Wilson Port Jr
14/05/2011 às 10:01
Foto: Marc Ferrez |
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A imprensa como força de expressão contrária à escravidão |
A outra face da imigração protestante no século XIX se destaca pela força e expressão contrárias à escravidão e, por vezes, sendo até perseguida por causa de sua voz abolicionista.
No ano de 1864 foi fundado o jornal Imprensa Evangélica pelo missionário norte-americano Ashbel Green Simonton (1833-1867), também fundador da Igreja Presbiteriana no Brasil.
Durante a segunda metade do século XIX, décadas finais da escravidão no Brasil, este jornal, o meio de comunicação dos presbiterianos de então, foi um dos que expôs sua opinião quanto à escravidão. O Imprensa Evangélica durou 28 anos. Recebeu uma grande aceitação, não somente entre os protestantes brasileiros, como em toda a sociedade brasileira; fora amplamente lido.
No início da década de 70, do séc. XIX, havia uma relação racial harmoniosa no Brasil, bastante diferente da existente nos Estados Unidos da América. Os abolicionistas protestantes se valeram muitas vezes disso para propagar sua preocupação em que houvesse uma reforma social no Brasil. Imprensa Evangélica se pronuncia neste período da seguinte maneira: o "Brasil poderia dar ao mundo este exemplo único de um país que faz uma reforma social desta ordem, sem se arruinar, e sem perturbar a paz em que há longos anos tem vivido".1
Conforme observa Barbosa, o jornal Imprensa Evangélica procurou destacar que não havia ódio de raças no Brasil, diferentemente de como acontecia em outras nações, como nos próprios Estados Unidos da América. Segundo ele, "isto não significava a inexistência de conflitos de classes, entre senhores e escravos" .2 No dia 24 de maio de 1884 o jornal publicou a matéria "o abolicionismo" no qual lemos: "a demora em fazer justiça aos oprimidos traz perigo para os opressores e que o regime escravista é defendido por esse grande exército alistado sob a sua bandeira, não está disposto a capitular" .3
Kidder e Fletcher, autores de O Brasil e os brasileiros, escreveram seu livro em pleno período escravagista, e, como protestantes, criam que a escravidão no Brasil estava condenada, que era apenas uma questão de pouco tempo.4
A partir dessa década (70 do séc. XIX), toda propaganda abolicionista começou a crescer no Brasil e Fletcher realmente esperava que ela ocorresse num período curto de tempo. Por isso dedicou-se a distribuição de literaturas anti-escravagistas. Davi Gueiros Vieira escreve que, "entre os muitos livros anti-escravagistas que Fletcher distribuiu, havia um que produziu grande impacto no Brasil. Foi a obra de George Livermore sobre o negro e a Revolução Americana" .5
Observa-se deste período, tanto dos políticos abolicionistas quanto de alguns protestantes cujas vozes ressoaram através do Imprensa Evangélica, que havia uma preocupação em levar a abolição tão logo quanto possível para as vias legislativas, preocupados com uma abolição que fosse progressiva.
O próprio jornal Imprensa Evangélica assumiu esta postura, tanto que, nas vezes em que se pronunciou, não assumiu uma postura firme e radical a respeito da escravidão. As propostas mais aceitas e propagandeadas, também pelo Imprensa Evangélica, foram de "uma emancipação gradual, ou então, de libertação, com prestação compulsória de serviços aos ex-senhores, ainda por alguns anos" .6
Fazendo coro ao Imprensa Evangélica está o jornal O Novo Mundo, que fazia apologia ao protestantismo. O Novo Mundo era editado pelo protestante e jornalista José Carlos Rodrigues, que também fora fundador de vários jornais ligados ao Comércio, Indústria, Política e Jurisdição. No Novo Mundo, Rodrigues comenta que a única alternativa viável para a abolição no Brasil era o caminho legislativo.
Em 24 de outubro de 1870 Rodrigues aponta em seu jornal que os anseios populares, sobretudo daqueles movimentos mais radicais, não estavam alcançando seus objetivos. Rodrigues entendia, e deixava isso claro em O Novo Mundo, que a abolição era algo que devesse acontecer com urgência, como uma "cirurgia necessária" que não pode esperar para acontecer. O que acontecia era que, tanto a voz desses movimentos populares mais radicais quanto a voz do Novo Mundo, não estavam conseguindo chegar e alcançar uma resposta corajosa dos conselhos legislativos de então que, segundo Rodrigues, eram como "médicos" responsáveis pela cirurgia, mas que "estavam com medo de assumir a responsabilidade".7
No final do período da escravidão no Império do Brasil, vemos mais uma vez a voz presbiteriana abolicionista ressoar. Lessa, em seu Annaes da primeira egreja presbiteriana de São Paulo, registra com entusiasmo a decisão de um concílio de publicar em ata sua simpatia e emoção pela abolição da escravidão no Brasil.
Assim consta os Annaes de Lessa: Que este presbyterio, ao encetar os trabalhos desta reunião, une seus sentimentos de profunda sympathia ao sentimento de geral regosijo em torno da gloriosa lei de 13 de maio deste anno e, rendendo graças "à Deus que nos quer bem", pela extincção pacifica do captiveiro em nossa pátria, faz sinceros votos para a emancipação moral dessa nova classe, que acaba de entrar felizmente para a communhão social.8 Embora não se saiba o nome do proponente de tais palavras, credita-se ao Rev. E. C. Pereira devido ao seu grande interesse abolicionista demonstrado através de sermões e escritos. No próximo post analisaremos alguns batistas que se pronunciaram contrários à Escravidão no Brasil Império. Wilson Porte Jr. Post Tenebras Lux
Notas 1 PEREIRA, Eduardo Carlos. A emancipação. Imprensa Evangélica. 7 de junho de 1884, p. 81. 2
BARBOSA, op. Cit. p. 97.3
O abolicionismo. Imprensa Evangélica. 24 de maio de 1884, p. 73.4
KIDDER, Daniel P. e FLETCHER, J.C. O Brasil e os brasileiros. Rio de Janeiro: Companhia Editorial Nacional, 1941. p. 147.5
VIEIRA, David Gueiros. Protestantism and the religious question em Brazil: 1850-1875. Michigan: University Microfilms International, 1977. p. 227-231.6
BARBOSA, op. Cit. p. 99.7
RODRIGUES, José Carlos. A emancipação dos escravos. O Novo Mundo, 24 de outubro de 1870, p. 2.8
LESSA, Vicente Themudo. Annaes da primeira egreja presbiteriana de São Paulo. São Paulo: Edição da primeira Igreja Presbiteriana Independente de São Paulo, 1938.