Marcos Carneiro e Wladimir Morgado
25/09/2009 às 17:17
Foto: FIGURATIVO/TETO |
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Constituição da Bahia estabelce que teto salarial máximo é subsídio de desembargador |
De forma equivocada, algumas Assembléias Legislativas, como ocorreu em passado recente e continua na atual legislatura, no caso da Bahia, tem legislado ignorando a inovação introduzida pela Emenda à Constituição Federal (ECF) nº 47 (em especial o § 12 do art. 37), como será demonstrado no presente estudo, pois vem, em desacordo com a Carta Estadual vigente, estabelecendo como limite de remuneração para o servidor público estadual o subsídio de Governador, contrariando expressamente o disposto no § 5º do art. 34 da Constituição do Estado da Bahia, que foi alterado pela Emenda à Constituição Estadual (ECE) nº 007, de 18.01.99.
Após a edição da Constituição Federal em 1988, várias emendas constitucionais se sucederam tratando dos limites máximos de remuneração nos Três Poderes e nas diversas entidades da Federação, com reflexos importantes na Constituição do Estado da Bahia e nas expectativas salariais do servidor estadual do Poder Executivo, tendo em vista que alguns servidores já estão estornando parte da remuneração por ultrapassar o atual limite imposto, contrariando as normas constitucionais, em especial o art. 37, XI combinado com o respectivo § 12 da CF/88 e com § 5º do art. 34 da Constituição do Estado da Bahia, como veremos a seguir.
Por força da Emenda à Constituição Federal (ECF) Nº 19, com efeitos a partir de 04/7/1998, o limite máximo de remuneração do Executivo Estadual passou a ser o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. O mesmo aconteceu nas diversas unidades da Federação.
Decorridos 6 (seis) meses, precisamente em 19/01/1999, o Estado da Bahia adotou um novo teto salarial, isto é, o subsídio mensal, em espécie, dos Desembargadores. A partir daquela data, nenhum servidor público baiano, inclusive Procuradores e Auditores Fiscais, poderia ganhar mais do que um Desembargador poderia perceber.
Esta determinação foi implantada por Emenda à Constituição do Estado da Bahia, a ECE Nº 07, na forma transcrita abaixo: "Art. 34. A Administração Pública, no que respeita aos seus servidores civis e militares, obedecerá ao disposto na Constituição Federal e ao seguinte: § 5º a remuneração e o subsídios dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes do Estado e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderá exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Desembargadores."
Nota 1: O § 5º foi acrescentado ao artigo 34 pela Emenda Constitucional nº 007, de 18.01.99, DOE de 19.01.99, efeitos a partir de 19.01.99.
Em seguida, outra mudança foi efetivada no texto do inciso XI do art. 37 da CF/88, veiculada pela ECF 41, com efeitos a partir de 31/12/2003. Nela foram criados diversos tetos remuneratórios, um para cada entidade da Federação. Assim, para os servidores da União, o limite continuou sendo o do Ministro do STF; para o Município, o máximo permitido passou a ser o subsídio do Prefeito; e, para os Estados, foram criados 3 tetos, um para os servidores do Judiciário, um para os servidores do Legislativo e um para os servidores do Executivo, este último sendo o subsídio do Governador, "in verbis": "Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;"
Nota : A redação atual do inciso XI do art. 37 foi dada pela Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, efeitos a partir de 31/12/03. Esta nova mudança constitucional poderia trazer a conclusão de que a supracitada ECE 07 estaria revogada - a que estabelece o limite único na Bahia como sendo o subsídio do Desembargador - não fosse o advento da ECF 47, publicada em 05/7/2005, mas com efeitos retroativos a 31/12/2003, mesma data de publicação da ECF 41.
