ATÉ A SENHORA VEM PARA O CARNAVAL

Marco Gavazza
18/02/2009 às 08:02

A senhora pelo amor de Deus fique longe dos acarajés
  O Carnaval em Salvador é um dos mais complexos fenômenos sócio-culturais deste  país encapetado. Mas  embarcar nele não é pra decifrar nada e sim curtir todas. Só tenha certeza de uma coisa: parte da festa a Srª já perdeu.  Os blocos (que são muitos) já começaram os ensaios (que não são poucos nem só ensaios). Já é Carnaval em vários pontos de Salvador.
 
  Em janeiro/fevereiro aconteceram as lavagens; carnavais completos de um dia, começando pelo Bonfim, depois Rio Vermelho, Itapuã, Praia do Forte, Arembepe, Guarajuba e outras tradicionais. Além de centenas espontâneas, "organizadas" por grupos  que resolvem lavar a rua tal ou um bar qualquer e pronto. Lavagens lavam a alma e está bom demais.


   TIRE O ATRASO. Se a Srª faz parte do Brasil normal, dê um jeito de estar em Salvador na 5a. feira antes da festa no resto do País. Uma semana antes de Cinzas, aqui já é oficial. A lavagem do Porto da Barra, famosa praia e point da contracultura dos anos 70, abre a festa arrasando, como se ela não acontecesse há décadas. Trios elétricos e blocos varam a madrugada e a loucura se instala para Rei Momo encontrar a cidade no ponto.

    A partir daí, roupas largas e confortáveis ou um nadinha de roupa, comida leve (existe em Salvador, fique tranqüilo) e abadá é tudo que a Srª precisa. O que é um abadá ?  Parece comida baiana mas é traje oficial. Por modestos R$ 800 em média, identifica a tribo do folião e dá acesso ao seu bloco por um dia ou mais. Depende do bloco.
 
   Se a srª chegar em cima da hora, vai pagar mais caro, mas ainda é possível comprar um. Não se preocupe: ninguém fica sem  abadá. Se não conseguir, assuma a condição de pipoca, foliões independentes e que muita gente prefere ser, por achar o universo pipoca recheado de pessoas espontâneas, com liberdade pra ir atrás do que quiser e principalmente, grátis. A desvantagem é não ter a estrutura dos blocos, com carros de apoio, bar, sanitários, atendimento médico e seguranças.


   ENTRE NA ROTINA. ROTINA? Paramentada de abadá ou pipoca assumida, nada a fazer além de entregar-se ao mais completo prazer, dentro das cordas ou atrás dos blocos, que parecem não acabar nunca. Sejam os oficiais ou os alternativos. Oficiais no circuito Campo Grande e alternativos no Barra/Ondina. Não tente entender isso. Vá atrás. Se a Srª quer trio elétrico vá para o Campo Grande pois eles saem de lá. Sim; porque se a Srª pensa que o imenso tumulto e aparente caos, não possui qualquer sentido, está enganada. Há uma organização por trás de tudo.

   A Prefeitura cuida de dar conforto a cerca de 500 mil turistas. Os horários de saída dos blocos são rígidos e até uma certa rotina surge entre os alucinados foliões: de manhã, dormir logo que o sol desponta. Ao acordar, praia para restaurar as energias. O caminho é em direção às areias de Vilas do Atlântico, Flamengo, Ipitanga, com muita água de coco, frutas, frutos do mar. Tudo levinho, porque no final da tarde -ou no começo pra quem se recupera rápido- é hora de balançar o chão na Av. Sete. Bem mais tarde, transfira-se para Ondina e terá cumprido sua obrigação carnavalesca do dia.


   RI MELHOR QUEM RI PRIMEIRO. Se chegar antes da abertura oficial do Carnaval (na Bahia, não esqueça) e já quiser curtir o clima de festa, tem muita coisa pra fazer. Assista os ensaio dos blocos. Ande pra lá e pra cá no território afro-baiano do Pelourinho, veja as galeria de arte, os shows, a Casa de Jorge Amado. Tome uma cachaça na calçada, participe da benção-pagã e beba cravinho de graça.

   Vá até o Rio Vermelho comer o internacional acarajé de Dinha e depois se misture com a flor da juventude nos bares da moda. Compre fitas do Bonfim na Colina Sagrada. Vá ao Solar do Unhão ver o sol se por atrás da ilha de Itaparica. A Srª vai achar que Deus existe e é pintor. Vá à praia, qualquer praia e ao sair dela, coma um caranguejo. A orla está cheia deles e tá todo mundo lá.


   PAREM O MUNDO QUE EU QUERO DESCER. Se por uma alucinação qualquer a Srª resolver ficar fora do Carnaval um dia ou dois e curtir outras coisas, há possibilidades. Siga a caravana de baianos degenerados que foge da cidade para o Litoral Norte, pela Estrada do Coco. Por aí se conhece Arembepe e seu passado hippie; Jauá e Itacimirim com praias de mar aberto; Praia do Forte, a Polinésia brasileira, com clima de sofisticação rústica. Depois vá até Imbassaí, aonde só se chega ao mar atravessando a vau um doce rio de 1/2 m de profundidade.


   PAROU POR QUÊ ? De volta ao universo da gandaia, entre no ritmo do axé, popaxé, axégode, sambaxé, reaggaxé, frevorockrapaxé e dezenas de variações que preparam a Srª para a apoteose final: o encontro de trios na Praça Castro Alves, onde já teve Caetano Veloso e Edson Cordeiro duetando o Hino ao Sr. do Bonfim. Significa que mais um Carnaval da Bahia está acabando. Sim, ele acaba. Lá pro fim da tarde de 4ª Feira de Cinzas, para desespero do Cardeal D. Geraldo Magela, mas acaba.


  DICAS FUNDAMENTAIS

  01. O Carnaval baiano não se destaca pela violência, mas numa festa que reúne 1,5 milhão de pessoas dançando nas ruas, rola alguma confusão. Sempre ligada, evite a periferia da festa e fique próxima ao fluxo natural dos  circuitos.


  02.
A temperatura em Salvador nesta época, no asfalto, ultrapassa fácil os 40  graus. Dançando em média 12 horas por dia neste clima, perde-se muito líquido. Evite desidratar-se, repondo com sucos, água mineral, bebidas isotônicas e muita água de coco. Lembre: cerveja não hidrata, ao contrário, ajuda a perder líquidos.


  03.
Evite as comidas pesadas, de dendê e molhos que a Srª não está acostumada.


  04.
Cuidado especial para os pés. Tênis usados e já amoldados, meias de algodão e uma boa massagem depois de cada etapa da maratona, ajudam.


  05.
Nada de jóias, talões de cheque, cartões de crédito. Programe suas despesas e leve apenas o dinheiro necessário num bolso da frente da roupa e um documento apenas de identidade;


  06.
Camisinhas Srª, pelamor de Deus, dezenas delas. Baiano é muito esquecido.