REVOLTA DOS BÚZIOS E A LUTA PELA LIBERDADE

Marli Geralda Teixeira
01/09/2011 às 10:03

A Revolta dos Búzios aconteceu em Salvador no dia 12 de agosto de 1798

"Está para chegar o tempo feliz da nossa igualdade, o tempo em que todos seremos irmãos". Assim amanheceu a cidade de Salvador no dia 12 de agosto de 1798. Boletins sediciosos estavam afixados em paredes e portas de locais movimentados da cidade.


Esta foi a chamada para a liberdade que propunha, entre outras coisas, o fim do poder de Portugal, da escravidão e da desigualdade entre negros e brancos. Inspirada na Revolução Francesa, em 1792 - nos ideais: Fraternidade, Liberdade e Igualdade - a Revolta dos Búzios, Revolução dos Alfaiates, Conjuração Baiana, Inconfidência Baiana ou Sedição de 1798, como também é conhecida, marcou a história do Brasil a favor da independência.


Os habitantes da Colônia, mesmo contribuindo para a concretização dos interesses metropolitanos, continuavam a sofrer a exploração que se intensificava a cada momento, justificada pela política de monopólios e pelo papel desempenhado pelo Brasil no contexto da dominação colonial portuguesa. Essa se dava através de cobrança de impostos, restrições econômicas e limitações políticas. Via-se uma grande discriminação racial com os escravos; os libertos, quando trabalhavam, recebiam menos que os brancos cumprindo a mesma função.


Em reação, muitos jovens se organizaram para o combate. Destacam-se aí os soldados Lucas Dantas e Luiz Gonzaga das Virgens, os alfaiates João de Deus do Nascimento (mestre) e Manuel Faustino (aprendiz), além de duas ex-escravas, Ana Romana e Maria do Nascimento. Dentre os indignados com a situação também estavam artesãos, soldados, médicos, advogados, professores, sapateiros, escravos e ex-escravos, brancos e negros. Diferente da Inconfidência Mineira, que ocorreu anos antes, a Revolta na Bahia contou com a participação de diversos setores da sociedade.


A ala mais abastada da Revolta era formada por integrantes da Loja Maçônica, que se denominavam "Cavaleiros da Luz". Nos países colonizados na América, as Lojas Maçônicas foram responsáveis pelo incentivo à independência das nações europeias. Entre os integrantes desse grupo se destacavam quatro brancos intelectuais: Cipriano Barata, Aguilar Pantoja, Oliveira Borges e Moniz Barreto. Este último era professor e foi autor do Hino da Independência Baiana.


O Governo Português reagiu e a primeira manifestação desencadeou na prisão de Domingos da Silva Lisboa, mulato, escrevente, nascido em Portugal. Em sua residência foram identificados papéis e cadernos com textos manuscritos, que indicava, conforme os autos, a sua culpabilidade.


A devassa na cidade já estava instalada e no dia 22 de agosto, uma segunda leva de papéis foi distribuída. Através da comparação de grafias, as autoridades prenderam o soldado Luiz Gonzaga. No dia seguinte, os revoltos se reuniram para planejarem a libertação do soldado. Numa outra reunião, já no dia 25 de agosto, muitos adeptos compareceram, entre eles, três convidados que delataram a ação. O então governador, D. Fernando José de Portugal autorizou as buscas aos responsáveis "pela pretendida sedição".


Diversos covardes negaram a participação na preparação da revolta, inclusive sendo todos absolvidos. Em dezembro do mesmo ano, por ordem da rainha portuguesa Dona Maria I, 59 pessoas foram investigadas e até torturadas, sendo 34 processadas e apenas quatro negros sentenciados a morte pela forca, ficando clara a discriminação racial.


No dia 8 de novembro de 1799, os quatro condenados foram levados num cortejo triste pelas vias públicas de Salvador, sendo assistidos pela população local, formada em 80% por negros, que fazia silenciosa reverência aos seus heróis. Na execução, Manuel Faustino e Lucas Dantas recusaram a extrema unção oferecida por um frei franciscano desde que se arrependessem de seus pecados. Eles responderam que não tinham, ao contrário de seus acusadores e da rainha portuguesa. Próximo ao dia da execução, em seus últimos contatos com parentes, eles lamentavam a covardia da elite que não tomou parte da revolta.


Os quatro acusados foram enforcados na Praça da Piedade. Tiveram suas cabeças cortadas e demais partes do corpo espalhadas pela cidade, penduradas em varas de pau. Mas o exemplo deles foi assistido por futuros participantes de novas insurreições baianas. Inclusive aqueles que tiveram papel fundamental na Revolta dos Malês, em 1835.


**Com informações de: Mídia Periférica e Revolta de Búzios ou Conjuração Baiana de 1798: uma chamada para a liberdade, de Marli Geralda Teixeira.