Veja-se o teor da ECF 47, que acrescentou o §12 ao art. 37 da CF/88: "§ 12. Para os fins do disposto no inciso XI do caput deste artigo, fica facultado aos Estados e ao Distrito Federal fixar, em seu âmbito, mediante emenda às respectivas Constituições e Lei Orgânica, como limite único, o subsídio mensal dos Desembargadores do respectivo Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, não se aplicando o disposto neste parágrafo aos subsídios dos Deputados Estaduais e Distritais e dos Vereadores." (destaques acrescidos)
Nota : O § 12 foi acrescentado ao art. 37 pela Emenda Constitucional nº 47, de 05 de julho de 2005, efeitos a partir de 31/12/03.
Portanto, hoje podem os Estados fixar um único limite, aplicável a todos os servidores respectivos (exceto os do Legislativo), como alternativa à adoção de tetos distintos. No entanto, a Bahia já tinha feito isso através da ECE 07, desde 1999.
Repita-se que na redação da EC 47 está dito claramente que seus efeitos retroagirão para 31/12/2003, data da promulgação da ECF 41, criadora de tetos distintos nos Estados. Logo, impossível falar que no caso houve repristinação, evento repelido pelo direito brasileiro (art. 2º e parágrafos da Lei de Introdução ao Código Civil infra-escrita), ou seja, uma lei revogada por outra voltar a produzir efeitos jurídicos pelo fato de uma terceira lei revogar a lei revogadora. Em outras palavras, haveria repristinação se a Lei "B" (ECF 41) revogasse a Lei "A " (ECE 07) e a Lei "C" (ECF 47), ao revogar a Lei B, fizesse retornar ao mundo jurídico a Lei A.
Definitivamente, não foi isso que aconteceu no presente caso. DECRETO-LEI Nº 4.657, DE 4 DE SETEMBRO DE 1942. "Art. 2o Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. § 1o A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. § 2o A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior. § 3o Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência." Nesse sentido, a ECF 47, mesmo publicada um ano e meio depois da ECF 41, teve seus efeitos jurídicos lançados para a mesma data da edição desta última (31.12.2003).
Em verdade, apesar de no tempo terem sido publicadas em datas distintas, as duas emendas nasceram para o direito no mesmo dia (31.12.03). E a partir daí convivem pacificamente. E não poderia ser diferente, pois a lei nova (ECF 47) - no dizer do § 2º do DL acima citado - não revogou nem modificou a regra prevista na ECE nº 07 que fixou o teto constitucional igual à remuneração de Desembargador. Ao contrário, o § 12 da ECF 47 fez com que a ECE nº 07 ficasse inalterada com o permissivo de essa matéria poder vir a ser disciplinada por emenda à Constituição.
Não há que se falar, portanto, em uma ter revogado a outra e, por assim dizer, não há que se falar em repristinação. § 12 da ECF 47 - "Para os fins do disposto no inciso XI do caput deste artigo, fica facultado aos Estados ... fixar, em seu âmbito, mediante emenda às respectivas Constituições..., como limite único, o subsídio mensal dos Desembargadores do respectivo Tribunal de Justiça... Desenvolvendo um pouco mais:
No mesmo momento jurídico, os valores máximos de remuneração nos Estados passaram a ter limites diferentes, a depender da esfera de Poder, mas os Estados poderiam fixar um teto único através de emenda à respectiva Constitucional do Estado. E, no caso da Bahia, o limite único - subsídio do Desembargador - estava e continua fixado pela ECE 07, conforme visto anteriormente.
Enfim, não há incompatibilidade entre a ECE 07, a ECF 41 e a ECF 47, os três diplomas em pleno vigor no ordenamento jurídico. Muito menos revogação ou alteração.
Hoje, na Bahia, os servidores públicos de qualquer Poder devem obediência ao limite máximo equivalente ao subsídio do Desembargador do Tribunal de Justiça. Essa mesma situação (idêntica à supracitada, portanto) é vivenciada pelos Estados do Rio Grande do Sul (ECE nº 40, de 12/12/2003), Paraná (Lei nº 13981, de 26/12/2002) e Tocantins (ECE Nº 07, de 15/12/88) onde, nesses Estados, firmou-se o correto entendimento de que o teto do executivo continua sendo o equivalente à remuneração de Desembargador, haja vista a permissão expressa na ECF 47 (efeitos a partir 31/12/2003), mesma data da ECF 41.
