um limite de faixa etária para homem ou mulher submeter-se à atividade física em busca de saúde. "Pode iniciar aos 12 anos e daí em diante, quanto mais avançada a idade, melhor de se trabalhar e obter resultados", garante. O treinamento requer maturidade muscular e principalmente emocional. Seus melhores alunos costumam ser aqueles cuja idade está entre 30 e 50 anos. Ele conhece muitos casos em que a pessoa inicia a treinar a partir dos 55, "tem um resultado fantástico e começa a viver a melhor fase de sua vida até então".
Em se tratando de estética, os glúteos são o "alvo" principal das mulheres que buscam melhorar a performance corporal, informa Gil, com base em respostas de suas alunas. Na sequência, vem a "linha de cintura" como segundo maior desejo. A atividade física, conforme este profissional de sucesso no município de Serrinha, é, "sem sombra de dúvidas" o caminho através do qual muitas pessoas descobrem que são capazes de conquistar vitórias nas mais diversas áreas de sua vida. O treino disciplinado e regular, recomenda, leva a um "sentimento de otimismo, faz com que a mulher ou o homem se sinta mais capaz de buscar soluções para os problemas, de dar um tratamento mais digno a si mesmo e ter uma maior perspectiva do que está em seu redor".
LEANDRO RIBEIRO E LUIZ FERREIRA FILHO, AS REFERÊNCIAS
Gil não esconde que a sua metodologia é aplicada a partir de noções obtidas junto aos professores Leandro Ribeiro, de Maceió, e Luiz Ferreira da Silva Filho, de São Paulo. "São dois caras que possuem elevado conhecimento nesse tipo de treinamento e com os quais tenho a honra de conversar". Referências nacionais, "compartilharam comigo uma pequena mostra da capacidade deles". Também são fontes permanentes de inspiração os vídeos de Kevin Levrone, considerado um dos melhores fisiculturistas da década de 1990, e, claro, Arnold Schwarzenegger, sete vezes Mr. Olympia e cujos treinos, válidos ainda hoje, o transformaram no maior de todos os tempos.
O custo para viver a experiência de vida saudável através deste treinamento especializado varia em razão de uma série de fatores. Quem deseja fazer o trabalho em uma academia de alto padrão certamente vai pagar mais caro. Também a despesa é maior ao se "customizar" a atividade junto ao personal. Há quem queira treinar todos os dias, ou incluir o sábado, domingo, feriado, escolher horários especiais, conforme a sua necessidade. Existem, porém, formatos mais econômicos que permitem um investimento ao alcance de qualquer pessoa, com uma renda salarial apenas "razoável".
Nada impede que se consiga atingir bons resultados com o treinamento tradicional das academias, em que um instrutor atende a vários alunos. Mas, avalia Gil, quando é possível a contratação de um personal, a aplicação dos exercícios tem uma resposta mais rápida e até mesmo de melhor qualidade. "Ao trabalharmos com uma determinada aluna, a estratégia é mais bem elaborada e a chance de erros é muito baixa, uma vez que o cuidado é praticamente em tempo integral. Estudamos e avaliamos o cliente todos os dias", registra.
Lidar com a vaidade das pessoas, na atividade que Gil desenvolve, não é tarefa fácil para nenhum personal que atua neste segmento. Afinal, algumas delas, especialmente as muito jovens, são ansiosas mais por aprimorar a estética do que propriamente atingir uma boa saúde. Segundo ele, já foi mais estressante enfrentar o desejo e a pressa de suas clientes por resultados. Hoje em dia, assinala, a conscientização é bem maior, todos tem acesso às informações na internet, há pesquisadores, gente capacitada, que esclarece a este respeito. Passaram a entender que não se trata de "passe de mágica e que avançar depende muito mais delas mesmas do que de nós".
CARGA PESADA: "RESPIRO ISTO 24 HORAS POR DIA"
O sonho de Gil era ser jogador de futebol, de fato, mas acredita que não tinha força de vontade suficiente nem a disciplina (foco nos treinamentos) para chegar ao profissionalismo nessa área. Frustrada essa expectativa, no entanto, revela estar "feliz e realizado" com o que faz. "Eu amo musculação, buscar a melhora da saúde das pessoas. Respiro isso 24 horas por dia. Agradeço a Deus por ter me dado esse dom". Ele parece mesmo ser um predestinado a esta atividade, mas não se acomoda pelo fato de estar vivendo um bom momento na carreira. A sua rotina de estudos é pesada. São quatro horas por dia, principalmente à noite.
