Hoje, os blocos de samba estão desfilando, particularmente, na quinta-feira do Carnaval. Mas, já existe um movimento no sentido de que tenham espaços nos circuitos da folia e integrem o calendário cheio. Vai depender da capacidade de mobilização desse pessoal e de sua inserção no conjunto da festa de forma integral. Se isso acontecer, como já está ocorrendo, os blocos afros no modelo Ilê Aiyê, Muzenza, Cortejo, Malê e outros vão perder espaços na folia, na mídia e na participação da festa.
Veja que, enquanto os blocos de samba crescem e se multiplicam - este ano Belo vai apimentar ainda mais esse grupo - os afros estão estagnados e/ou se modificando, salvo o Ilê Aiyê e outros menos citados, que se mantém originalmente como foram concebidos em suas comunidades. O Badauê, por exemplo, que estaria completando 30 anos, praticamente desapareceu do cenário apesar do esforço de alguns abnegados que ainda tentam revivê-lo, como está acontecendo em 2009.
O Araketu perdeu suas características originais e, hoje, se assemelha a um bloco de trio como tantos outros do gênero. O Olodum mantém a batida, internacionalizou-se e cresceu com outra concepção do espaço/mundo/África para uma visão mais contemporânea. Nesse mesmo caminho segue o noviço Cortejo Afro. O Malê é um misto quente e vai de japonês a nativo. Os Negões seguram a onda. E o Muzenza tem altos e baixos. Existem outros menos cotados.
Os afoxés têm uma história à parte. O Filhos de Gandhy é um caso especial porque tem uma longa história, foi salvo por Gilberto Gil, e hoje, ao completar 60 anos, mantém suas tradições ligadas a alguns preceitos do candomblé, desde a época dos seus fundadores Vavá Madeira, Pedro de Oiá, Jaime Baixinha e outros. Registre-se, ainda, que apesar de algumas combinações internas, é único bloco da cidade que tem eleições diretas pelo voto na urna. Portanto, democraticamente falando, o sol.
Se a Secretaria de Cultura do Estado fosse adotar esse critério (da democracia, do princípio republicano tão citado pelo governo) para conceder a verba do Carnaval Ouro Negro, este ano no valor de R$4.2 milhões para 117 entidades, somente o Gandhy teria direito. Mas, salvem-se todos porque muitos deles precisam desses recursos, especialmente os pequenos grupos, a verba será repartida entre os grandes (alguns dos quais não precisam), os médios e os pequenos. Pratica-se a democracia participativa observando-se alguns critérios estabelecidos pela Secult.
Uma outra questão também inserida nesse movimento do Carnaval está relacionada aos indo-euro-afro-baianos, com matriz predominante afro, e que desfilam nos blocos de trios e agregam os afro-axés e/ou afro-torcida do Bahia, com o Tiete-Vips sendo seu mais visível representante; os afro-axés-irreverentes, com As Muquiranas representando o seu destaque; e os afro-pagodes, este ano com ascensão do Fantasmão.
Ora, esses grupos reúnem muito mais afros-baianos do que os blocos afros. No entanto, pouco se fala deles, salvo quando estouram nas paradas como aconteceu com o Bonde do Maluco, em 2008, e está acontecendo agora com o Fantasmão. E alguém conhece Xando do Harmonia? Pois esse camarada está nas paradas há 10 anos, por aí, pagodando com público predominante afro-baiano. E isso é cultura carnavalesca? Segundo o atual Rei Momo, Gerônimo, autor do hino à cidade "É de Oxum", no Carnaval vale do "rala checa a Vila Lobos". Xando, portanto, é cultura. Pagodarte também. Leo Kret e seu conjunto, idem.
Então, minha gente querida, os chamados blocos afro de origem fazem muita marola, ganham enormes espaços na mídia de "afirmações" e outras coisas mais, mas, o grosso da tropa se concentra nos axés-afro e nos pagodes-afro que não vivem a chorar nem mamam nas tetas do governo. Estão em outra, completamente diferente. Uma reunião dos pagodeiros no Wetn-Wild, recentemente, teve mais gente do que se reunidos todos os públicos de meses dos ensaios do Olodum, Ilê e Malê juntos.
Foram milhares de pessoas, tudo black, pagando seu ingresso, com camiseta, todo mundo arrumadinho, mostrando essa outra face da cidade, do Carnaval e do seu povo. Gente que precisa também ser visualizada. E o pagode, e, mais recentemente, o samba, estão mostrando suas faces no Carnaval de Salvador.