De outra sorte, vários Estados que não tinham esse dispositivo nas respectivas Constituições Estaduais já fizeram ou estão em vias de se efetivar a alteração na Carta Estadual, encaminhado projeto de Emenda Constitucional, a exemplo de Minas Gerais (PEC 40/2007), Santa Catarina (PEC 0004.2/2006), Pará (PEC 08/2007) e Rio Grande do Norte (PEC 190/2006), consoante quadro de Teto Salarial divulgado pela Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais - FEBRAFITE, combinado com tabela abaixo constante do Parecer ao Projeto de Lei nº 16.325/2007 da bancada da liderança do Governo da Bahia, disponível em http://www.lideranca.ba.gov.br/index.asp?site=parecer/ver.asp&codigo=5, acesso em 29 fev. 2008: TETO DE REMUNERAÇÃO DO SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL BRASILEIRO Estado Governador Teto Salarial (R$) / Disp. Legal Paraná Roberto Requião (PMDB) 24,5 mil / Lei nº 13.981/2002 Tocantins Marcelo Miranda (PMDB) 22,1 mil / ECE Nº 07//1998 Acre Binho Marques (PT) 22,1 mil / Lei nº 1973/2007 Mato Grosso do Sul André Puccinelli (PMDB) 22,1 mil / Lei nº 3328/2006 Sergipe Marcelo Déda (PT) 22,1 mil / Lei nº 6146/2007 Amapá Waldez Góes (PDT) 22 mil / Lei nº 1055/2006 Roraima Ottomar Pinto (PSDB) 18,6 mil / Subsídio Governador Paraíba Cássio Cunha Lima (PSDB) 18,37 mil / Lei nº 8427/2007 Amazonas Eduardo Braga (PMDB) 17 mil / Lei nº 2750/2002 São Paulo José Serra (PSDB) 14,8 mil / Lei nº 12.792/2007 Maranhão Jackson Lago (PDT) 13.552,38 / MP 037/2008 (*) Goiás Alcides Rodrigues (PP) 12,8 mil / Subsídio Governador Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB) 12,76 mil / Lei nº 5001/2007 Distrito Federal José Roberto Arruda (PFL) 22.111,25 / ELO nº 46/2006 (*) Rondônia Ivo Cassol (PPS) 12,3 mil / ECE 55/2007 Espírito Santo Paulo Hartung (PMDB) 12,16 mil / Subsídio Governador Rio Grande do Norte Wilma de Faria (PSB) 19.900,12 / PEC nº 190/2006 (*) Alagoas Teotônio Vilela (PSDB) 11,5 mil / Subsídio Governador Piauí Wellington Dias (PT) 11,44 mil / Subsídio Governador Pará Ana Júlia (PT) 11,44 mil / Subsídio Governador Mato Grosso Blairo Maggi (PR) 11mil / Subsídio Governador Bahia Jacques Wagner (PT) 10, 64 mil / Subsídio Governador. Minas Gerais Aécio Neves (PSDB) 22.111,25 / PEC nº 40/2007 (*) Santa Catarina Luiz Henrique da Silveira (PMDB) 22.111,25 / PEC nº 0004.2/2006 (*) Pernambuco Eduardo Campos (PSB) 17.000,00 / Subsídio Governador Rio Grande do Sul Yeda Crusius (PSDB) 22.111,25 / ECE nº 40/2003 (*)
(*) Valores divergentes dos registrados na tabela constante do Parecer ao Projeto de Lei nº 16.325/2007, em função de alterações ocorridas, de acordo com a FEBRAFITE e respectivos Projetos de Emenda à Constituição (PEC) ou Emenda à Lei Orgânica (ELO). Ainda, torna-se imperativo registrar que o teto remuneratório vinculado ao subsídio de Governador de Estado, cargo, por essência, de natureza política representa uma ameaça à autonomia das carreiras típicas de Estado que ainda não tiveram o mesmo tratamento que foi dado (princípio da isonomia) a outras Carreiras Exclusivas Estaduais, a exemplo do Ministério Público e Procuradores de Estado que têm seus tetos de remuneração limitados aos subsídios dos Desembargadores dos Tribunais de Justiça (cargo não político).