Quando não está trabalhando, dedica a maior parte do seu tempo à leitura ou participando de cursos virtuais para melhor capacitar-se em posturologia, anatomia, fisiologia do exercício e comportamento humano, alguns dos temas mais presentes na literatura a que ele se dedica. É uma área muito complexa, em que os estudos são atualizados muito rapidamente. Entre 2013 e 2018, diz o personal serrinhense, houve mais estudos científicos neste segmento da saúde do que nos últimos 100 anos. "Temos que estar muito atentos, pois todo dia surge uma novidade e precisamos estar conectados com o que acontece não apenas no Brasil, mas mundo afora", preconiza. É um investimento de tempo que lhe custa muito, mas garante, vale à pena, "afinal o aprender não para nunca".
A rotina diária de trabalho é intensa, de segunda a sexta. Seu primeiro aluno começa a treinar às 5 horas da manhã, o que significa que Gil deve acordar por volta das 4 horas. Tem compromissos até 11. Após pausa para o almoço, tudo começa de novo às 14 horas e segue até às 20. "O tempo para descanso é muito pouco, mas quando se ama o que faz, tudo vale à pena", ele diz. No entanto, planeja reduzir um pouco esta carga, pois o objetivo é apresentar-se sempre "inteiro" para as suas clientes.
TREINO EM CASA: MELHOR MANTER ORIENTAÇÃO
A pandemia de coronavirus, desde março do ano passado, impactou bastante a economia em todo o país, atingindo em cheio as academias de musculação e, consequentemente, o trabalho do personal trainer. "A queda foi violenta, no início", diz Gil. Nos últimos meses, com a liberação mediante restrições, "está melhorando muito rápido e acredito que o setor já se recuperou em pelo menos 50%". Os municípios, em princípio, suspenderam o funcionamento das academias e de atividade física em grupo, em razão da crise sanitária, o que já está liberado, com restrições e protocolos.
Não há, em seu ponto de vista, a necessidade de interromper o direito ao treinamento, devido ao risco de infecção por Covid-19, desde que os ambientes cumpram, rigorosamente, os cuidados de higienização e sejam fiscalizados quanto às normas de segurança junto ao seu público. Ele lembra que os estudos indicam uma redução de 98% na ameaça de internamento para quem pratica uma atividade física regular. A máscara e o álcool em gel passaram a ser obrigatórios, do início ao final das atividades.
Além desses produtos, a prevenção também passa por reduzir o contato físico entre aluno e instrutor, que deve sempre que possível orientar a uma certa distância, recomenda. Alerta para a necessidade de uma boa alimentação e exposição ao sol no mínimo três vezes por semana, receitas para melhorar a imunidade. Para quem decidiu abandonar a academia e o seu treinador, em razão da pandemia ou da crise econômica e passou a treinar em casa - alguns até adquiriram equipamentos - ele diz que o ideal seria, de alguma forma, manter a orientação de um profissional de educação física. Afinal, o risco de uma lesão, para quem treina sozinho, é consideravelmente mais elevado.
ROCK, FUTEBOL E O NETO HEITOR, AS DIVERSÕES
Como ninguém é de ferro, Gil separa, sim, um tempo, para ouvir música. "Sou de uma família completamente apaixonada (por música). Então em meus momentos de folga, principalmente nos fins de semana, sempre reservo um tempo para ouvir". Ele é fã do rock pesado (heavy metal), mas não radicaliza. Eclético, também curte o pop rock nacional e internacional dos anos 70 e 80. Gosta de filmes e navega pelos documentários religiosos e científicos. Aprecia o estudo dedicado a "decifrar os grandes mistérios da vida". E como não poderia deixar de ser, assiste muito futebol, que se encontra na lista de suas principais diversões, preferencialmente o seu Vitória e as grandes ligas europeias.
Afora tudo isto, e acima de tudo, encontra-se o netinho de quatro anos. Sim, Gil é avô precoce, com seus 41 anos de idade a completar em outubro próximo e atingiu um certo nível de maturidade bem antes dos outros mortais. Foi pai aos 20 anos, quando nasceu "a querida Marília", responsável por lhe presentear com o pequeno Heitor. "Meu xodó", diz ele, sobre o menino. Solteiro, assegura que não faz parte dos seus planos uma "relação séria" neste momento, quando prefere dedicar-se ao trabalho e estudos, "algo que requer muito tempo e dedicação".