O povo nas ruas e o fim do 2º milagre brasileiro

Vera Felicidade
21/06/2013 às 20:35
As crenças acomodam, mas também destroem quem nelas se posiciona.

A antítese ao marasmo, cooptação e arrendamento é o novo que acontece agora nas avenidas, praças e ruas da maior parte do Brasil.

Emerge a insatisfação diante das históricas mentiras apregoadas, manifestações com o povo nas ruas acontecem imprensadas entre festas, comemorações, gastos faraônicos das copas futebolísticas e opacas e ameaçadoras realidades caracterizadas por: transporte público caro e ruim, impostos régios, cidades insalubres e sem segurança, educação deficiente, sistema de saúde pública precário com imensos problemas logísticos e carência de profissionais, corrupção política, impunidade e justiça lenta etc.

Durante muito tempo a sociedade brasileira vem sendo sedada sob várias formas, desde o "milagre brasileiro" até a classificação de quinta economia mundial. Isto criou esperanças, sonhos e ilusões. A espera limita, cria revoltas, quebra sedações especialmente nos mais jovens, disponíveis para novas vivências, para a ação, para a antítese, principalmente quando encontram contextos onde isto pode se realizar. A mobilidade e interação proporcionada pelas novas tecnologias, pela ampliação democrática através de suas redes sociais é um espaço ainda não tragado, não engolido pelos poderes constituidos e obsoletos. As redes sociais não são vetores determinantes de mudança, são contextos onde a mudança é tecida, dialogada, constituindo-se assim em uma alavanca dinamizadora de acontecimentos e mobilizações.

Esta última semana devolveu o Brasil ao seu povo. Passeatas, protestos, silêncio, brados e ruídos significam o rompimento, a quebra dos filtros politicamente institucionalizados como negociadores do que é bom para o povo.

Ver nos estádios cartazes, "não somos contra a seleção, somos contra a corrupção", mostrou o corte cirúrgico perfeito, realizado sobre a cooptação acontecida nos anos 70 pelo "pra frente Brasil, viva a seleção". Esta cooptação era clara para poucas pessoas não alienadas, não aprisionadas (algumas mais tarde mortas pela repressão do governo de ditadura da época). Torcer pela seleção brasileira era uma maneira de fazer de conta que tudo ia bem, tanto quanto de negar os porões da ignomínia. Agora podemos torcer pela seleção brasileira, sem esconder, sem esquecer. Não precisamos de senhores, não somos mais escravos do medo, da conivência e conveniência.

O novo - povo na rua mobilizado, protestando - significa. Isto é um início, pode ter continuidade ou não. Tudo vai depender da consistência, da continuidade dos propósitos motivadores.

Nada que resulta de votação comprometida, acertos e negociações, pode ser aceito. Nenhuma bancada, grupo ou governo pode representar ou defender o que nos aliena e destrói em função de interesses pessoais ou de suas agremiações.

Incoerência e inconsistência já não mais podem ser mantidas em função do angariado por bancadas baseadas em votos numericamente decisivos, mas ilegítimos. A sociedade laica e democrática não mais aceita segmentos religiosos determinando leis, regras e comportamentos. Direitos humanos têm que ser representados por pessoas humanizadas e não por arautos, avatares demoníacos ou divinos.

A mudança decorre de um processo e quando se estabelece é o novo, pode ser abertura para sanar problemas, tanto quanto pode ser cooptada como "sangue novo", revitalizador do já despropositado, desgastado e superado.
Esta movimentação - a mobilidade do povo na rua - conseguiu descentralizar o interesse, o foco da festa. A Copa das Confederações não foi mais um divertimento para aumentar a sedação, ela transformou o projetado panem et circenses em uma arena onde o velho e o novo, o legítimo e o ilegítimo se defrontam, estruturando questionamentos criadores de uma integração entre jogadores e torcedores, por exemplo, um contexto onde antes de sermos jogadores e torcedores, somos brasileiros com lucidez, reivindicando honestidade e seriedade no fazer político.

Não somos mais o país do futuro, do carnaval nem do futebol; somos um país que se transforma, onde carnaval e futebol são apenas eventos. Riqueza e probreza, privilégios e impedimentos, políticas e negociações são questionadas.

Pela mobilização contínua que transforma!
Vera Felicidade é psicóloga gestaltista`.
http://www.psicoterapiagestaltista.blogspot.com/