Além disso, como é sabido de todos, não é esse subsídio que é fixado para o Governador de Estado (cargo eminentemente político, como disse) que lhe dá o suporte para o exercício do mandato, haja vista a existência de toda uma infra-estrutura à sua disposição (hospedagem, pessoal, veículos etc.) necessária e imprescindível para o bom desempenho e segurança no exercício das funções de um Chefe de Estado. O mesmo pode-se dizer dos seus respectivos Secretários de Estado, não na mesma proporção, claro, pois os mesmos participam de vários Conselhos ou órgãos colegiados e percebem, em cada um deles, "jetons" ou verbas com denominações semelhantes, de natureza ou caráter indenizatório, que, em função deste aspecto, não se submetem ao limite fixado para subsídio de Governador (Teto de Remuneração do Servidor Público, exceto Secretários de Estado e demais servidores que recebem esses "jetons" ou verbas semelhantes de caráter indenizatório).
Não sei até que ponto essas verbas ou "jetons" poderiam ser pagos pelos órgãos públicos sem contrariar as normas constitucionais que dizem que ao fixar o teto constitucional, seja ele (teto) o subsídio de Governador ou a remuneração de Desembargador, deve ser "incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, e não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie...". (Art. 37, inciso XI da Carta magna e art. 34, § 5º da Constituição do Estado da Bahia, por exemplo) " (...)Por outro lado, mas dentro do mesmo contexto, o art. 39, §4° da CF (ECF 19/98) determina que os membros de poder, os detentores de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários de Estado serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única.
É bom frisar que o parágrafo 8° também abre a possibilidade para que qualquer servidor público organizado em carreira venha a ser remunerado na forma de subsídio. (...) Assim, não obstante tenha uma ligação umbilical com o teto constitucional, o subsídio não pode de forma alguma com ele ser confundido. O subsídio funciona como um verdadeiro coletivo que açambarca os mais diversos componentes de uma remuneração, como a verba de representação, as vantagens pessoais e as gratificações de toda sorte, enquanto que o teto salarial é o valor máximo que ele (subsídio) pode vir a alcançar..." (disponível em http://www.sintaf-rs.org.br/inf_artigo_tecnico_detalhe.asp?cod_artigo_tecnico=961, acesso em 17 Fev. 2008).
Pelo exposto, como estamos diante de administrações que se dizem democráticas, participativas e transparentes, resta aos titulares ou Chefes de Governo dos Estados, em atenção aos princípios da legalidade, impessoalidade e da eficiência, compreender que ainda vigora como teto constitucional o limite único de remuneração do servidor estadual equivalente ao subsídio mensal do Desembargador do Tribunal de Justiça (caso do Estado da Bahia), evitando-se a instauração de demandas judiciais para o reconhecimento desse legítimo direito, bem como que todas as categorias típicas de Estado.
* Autores do Texto:
Marcos Antonio da Silva Carneiro auditor fiscal do Estado da Bahia, bacharel em Administração (UCSAL) e em Direito (UCSAL), especialista em Direito Tributário (UFBA) e em Gestão Tributária (UNIFACS), professor de Direito Tributário no MBA em Gestão Empresarial da FIB e FABAC e mestrando em Políticas Sociais e Cidadania (UCSAL).
Vladimir Miranda Morgado auditor fiscal do Estado da Bahia, doutorando em Direito Público, pós-graduado em Gestão Tributária, professor de Direito Tributário da UNEB.